Desiludir

Yasmin Chinelato
Fale com Elas
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2 min readOct 5, 2020
Imagem: daqui

II

Cenas.

Primeiro penso na cama. O beliche à meia-luz envolvido pelo silêncio que engole a madrugada. Eu me observo cair de fora. Estou presa. Não consigo me mover.

Depois, penso na sua cama. Improvisada para todas as vezes que me convidava para passar a noite. Toco o lençol pequeno demais, revirado muitas vezes antes da manhã seguinte, testemunha das horas de uma madrugada já não tão silenciosa. O dedo médio contornando a extensão das listras multicoloridas do tecido, como contornaria a extensão da sua pele, num toque emocionalmente consciente que faz com que os pelos do braço se arrepiem. Ouço seus sons, percebo seus sinais, internalizo suas palavras, sussurradas em um frenesi de desejo e tensão. Uma batalha de corpos, o cheiro doce do seu cabelo, uma experiência sinestésica além dos limites estabelecidos pela matéria daquele tempo e lugar. Em seus movimentos, te sinto parte de mim. Você conhece o meu desejo. Sabe como dar vida a ele. Nós fazemos amor com a janela aberta e eu não me importo de estar nua em seus lençóis. Me entrego a cada pequena ilusão criada sobre aquela realidade inventada.

Você coa o café antes que eu acorde. Não está forte, mas tomamos uma xícara cheia.

Eu poderia te amar se você tivesse deixado.

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