Predadores Assassinos mas nem tanto

João Pedro Viegas
Fale de Cinema
Published in
5 min readSep 24, 2019

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Uma busca por sobrevivência e superação de limites com roteiro improvável e recheada de clichês

Desastres naturais, luta pela sobrevivência em ambiente hostil, relação conturbada entre familiares e animais ferozes querendo predar os humanos. Essas parecem receitas de um tradicional filme da Temperatura Máxima, que eu e você com certeza já vimos. Bom, talvez não com todos esses elementos juntos, mas sei que você conseguiu imaginar um roteiro só com esses elementos que citei. E o filme destacado neste texto não foge à regra. Predadores Assassinos chega aos cinemas no dia 26 de setembro, escrito pelos irmãos Shawn e Michael Rasmussen e com direção de Alexandre Aja, combinando clássicos clichês do cinema de ação, e que vai entreter as famílias num belo almoço de domingo.

Na trama, Hayley (Kaya Scodelario) é uma estudante que compete pelo time de natação da sua universidade. Sob o alerta de um furacão indo em direção ao estado onde mora, a jovem ignora completamente todas as recomendações de segurança e vai em busca de seu pai (Barry Pepper), que não atende às ligações telefônicas. Ao chegar na antiga casa da família, Hayley encontra seu pai ferido no porão, e descobre que existem jacarés enormes à espreita dos dois. O desafio, então, está colocado na mesa: sobreviver a todo custo.

Crawl — 2019 (Foto: Paramount Pictures/Divulgação)

Por um certo tempo, eu gostei de Predadores Assassinos. As cenas iniciais provocam uma tensão, e você automaticamente sente que há uma urgência naquela situação. A tempestade, em si, provoca essa sensação, e mesmo sendo produzida em ambiente controlado, convence. Até os primeiros contatos com os predadores — produzidos em CGI, mas que nem dá pra notar — é emocionante, com um jumpscare que nenhum dos meus colegas jornalistas esperava ter. Quase 80% do filme se passa no porão, onde existe a aflição da corrida contra o tempo: arranjar uma saída antes que tudo inunde, e antes que os jacarés me comam. Por isso, a direção aposta no plano eternizado em Tubarão (1975), que é o famoso ponto de vista do animal, tão replicado em produções com a temática humanos vs. feras assassinas.

Mas já dizia meu pai, expert na sessão diária das 22h do Telecine: “o diretor não pode ver que o filme está bom, ele tem que arranjar algo para piorar”. E pior que é verdade, podemos usar essa frase em Predadores. E é aqui que entra a explicação do título deste texto: os predadores são assassinos, mas só com quem eles querem. É, é isso mesmo. Da forma como é executada, os jacarés têm facilidade extrema em trucidar todas as almas bem intencionadas que cheguem minimamente próximos à eles ou ao “prato principal”, caçando dentro e fora d’água, pulando, abocanhando, destruindo… mas não conseguem superar o incrível desafio que é comer Hayley e seu pai, que por acaso são os personagens que mais estão feridos e sem condições de fazer qualquer coisa.

Kaya Scodelario e Barry Pepper são protagonistas em “Predadores Assassinos” (Foto: Paramount Pictures/Divulgação)

Diante disso, uma dentada até o joelho de uma das pernas não impede que a atleta nade contra a correnteza de uma enchente. Pelo contrário: permite que ela tenha um desempenho bem melhor que o grupo de jacarés EMBAIXO da água. Uma amputação de braço também não impede que se faça força com o corpo. Pelo contrário: é possível escalar muros, subir em telhados e resgatar parentes que são carregados pela avassaladora correnteza.

Além desses fatores que permeiam o embate direto com os jacarés, o roteiro também tenta usar de falas de auto-afirmação para justificar algo que seria improvável de acontecer, mas que precisa rolar pra… ter filme. Exemplos disso são as explicações do pai de Hayley sobre o comportamento dos jacarés dentro e fora d’água, que servem para ditar os próximos passos da nossa heroína. Essas desculpas não colam justamente pelo que vemos nos ataques aos personagens secundários, que vão totalmente de encontro com o que acontece com os principais…

Longa traz batalha entre humanos e crocodilos, no meio de um furacão que ameaça destruir parte da Florida (Foto: Paramount Pictures/Divulgação)

Não tem mistério. O roteiro segue a fórmula já apresentada antes em filmes do mesmo gênero. Senti que já tinha visto Predadores Assassinos em uma outra oportunidade, mas com ambientação diferente e com outra “fera” atrás dos personagens. Apesar dos exageros e clichês, gostei da atuação de Kaya Scodelario e Barry Pepper. Como protagonistas, sendo Kaya presente em quase 100% do tempo de tela, vemos os dois se envolverem na situação em que se encontram. Tem que mergulhar na água suja? Mergulho. Tem lama e sujeira? Sem problemas, vou descalço mesmo. Mas é só na parte da ação, porque o lado “tocante” falhou também. Logo de cara vemos que Hayley tem uma relação conturbada com seu pai, e a todo momento o filme tenta mostrar a tentativa de superar o afastamento entre os dois. Porém, é forçado e não convence…

Se você é do tipo pé no chão, sugiro um outro programa de fim de semana, já que Predadores tem roteiro exagerado e improvável. Afinal, tudo ali é causado por uma situação bastante inverossímil. Por mais cabeça-dura e machão que você seja, a sua prioridade durante um furacão realmente é ignorar as instruções de evacuação para consertar um encanamento numa casa que nem é mais sua? E que muito provavelmente seria destruída pelo furacão do qual você estava ignorando os avisos ??!!?1? Francamente…

Produção chega aos cinemas no dia 26 de setembro (Foto: Paramount Pictures/Divulgação)

Agora, se você é o tipo de pessoa que gosta desse quase gênero do cinema — animais ferozes vs. humanos vs. mãe-natureza-, vai fundo. Você provavelmente vai ignorar os clichês, porque eles são os mesmos dos outros filmes já produzidos nessa linha. No pacote, você vai ganhar alguns sustos inesperados, e vai poder valorizar o trabalho da equipe de efeitos visuais do filme.

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João Pedro Viegas
Fale de Cinema

Jornalista em formação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve sobre entretenimento, cultura e esportes.