Jeff Jarvis — Se eu tivesse um jornal…

Marcelo Fontoura
Farol Jornalismo
Published in
42 min readOct 6, 2017

Bom, não tem lá muita chance. Mas, se eu tivesse, é assim que eu tentaria salvá-lo.

Por Jeff Jarvis

Esta é uma tradução livre de um artigo publicado pelo professor Jeff Jarvis, da CUNY, em sua publicação no Medium. O original está aqui. Nele, Jarvis procura estabelecer, de forma mais aplicada, como deve ser o processo de revitalização de um veículo jornalístico hoje em dia, principalmente os que possuem algum tipo de legado analógico. Jarvis defende uma estratégia baseada em relacionamentos, com jornalistas gerenciando comunidades de interesse e as servindo em torno de suas necessidades. Sua argumentação é próxima do que já havia escrito no recente livro Geeks Bearing Gifts. Embora, como ele mesmo diga logo de início, haja algumas diferenças. A publicação da tradução foi autorizada pelo professor. Hiperlinks e formatação foram mantidos como no original, exceto quando indicado. Algum erro na tradução? Me dê um grito aqui.

Um sábio editor que conheci descreveu a situação do seu jornal dessa maneira: “temos duas casas. Uma está em chamas e a outra ainda não foi construída. Então, nosso problema é que temos que lutar contra as chamas na casa antiga, ao mesmo tempo em que estamos tentando descobrir como construir a nova”.

A casa em chamas está na base do antigo modelo de negócios da mídia, que é construído em volume: alcance e frequência em termos de mídia de massa, usuários únicos e cliques no online. Esta casa está condenada a virar commodity, pois a abundância e a competição que a internet gera impulsionam o preço da escassez que uma vez controlamos — tempo e espaço da mídia — em direção a zero. No entanto, este é o modelo que ainda nos traz dinheiro e, para sobreviver e talvez investir em um futuro ou casa alternativos, ainda devemos abastecer esse fogo com gatinhos, Kardashians e todos os novos truques que pudermos encontrar, de anúncios programáticos e os chamados motores de recomendação de conteúdo (que transformam a mídia ainda mais em commodity) à publicidade nativa (que, quando engana nossos leitores, apenas destrói a semente da nossa confiança e marca). Sabemos onde isso acaba: em cinzas.

Enquanto isso, estamos construindo nossa nova casa, nosso futuro, sem planos. Ninguém tem um plano claro para o que funcionará. Em Geeks Bearing Gifts, propus uma maneira de reconciliar nossos negócios com base em relacionamentos, conhecer pessoas como indivíduos e membros de comunidades — não mais como massa — para que possamos atendê-las com mais relevância e valor.

Eu errei algumas coisas em Geeks. Dei muita esperança ao crescente ecossistema local de notícias, à oportunidade para jornalistas desempregados e aos membros da comunidade que iniciariam blogs hiperlocais e se juntariam a outras mídias em redes no melhor estilo kumbaya para compartilhar audiência, vendas publicitárias e notícias. Para o ecossistema de notícias de Nova Jersey, onde trabalhei com colegas para construir este modelo, ofereci treinamento gratuito para que cada um pudesse construir o seu próprio “negócio editorial”. Não conseguimos fechar uma turma. Não havia pessoas suficientes — especialmente jornalistas — dispostas a arriscar-se a iniciar um projeto tão empreendedor pela recompensa de comer miojo. No entanto, a necessidade e a oportunidade de servir essas comunidades permanecem. E então volto a atenção para os jornais tradicionais que agora estão desesperados por inovação e mudança. Eu digo a eles que seu futuro está em construir relacionamentos.

A estratégia de relacionamento exige aprender novas habilidades: ouvir comunidades para discernir suas necessidades; empoderar equipes transversais em nossas organizações para desenvolver produtos e serviços mais direcionados às necessidades dessas comunidades e como elas usam a informação; construir perfis de usuários para que possamos reunir, analisar e atuar em dados sobre nossas pessoas como indivíduos; e criar novas receitas a partir de novas linhas de negócios, como eventos, comércio e associados. Também precisamos ver como podemos trazer essas novas habilidades e dados aos anunciantes de maneiras novas (esperando que ainda precisem de nós). Como fazemos tudo isso — experimentando e inevitavelmente falhando ao longo do caminho — ao mesmo tempo que estamos pendurados na maldita mangueira de incêndio?

No um ano e tanto desde que escrevi o livro, tenho testado essas ideias com donos de mídia de muitos tipos: novas e antigas; impresso e digital; local e global. Estou satisfeito em ver a aceitação em teoria — mas não tanto na prática. Muitos dizem que precisam de ajuda, perguntando: como chegamos lá a partir daqui? No livro, tentei não dar instruções exatas: “Se eu tivesse um plano, estaria eliminando as possibilidades”, escrevi. Tudo bem, mas, droga, cara, a casa tá pegando fogo!

É hora de pagar para ver e propor o que eu faria se — não que isso acontecesse — eu me encontrasse no comando de um jornal, revista ou outra empresa de notícias em chamas. Aqui está o que eu faria para iniciar o processo de transformação e implementar os princípios que explorei em meu livro em termos práticos, para construir o futuro e sobreviver ao presente (ignore a preservação do passado). O problema, é claro, é que tudo pode — não, vai — mudar de novo da noite para o dia. Os Instant Articles virão. Instant Articles podem ir embora. E fenômenos futuros — a realidade aumentada, o poder do áudio para fornecer informações direcionadas, processamento de linguagem natural, inteligência artificial — ficam por aí com impacto incerto. É por isso que, no livro, coloquei princípios e estratégias em vez de táticas, assim sua recomendação poderia durar. Mas aqui vou tentar tomar o que sabemos e podemos observar emergindo hoje para propor um caminho, focando principalmente na estratégia de relacionamento.

Você deve dar como certo que os principais valores jornalísticos — investir no jornalismo investigativo, manter os poderosos em xeque, vigiar as autoridades, lidar com verdades desconfortáveis, lutar pela justiça — devem ser salvos e servidos na minha visão, ainda mais hoje do que em toda minha vida. Mas não é nisso que estou focando aqui. Neste artigo, procuro lidar com o âmago do que costumava ser um jornal: servir a comunidade (ou agora comunidades) em escala suficiente para sustentar os objetivos jornalísticos que acabei de listar e permitir que esse trabalho tenha um impacto. Vamos ser honestos: apenas uma fatia de recursos da redação era direcionada ao grande jornalismo. Muitos dos nossos recursos iam para informar o que aconteceu, matérias rápidas, serviço, o reempacotamento das notícias dos outros e a produção do milagre diário do jornal impresso. Aqui, eu argumentarei por realocar esses recursos para criar maior confiança e valor com os públicos que servimos. Em vez de apenas criar um produto chamado conteúdo e atrair uma audiência para vender aos anunciantes — nosso modelo antigo — agora podemos reconciliar o jornalismo com um serviço para nossas comunidades, convocando-os para uma conversa informada, civil e produtiva e ajudando-os a melhorar suas vidas. Nada menos.

Se há fogo que você tenta combater
De dentro de casa você não pode apagar
— Thomas Jefferson & James Madison em
Hamilton

É tentador começar — como a maioria dos editores fazem e como seus proprietários, públicos ou privados, exigem — se preocupando com o presente, as chamas e o tráfego e receita deste trimestre. Mas antes de abordar como fazer esse trabalho de emergência, é melhor sair da casa e decidir o que estamos tentando construir para o futuro, assim nossas necessidades para o futuro podem informar nossas decisões hoje: saber o que cortar e o que economizar, o que aprender, o que construir, quais os dados a serem reunidos, quais alianças a fazer, o que promover com o megafone que ainda temos, quem contratar e treinar.

O objetivo comercial é claro: devemos construir uma empresa digital totalmente sustentável antes do dia em que o impresso se torne insustentável. Essa é a única definição útil de “digital first”. Defina uma data — mais próxima do que você ouse pensar — a partir da qual o impresso se tornará insustentável porque sua circulação caiu abaixo da margem crítica e ainda mais anunciantes — especialmente cupons e encartes e, em seguida, anúncios legais — desapareceram. Devemos criar produtos e serviços digitais de valor único para substituir o nosso produto de mercado de massa único, As Notícias, que estão se tornando menos valiosas a cada minuto, pois são comoditizadas por agregadores, algoritmos e sistemas de resumo.

Quando nos tornarmos totalmente digitais — como, por exemplo, o Independent de Londres fez quando decidiu parar de imprimir seu produto impresso não lucrativo — a batalha recém começou. Aí, devemos descobrir como quebrar o nosso vício nos modelos de negócios que importamos de meios de comunicação antigos, construindo então nosso futuro em termos de valor em detrimento ao volume. Sim, ainda precisamos de alcance para ter perspectiva suficiente para converter em ofertas de maior valor — mas, então, precisamos de algo de valor que possa ser convertido. Nós ainda não podemos empurrar nosso antigo produto — conteúdo — para esta nova realidade e pensar que vamos encontrar novas maneiras de apoiar o que costumávamos fazer. Devemos reconhecer a mídia e o jornalismo como um serviço, não um produto.

Vou começar aqui: precisamos criar novos serviços que ofereçam relevância e utilidade e, portanto, valorizem os indivíduos e as comunidades, ganhando dados, lealdade e receita em troca. A quem devemos servir? Eu vejo três respostas:

  • Comunidades: como a nossa força nos jornais tem sido, desde há muito tempo, ser local, a nossa estratégia reflexiva inicial quando buscamos comunidades para servir é escolher uma cidade ou um bairro. Tendo batido na tecla do hiperlocal por mais de uma década — com muito otimismo, como confessei acima — não vou argumentar contra o atendimento às comunidades locais. Mas há muitas outras comunidades a considerar também: aposentados, proprietários de pequenas empresas, diásporas étnicas, pais de crianças pequenas, viciados, ativistas, professores, profissionais da saúde, homens gays, mulheres lésbicas, divorciados, jovens afro-americanos e assim vai. Cuidado com a demografia — tenho menos em comum com as pessoas que se parecem comigo do que os pesquisadores e os comerciantes querem acreditar, e fazer um produto ou serviço para um agrupamento estatístico (“o que as mulheres querem?”) corre o risco de soar condescendente. Cuidado também com a falsa comunidade, definida externamente, como millennials ou hispânicos. E cuidado com a arrogância da marca de notícias e a crença de que as pessoas que compram nosso produto se consideram membros da nossa comunidade. Em vez disso, encontre comunidades que sejam autodefinidas e de alguma forma desatendidas e aprenda a atendê-las melhor.
  • Interesses: Quase todas as comunidades são, na concepção de Benedict Anderson, comunidades imaginadas — isto é, grupos de pessoas que provavelmente não se conheceram, mas que se reunirão em torno de uma necessidade ou desejo comum. Mesmo que eu não conheça outros pacientes com câncer e mesmo que eu não me considere um membro de uma comunidade de pacientes com câncer, é certo que, como alguém que teve câncer, compartilho informações com eles (e necessidades diferentes em momentos diferentes). Há, na verdade, um sem-número de interesses que podem ser atendidos: torcedores de times profissionais ou universitários, ambientalistas, pessoas que gostam de artesanato, gourmets, pessoas vendendo casas, pessoas procurando casas para comprar, pessoas que procuram emprego, donos de animais etc. Aqui tenha cuidado se pensar que as pessoas organizam seus interesses em torno da taxonomia à la USA Today que tradicionalmente oferecemos: notícias, vida, dinheiro, esportes. Também entenda que tópicos não correspondem necessariamente a interesses. O chefe do Google News, Richard Gingras, gosta de usar este exemplo: ficou fascinado com a história do ex-representante de Nova York Anthony Weiner — infame por suas imagens íntimas que viralizaram — não porque Gingras se interessasse pela política de Nova York ou pelos genitais de Weiner, mas porque ele não consegue resistir a uma história de perda de status. Os interesses devem ser definidos não em nossos termos — o conteúdo que temos, a forma como atribuímos e organizamos nossa redação — mas sim nos termos dos interessados.
  • Casos de uso: Aqui está uma oportunidade muito pouco explorada ao se reimaginar o que as notícias podem ser. Em Geeks, eu argumentava que o celular nos obriga a imaginar e servir diversos casos de uso de notícias, assim como o celular forçou o Facebook a construir ou comprar serviços para diferentes casos de uso de conexão social: o Facebook para organizar a informação dos amigos, o WhatsApp e o Messenger para se comunicar com eles, o Instagram e realidade virtual para compartilhar experiências com eles. Alguns exemplos de casos de uso para notícias: acordar e querer uma visão rápida do que está acontecendo desde o dia anterior (uma página inicial é uma desculpa bastante pobre para um produto que atende a essa necessidade, pois é construído para servir ao nosso desejo de promover histórias, não à necessidade do usuário de um tipo de informação); seguir e receber alertas sobre histórias que nos interessam (o Cir.ca original, que elogiei em Geeks, tentava responder a esse caso de uso, mas, infelizmente, acabou por ser uma visão sem um modelo de negócios e faliu); ter background ou explicação sobre uma história (a Vox começou criando “stacks de cards” de background para competir com a Wikipedia); conectar pessoas com outros membros de suas comunidades para conversar ou agir (os comentários são, infelizmente, um mecanismo insuficiente para fazer isso). Precisamos partir das necessidades das pessoas e atendê-las no contexto de seu uso, diferentemente no Facebook, ao usar o Amazon Echo ou no Snapchat.

Note que, em cada uma dessas situações, devemos mudar de produtos centrados na mídia — nosso jornal, nosso conteúdo, nossa página inicial, nossos comentários — para serviços centrados no público: um lugar em que as pessoas se juntem com os moradores de sua cidade; um lugar onde os idosos podem encontrar o desenvolvimento adequado para eles; alertas contínuos sobre desdobramentos em alguma questão com a qual pais de alunos no ensino médio se preocupam; um meio de conexão com outros que também estão preocupados em consertar uma praça depredada; e assim por diante. Não estou falando sobre a personalização do conteúdo que já temos (embora seria um bom e necessário começo). Estou falando, em vez disso, de criar novos produtos para atender a cidadãos específicos de novas formas.

É tentador imaginar que conhecemos as comunidades a serem servidas e o que elas precisam, porque é assim que operamos há muito tempo. E, para ser justo, até recentemente não tínhamos todos os meios que agora temos para ouvir o público ao qual servimos. Mas agora temos sim muitas maneiras de ouvir antes de decidir como servir uma comunidade. Precisamos trabalhar com essa habilidade. Comece com a comunidade, não com o conteúdo.

No programa de mestrado em Jornalismo Social da CUNY, que o livro Geeks inspirou, a Dr. Carrie Brown e nossos alunos encontram uma comunidade cujos membros se auto-identifiquem como uma comunidade (não millennials ou hispânicos, que são definidos externamente). Em seguida, atribuímos a cada aluno a tarefa de observar e ouvir as pessoas nessa comunidade para compreender e simpatizar com seus problemas, necessidades e objetivos. Sou bastante claro nas minhas instruções de que os alunos não devem levar uma ideia que eles já têm para a comunidade para ver o que eles acham. Não, primeiro traga evidências das necessidades da comunidade e depois — apenas depois — você deve imaginar como as ferramentas do jornalismo podem ajudá-las. Em seguida, leve uma proposta e, depois, um produto de volta para testar com a comunidade. Adapte. Enxágue. Repita.

Estou descrevendo uma variação de “design thinking” ou “design centrado no ser humano”, que é ensinado na D School de Stanford e está muito em voga no Vale do Silício. Ignore o hype ou os detalhes da metodologia; Post Its não são obrigatórios. Basta prestar atenção à ideia fundamental de que, se você está fazendo um widget ou um serviço de notícias, ou se você está servindo o que você pensa como um mercado ou uma comunidade, é sábio observar e ouvir antes de construir.

No primeiro ano em que ensinei Jornalismo Empreendedor na CUNY, dois de nossos melhores estudantes decidiram que queriam construir um serviço para ajudar pessoas de vinte anos a gerenciar melhor seu dinheiro. Eu os mandei conversar com pessoas daquela idade para aprender suas necessidades. Os estudantes voltaram com uma mensagem clara: as pessoas com vinte anos não têm dinheiro suficiente para gerir; eles não poderiam ter se importado menos com o serviço que os alunos imaginavam. Então, os alunos voltaram e falaram com pessoas com trinta e poucos anos, que, de fato, precisavam de tal ajuda, e surgiu um plano de negócios em torno dessa ideia. Depois de se formar, um dos estudantes construiu esse serviço em um jornal.

Meus colegas da CUNY, Sandeep Junnarkar e Jere Hester, lideraram um impressionante projeto com estudantes para investigar a praga de mofo em habitações públicas de Nova York. Em parceria com o New York Daily News, eles contaram a história ao público em geral. Eu chamo isso de jornalismo focado externamente — contar a história de alguém ao público com a esperança de que esse conhecimento leve a consciência e mudanças na política. Isso sempre foi e sempre continuará a ser um papel vital para o jornalismo. Mas a equipe da CUNY também praticou o que eu comecei a ver como jornalismo focado internamente — isto é, dizer à comunidade o que ela precisa saber para corrigir seu problema, desde como medir o mofo até denunciá-lo às autoridades e responsabilizá-la pelo tratamento de saúde da epidemia. Podemos discutir se isso é ativismo; em Geeks, deixei claro que não tenho nenhum problema com esse papel para o jornalista.

Quando apresentou suas lições do projeto de mofo para a nossa primeira classe de jornalistas sociais — levando à nossa exploração da ideia de jornalismo focado externamente versus internamente — Junnarkar disse que, quando o projeto já estava avançado, os líderes da comunidade da habitação pública agradeceram a ele, Hester, e os alunos por não apenas cair de paraquedas para explorar uma boa história, mas por permanecer para ajudar a comunidade a aprender, agir e lidar com ela. Mas então este residente perguntou por que a equipe da CUNY escolheu o mofo como assunto. É um grande problema, afirmou ela — mas não é o pior problema da comunidade. Será que os recursos jornalísticos consideráveis ​​da CUNY poderiam ter sido usados ​​melhor para a comunidade se seus membros tivessem um papel em decidir onde colocá-los? Aí reside o imperativo de observar, ouvir e perguntar antes de fornecer o que pensamos serem as respostas para uma comunidade.

No jornal imaginário do qual sou chefe, eu começaria por enviar os repórteres e editores do jornal, bem como colegas de negócio, técnicos, designers e profissionais de marketing para reportar de uma nova maneira — não começando como setorista ou com uma pauta na mão, mas sim com um ouvido aberto para uma necessidade e não uma história. Pergunte às pessoas de que comunidades elas dizem que pertencem. Pergunte-lhes sobre as informações de que precisam para gerenciar melhor suas vidas e comunidades. Observe como eles obtêm suas informações agora. Pergunte o que funciona e o que não funciona. Pergunte o que eles precisam ou querem.

Em seguida, a equipe retorna para comparar notas e aprendizados e começa a identificar comunidades — nos três tipos que descrevi acima — que parecem estar mal atendidas. Faça uma reflexão e pergunte o quão bem o jornal atende essas comunidades agora, ou se atende de alguma forma. Veja se essas necessidades são melhor atendidas em outros lugares. Em seguida, escolha algumas dessas comunidades que a equipe acredita que possa servir melhor. E, finalmente, pense em como servi-los.

Agora, falemos sobre desenvolver novos produtos. Eu uso ambas as palavras — “produto” e “desenvolver” — com conhecimento de causa. Eu preferiria o termo “serviço” do que “produto” para deixar claro que não estamos fabricando e comercializando uma coisa acabada; estamos ajudando as pessoas a fazer o que elas querem fazer. Mas “desenvolvimento de produtos” é um termo de trabalho já bem estabelecido no centro da reinvenção de organizações de notícias, então vou usá-lo. Eu também hesito em dizer “desenvolver”, pois não estou sugerindo por um momento que todos os jornais na América criem novos aplicativos para cada comunidade e cada caso de uso. Construir um novo serviço pode significar qualquer coisa, atribuir um repórter a uma comunidade, criar ou contribuir para uma página ou grupo do Facebook, programar uma série de eventos, criar um currículo. Quando tecnologia é necessária, sempre sugiro começar com uma pesquisa do que já esteja disponível. Alguns argumentam que as empresas de notícias precisam se tornar empresas de tecnologia para competir com o Vale do Silício e sobreviver. Não estou convencido de que somos capazes de aprender essas habilidades, depois de décadas demonstrando que somos ruins em tecnologia. Por outro lado, The New York Times, The Guardian, The Washington Post, Springer, Schibsted e outras grandes organizações de notícias possuem equipes consideráveis ​​de desenvolvedores e estão produzindo um ótimo trabalho (embora eu me envergonhe quando ouço a maioria das empresas de mídia pensando que são tão especiais que precisam criar seus próprios sistemas de gerenciamento de conteúdo). Quando digo “desenvolver”, eu poderia simplesmente querer dizer “começar” e quando eu digo “produto”, quero dizer, servir: comece a servir suas comunidades de novas maneiras.

No passado, quando chegava a hora de construir algo novo, o time editorial iria inventar uma nova reportagem ou seção sem pesquisa de mercado, então bateria na porta do departamento de tecnologia, pegaria uma ficha e ficaria atrás de um grande número de projetos de maior prioridade — ao longo do caminho talvez avisassem o comercial de que tinha algo rolando. Isso não funciona. Em vez disso, no início deste processo, eu estimularia uma empresa de notícias a convocar uma equipe pequena e multifuncional que represente o editorial (ou produto, como talvez seja conhecido), comercial (ou seja, a receita de qualquer fonte, uma vez que isto pode incluir eventos ou associação, além de publicidade), desenvolvimento de audiência (embora eu também não goste da palavra passiva “audiência”, ele costumava ser chamado de circulação), tecnologia/design e análise de dados (se essa habilidade existe na casa). Capacite-os para aprender as necessidades dos membros de uma comunidade e então conceber maneiras de atendê-los, com a sustentabilidade econômica em mente desde o início. Tenha em mente que sua organização de notícias não funciona isoladamente; existe em um ecossistema de mídia, informação e tecnologia, de modo que talvez seja necessário criar algo complementar ao que já existe ou colaborar com outros. A colaboração e o compartilhamento — com outros meios de comunicação de todos os tipos (jornal, emissoras públicas, organizações de notícias sem fins lucrativos, blogs locais e especializados e, criticamente, também Google, Facebook e outros), é um meio importante que devemos usar para ampliar o trabalho das organizações de notícias e do público para nos tornar ainda mais eficientes.

Digamos que você escolheu servir pais jovens. Já faz alguns anos desde que fui um, mas espero ainda me lembrar de suas necessidades, poucas das quais seriam respondidas com matérias e reportagens. As necessidades de informação de mães e pais jovens no que concerne a questões de saúde, aulas de cerâmica — o que você quiser — são universais e facilmente encontráveis em vários lugares. O que uma organização local de notícias pode fornecer? Talvez serviços de agendamento e correspondência para conhecer outros pais com filhos da mesma idade para sair para brincar. Talvez descontos em produtos e serviços locais. Talvez ativismo para consertar praças. Talvez classificações de creches vindas de outros pais. As oportunidades de negócios são muitas: publicidade mais direcionada; comércio; possivelmente eventos.

Digamos que queiramos servir proprietários de pequenas empresas. Mesmo em seu apogeu, as editorias de Negócios de jornais fizeram pouco para eles além de fornecer um ocasional artigo de relevância. Trabalhando com empresários locais, vi que eles viam valor em se conectar uns com os outros. Uma organização local de notícias pode convocar pessoas de negócios para discussões online, assim como eventos. O jornalista anteriormente conhecido como repórter de negócios pode observar essa discussão, descobrir as necessidades de informação da comunidade e, em seguida, respondê-las — puxar o telefone para explorar alguma questão sobre um nova política tributária ou trazer um especialista para explicar suas implicações, por exemplo. Assim, a organização de notícias permite o fluxo de informações de uma comunidade e acrescenta-lhe valor jornalístico. As oportunidades de negócios são claras: publicidade e comércio B2B direcionados, eventos, educação e mercados para serviços e empregos.

Outro exemplo: trabalhadores em trânsito, ou pessoas que passam pelos mesmos problemas. Talvez organizações de notícias deveriam ter criado o Waze, um mecanismo perfeito para permitir o compartilhamento de informações (uma década e meia atrás, eu escrevi um plano de negócios para um serviço que permitiria que os passageiros compartilhassem informações sobre o trânsito com os que estão vindo atrás. A ideia estava tolamente à frente da tecnologia disponível; tudo o que eu consegui bolar era um sistema tosco de perfis de usuários, telefonemas e SMS). Atualmente, as organizações de notícias podem aproveitar as APIs que o Waze e o Google Maps fornecem para dar ao público uma prévia da viagem antes de entrar no carro. Seguindo adiante, podemos dar aos passageiros uma maneira de conectar-se uns com os outros na comunidade imaginada que já existe em torno da Eisenhower Expressway de Chicago ou da Bay Bridge de San Francisco ou do Branch Ronkonkomo da Long Island Railroad, compartilhando perguntas e respostas, frustrações e dicas, queixas e desejos (pense, por exemplo, no Clever Commute, que soluciona a recusa irritante do departamento New Jersey Transit de postar as pistas mais de três minutos antes da partida. Ele usa dados históricos para dar aos passageiros a chance de em qual pista estarão). Aqui, também, um repórter pode ouvir a conversa corriqueira e adicionar valor jornalístico, conferindo com a polícia o que diabos deixou a I-95 uma bagunça nesta manhã, estudando dados do Waze para trazer perigosos pontos de trânsito para a atenção do público, obtendo respostas das autoridades de trânsito para as queixas dos passageiros. O benefício adicional para o negócio geral: aprender onde um cidadão mora e trabalha para que se possa segmentar conteúdo e publicidade mais relevantes.

Mais um exemplo a nível nacional ou local: donos de gatos. Sim, donos de gatos têm necessidades de informação além de compartilhar fotos bonitinhas e memes. Minha esposa manteve viva a querida felina da família, Hailey, por mais de um ano — curando seu diabetes ao mudar sua dieta — graças aos conselhos que recebeu de membros dedicados e experientes de uma comunidade online. O jornalismo pode convocar proprietários de gatos e especialistas, desmistificar o charlatanismo, fazer reviews de produtos — e, sim, compartilhar fotos de gatos também. As oportunidades de negócios giram principalmente em torno do comércio. E os custos são baixos.

Muitas vezes me perguntam como servir as chamadas comunidades de nicho pode ganhar escala. A primeira resposta é que nem tudo tem que escalar a proporções da mídia de massa se o serviço for eficiente e valioso. A resposta seguinte é que o que escala é a habilidade de identificar, ouvir e servir as comunidades; uma vez que descubramos como fazer isso algumas vezes, podemos fazê-lo muitas vezes. Eu diria que as habilidades para ouvir e servir podem se tornar habilidades estratégicas essenciais para empresas de notícias. Esta é uma competência que também podemos vender aos clientes anteriormente conhecidos como nossos anunciantes. O BuzzFeed não vende tanto espaço e tempo de mídia como vende uma habilidade (“Nós sabemos como tornar nossas coisas virais, então sabemos como fazer as suas coisas viralizarem também”). A mesma coisa a Vice (tornar coisas cool). Da mesma forma, nós, nas notícias, podemos vender a habilidade de servir comunidades, trazendo centros de jardinagem para nossa comunidade de jardinagem, hospitais para nossa comunidade de câncer ou cervejarias para fãs de cerveja. Hoje, tendemos a pensar que a única habilidade que temos para vender é contar histórias, e nós vendemos isso na forma de publicidade nativa, na qual muitas vezes misturamos conteúdo pago mal-rotulado com nossas reportagens independentes, confundindo nosso público sobre qual é qual e, assim, diminuindo nossos padrões e confiança ao nível de um camelô. Podemos fazer melhor que isso.

Com esse design e serviços centrados na comunidade, acredito que possamos começar a construir a nova casa quarto por quarto, construindo produtos mais relevantes e valiosos, refazendo nosso relacionamento com os públicos que servimos, reunindo e atuando em sinais de interesse e necessidade (ou seja, dados dos usuários), explorando novos fluxos de receita (membros, eventos, dados, comércio, serviço de anunciantes) e reinventando nossos negócios. Não alteraremos nossos modelos de negócios, redações e organizações da noite para o dia. Mas devemos começar a construir e aprender antes que a casa velha queime até o chão.

Então, digamos que descubrimos como construir relacionamentos reais com as pessoas, conhecer e atender às suas necessidades e não mais apenas produzir um site pra todo mundo. Aí, o destino — também conhecido como internet — lança sua próxima pedra no nosso caminho: a rede distribuída. Não podemos mais operar sob a arrogância de que nosso público sempre virá até nós. Devemos ir até eles. Não podemos confiar na produção de destinos. Devemos ser distribuídos entre Facebook, YouTube, Snapchat, Instagram, Twitter, Alexis, Google Home e o que vier. E não podemos simplesmente distribuir os artigos que já temos (assim como não podemos simplesmente personalizar a publicação desses artigos e chamar isso de relacionamento). Devemos criar conteúdos, produtos e serviços adequados aos casos de uso que cada plataforma envolve.

É muito bom que o Facebook tenha criado os Instant Articles para acelerar e melhorar a experiência de clicar em links para o nosso conteúdo — e tenha nos permitido exibir anúncios lá — mas será que realmente acreditamos que os usuários querem parar de explorar seus feeds de dicas, fofocas, fotos, vídeos e memes para ler nossas reportagens especiais de 1000 palavras? Só às vezes. Quando o Facebook finalmente tentou se tornar mais transparente sobre os princípios que governam suas decisões algorítmicas ao montar o News Feed, ficou claro que os amigos e a família vêm primeiro — é claro — e essas informações compartilham uma prioridade secundária, junto com o entretenimento. A verdadeira lição do Facebook para os editores deve ser que devemos aprender a produzir conteúdo de forma adequada às necessidades dos usuários. Uma vez, um executivo do Google tentou transmitir a mesma lição a uma sala cheia de editores de jornais, sugerindo que eles deveriam conhecer os criadores do YouTube para aprender sobre a criação de vídeos atraentes. Os executivos torceram o nariz: quem você acha que somos — editores ou Pewdiepies?! Eles não entenderam. Quando participei da Vidcon, uma conferência principalmente de fãs e criadores do YouTube, eu aprendi que, para os milhares de fãs, lá o conteúdo não é um destino. É um status social. Quando minha filha compartilha um vídeo com um amigo, ela está fazendo isso não como uma recomendação, mas sim porque o vídeo fala por ela ou porque diz algo sobre ela ou seu relacionamento com o amigo. O conteúdo se torna uma ferramenta para o que alguém quer fazer. Como trazemos o jornalismo às conversas das pessoas, onde e sempre que ocorrem?

Veja, por exemplo, como, durante a última eleição, o grupo Occupy Democrats fez memes no Facebook — fotos ou vídeos com texto para encapsular fatos ou argumentos — com a esperança de que isso se comunicasse com as pessoas e que elas passassem isto adiante (eles conseguiram de 100 a 300 milhões de impressões no Facebook a cada semana para o Occupy Democrats). Veja como a AJ+ e o NowThisNews se adaptaram ao fato de que o Facebook reproduzia vídeos automaticamente no News Feed sem som e, assim, aperfeiçoaram o filme mudo para a era social. A propósito, veja como Quartz, Politico, Skift e muitos outros fazem excelentes newsletters informativas que adaptam suas ideias de entrega de conteúdo à plataforma chamada e-mail. Eles estão fazendo ferramentas compartilháveis ​​e utilizáveis.

Não pense que plataformas sociais são meramente veículos para entrega de conteúdo, mesmo que esse conteúdo seja adaptado a cada uso. Não, plataformas sociais também são um meio para ouvir e servir. Acabei de passar muitos longos parágrafos argumentando que essas são as principais funções do jornalismo no futuro. Então, o que isso nos leva a fazer? Isso significa que precisamos considerar a construção de produtos e serviços inteiramente fora de nossos sites e nas plataformas como fins em si mesmos, não apenas como meio para direcionar o tráfego para nossos próprios destinos. Se eu fosse um dos meus estudantes de empreendedorismo hoje, consideraria a criação de um negócio no Facebook, permitindo que a plataforma cuide de tecnologia, produção, distribuição e vendas, com a esperança de que Instant Articles, vídeo monetizado e uma versão de publicidade nativa possam gerar o suficiente para suportar minha empresa muito eficiente (veja como exemplo o Jersey Shore Hurricane News, que foi construído no Facebook antes que esses meios de arrecadar receita fossem oferecidos por lá). Se eu estivesse dirigindo o jornal imaginário tolo o suficiente para me contratar, eu criaria produtos no Facebook com o objetivo de ganhar receitas lá, mas também para construir relacionamentos, aprender a servir comunidades específicas e gerar dados sobre as necessidades, interesses e afinidades dos indivíduos. Imagine que você sirva, digamos, fãs do Manchester United no Facebook com notícias, entrevistas, vídeos, memes, vídeos ao vivo de eventos especiais e muito mais. Alguns usuários você vai servir apenas no Facebook, e alguns usuários você pode atrair de volta para o seu site ou para o YouTube ou para onde eles querem ir, com o conhecimento de que são fãs do Man United e você pode impactá-los em outros lugares. O Facebook poderia mudar as regras e puxar o tapete da gente? Talvez. Mas não estamos servindo o Facebook. Estamos servindo os fãs do Man United lá, e se fizermos um excelente trabalho, podemos achar as formas de manter e encontrar o valor nesses relacionamentos.

E as boas e velhas notícias?, você poderia perguntar. E a cobertura da Câmara Municipal, acompanhar o prefeito, cobrir o jogo, as eleições, dar furos de notícias nacionais? Sim. Mas aqui eu seguiria a fórmula de Anita Zielina, chefe de produto no Neuchâz Zürcher Zeitung, da Suíça. Ela classifica as novidades e a nova redação em departamentos rápido, médio e lento. As notícias rápidas são aquilo sobre o que as pessoas podem se informar na TV e em uma série de serviços digitais. Gaste o mínimo possível de tempo, esforço e recursos quanto possível. Faça curadoria. A notícia média é onde você adiciona valor. No caso da NZZ, isso é provavelmente com um doutor que ofereça perspectiva e análise únicas. No caso de um jornal metropolitano, isso está em oferecer reportagens únicas. Isso também pode significar oferecer contextualização para as pessoas e — no modelo do movimento de jornalismo de soluções — formas de agir. É aqui que você coloca o maior esforço. A notícia lenta é mais o resultado de um centro de pesquisa ou de universidade; O NZZ ou o The Guardian ou mesmo o The New York Times têm mais chances de oferecer isso do que a sua estrutura de notícias metropolitana.

Através deste tipo de notícias, lembre-se de que elas devem ser oferecidas de formas relevantes e em casos de uso relevantes: use o Facebook para fazer memes e o Twitter para tuitar e, quando possível, informe plenamente seus usuários por lá; coloque links para um artigo quando um artigo for necessário e não redundante. E, quando possível, torne as notícias relevantes para as comunidades que você está servindo: não escreva sobre a reunião do conselho da escola, mas explique aos pais o impacto de uma briga sobre escolas privadas com financiamento público e o que elas podem fazer sobre isso. Não cubra o jogo e transforme a pontuação em uma matéria, mas apoie a comunidade de fãs com conversas; eles podem obter resultados de jogo em qualquer lugar. Não preveja quem vencerá a eleição, mas ouça as preocupações dos cidadãos e faça os políticos ouvirem. A menos que você possa adicionar um valor único a uma grande notícia nacional na agenda com algo que realmente faça a diferença para as pessoas em suas comunidades, não reescreva; coloque links.

Deixe o conteúdo noticioso comoditizado de lado. Torne-se exclusivamente relevante e valioso. Construa relacionamentos e confiança. Deixe a TV e o Twitter informar às pessoas o que acabou de acontecer. Ofereça mais.

Então, como esse jornal imaginário e reformado — ou revista ou emissora — ganha dinheiro? A estratégia de relacionamento oferece uma série de oportunidades em vários fluxos de receita e eficiências.

Comece com publicidade. No nível mais básico, se você está produzindo produtos e serviços que são mais úteis, envolventes, relevantes e valiosos para as pessoas, você obterá maior fidelidade, engajamento e uso, e, mesmo no antigo modelo de publicidade baseado em CPM, você terá um maior inventário de anúncios. Mais do que isso, conhecer os interesses e as necessidades das pessoas — a nível individual — permitirá que você venda publicidade de alto valor e altamente segmentada.

A única forma de lutar contra a comoditização da mídia nas mãos da publicidade programática e retargeting e das grandes plataformas é reunir nossos próprios dados de terceiros. E a melhor maneira de reunir esses dados não é forçando nossos usuários a entregá-los ao se cadastrarem, ou inferi-los através de dados demográficos ou sorrateiramente compilar dados de serviços que se aproveitam da privacidade, como a Acxiom. Não, a melhor maneira é fazer uma transação aberta e clara com os usuários, oferecendo um valor óbvio em troca de dados. Se você descobriu que alguém é uma mãe jovem, porque ela usa o ótimo serviço que você fornece para mães jovens, então ela está lhe dando seu consentimento para usar essa informação — se você usá-la para o benefício dela. Você também poderá convidar os anunciantes para o relacionamento, desde que sejam respeitosos com essa mãe. Esta, afinal, sempre foi supostamente a principal proposta de valor da mídia para anunciantes: não compartilhar impressões, exposição ou até mesmo atenção — outdoors fazem isso (e, portanto, é apropriado que a primeira e pior forma de publicidade digital fosse chamada assim). Em vez disso, nós, na mídia, deveríamos construir relacionamentos de confiança com o público, e é disso que os anunciantes querem se beneficiar.

O valor da estratégia de relacionamento talvez seja mais fácil de ilustrar com outros fluxos de receita que os editores estão começando a experimentar: eventos. É um pouco irônico que uma das novas oportunidades nesta era digital venha reunir as pessoas não online, mas na vida real; essa é a oportunidade que Scott Heiferman identificou em 2002, quando fundou o Meetup. No entanto, muitos editores estão encontrando sucesso na convocação de pessoas para uma ampla gama de eventos: entrevistas, palestras, painéis, aulas, concertos, feiras de artesanato, festivais. O New York Times criou um palco que é utilizado para entrevistas com grandes nomes. O Texas Tribune arrecada mais de US$ 1,5 milhão por ano com seu festival e também com entrevistas públicas semanais patrocinadas com políticos e oficiais (elas incluem almoço grátis). O Guardian tem uma variedade impressionante de aulas (embora tenha desistido da construção de uma grande instalação para eventos). A Billy Penn faz listas dos melhores profissionais em um campo ou outro na Filadélfia (uma marca antiga de revistas urbanas e jornais de negócios locais) e, em seguida, os reúne para eventos; isso representa mais da metade da receita da startup.

Os eventos fornecem duas fontes óbvias de receita: ingressos e patrocínio. Eles também trazem novos custos — locais, reservas, emissão de bilhetes, restauração, audiovisual— e exigem novas habilidades. É difícil fazer eventos em escala. Mas há um valor oculto nos eventos. Há dados aqui: se as pessoas se dão ao trabalho de sair de casa, vir e talvez ainda pagar para ver a sua entrevista com o quarterback do time da cidade, sua feira de noivas, seu festival de comida, sua aula de investimentos ou o Meetup sobre pugs que você organiza, então você tem um sinal forte e confiável de seu interesse nesses tópicos. A chave é reunir e usar esses dados para benefício mútuo em outros lugares, permitindo que eles informem sua segmentação e criação de conteúdo e como você trabalha sua publicidade. O valor para o usuário não é apenas o seu conteúdo, mas também as outras pessoas na sala: a comunidade em potencial lá. Seria sábio promover conexões contínuas entre eles. Ao construir qualquer um dos serviços de comunidade que mencionei acima, eu verificaria se e como eventos poderiam estar em sua estratégia.

Outra nova oportunidade de receita auxiliada por dados — que ainda é quase inexplorada em nossa indústria — é o comércio. Eu continuo aguardando o momento em que Jeff Bezos vai abrir a torneira da receita de comércio no Post. Bezos é a pessoa no mundo melhor posicionada para executar a estratégia de relacionamento, pois ninguém entende melhor como coletar, analisar e atuar sobre os dados de um usuário para retornar relevância e recomendações e maximizar a receita. A Amazon e o Google estão apostando tudo em entregas no mesmo dia — e até em uma hora. Isso deve dar uma sacudida na cadeia alimentar de cada varejista local e dos jornais que ainda dependem da publicidade desses varejistas. Com recomendações de mercadorias altamente personalizadas, boas ofertas, encomendas mobile convenientes e agora o frete, acredito que o varejo americano local experimentará um golpe profundo. Ops, lá se vai outro fluxo de receita de jornal.

Como as empresas de mídia locais podem ficar com uma parte dessa receita de comércio? No nível mais simples, eu experimentaria com a substituição da publicidade remanescente barata e irritante com unidades de comércio — por exemplo, recomendações e links simples da Amazon — ganhando as taxas de programas de afiliados normalmente miseráveis, apenas para começar a aprender. Quando os itens venderem bem, você pode fazer ofertas próprias melhores para os comerciantes e ainda diretamente com os fabricantes. Um pequeno conjunto de empresas — Gizmodo (nascido Gawker) Media, Business Insider, New York Magazine, Wirecutter, Purch Media e Condé Nast — estão começando a aprender as chaves do sucesso no comércio. Essencialmente, eles estão criando um novo tipo de conteúdo nativo, apenas nativo de recomendações de venda em vez de publicidade. O conflito de interesse é óbvio, mas o lado bom também: o sucesso do comércio na mídia depende da confiança e da credibilidade com seus usuários, e não do volume de audiência como fim em si mesmo. A boa notícia é que o comércio pode nos tornar menos dependentes de uma publicidade cada vez menor. A má notícia é que — dadas as preferências dos clientes sobre onde estão mais propensos a comprar — o comércio também nos tornará dependentes da Amazon, assim como dependemos do Google e do Facebook para audiência e receita publicitária.

Claramente, o comércio só funcionará com o esforço de merchandising (uma das muitas novas habilidades que uma organização de notícias precisa), e isto deve ser alimentado, mais uma vez, com dados de terceiros, bem como com conteúdo relevante. Então, o verdadeiro benefício de iniciar com comércio agora, mesmo antes de você estar pronto, é que isso motivará o negócio a começar a reunir esses dados. Se você sabe que seu usuário é um pai jovem, porque ele ou ela usa seu serviço voltado para famílias jovens, você sabe as unidades de comércio de qual loja fornecer. Se você proporcionar serviços mais granulares e souber quantos anos têm os filhos dele, você pode ter links comerciais mais relevantes e lucrativos. Ao comprar e construir mercados de larga escala, as duas editoras mais inovadoras da Europa, Springer e Schibsted, estão aprendendo algumas dessas habilidades.

A maior questão para a nossa imaginária organização de notícias metropolitana é se existe alguma receita de comércio local com nossos antigos amigos e clientes, os varejistas locais. Há dois problemas aqui. O primeiro é o frete. Uber et al estão nessa. O Walmart flertou com a ideia de transformar os clientes em uma rede de distribuição. Alguns jornais tinham fantasias sobre a reutilização de seus caminhões para entregar o proverbial piano. O Correio dos EUA — que é um concorrente-chave no negócio de entregar publicidade impressa e, portanto, está tão desesperado quanto nós para novas oportunidades de receita — poderia atender ao desafio de entrega expressa local. Se houver uma escala suficiente de comércio local via frete, espero que surjam soluções para as empresas de mídia para ajudar os varejistas locais online.

O segundo problema são dados: os dados das lojas. O inventário delas geralmente não é guardado digitalmente e, portanto, não pode ser exposto online aos clientes. Para competir com a Amazon, os varejistas locais devem digitalizar seus inventários. Podemos ajudá-los? O OpenTable descobriu que, para oferecer reservas de restaurantes on-line, deveria permitir que os restaurantes digitalizassem suas próprias agendas de reserva. Devemos fazer o mesmo para os varejistas? Uma vez criei um plano de negócios para uma empresa assim.

Assim como precisamos nos ver como um serviço em vez de uma fábrica de conteúdo para o público, precisamos nos ver como prestadores de serviços, em vez de apenas funis de audiência para nossos anunciantes. O que mais podemos fazer por eles? Talvez também possamos ajudá-los a construir e analisar seus perfis de clientes — isso seria um exemplo de como aproveitar a habilidade que aprendemos na estratégia de relacionamento e depois revendê-la.

Até agora propus que desenvolvamos fluxos de receita do público através de eventos e comércio. Por que não assinaturas e paywalls? No Geeks, eu argumentava que a venda de conteúdo funciona se você estiver fazendo conteúdo exclusivo, como entretenimento, mas não se você estiver fazendo conteúdo comoditizado, como notícias e informações.

No entanto, acredito que temos oportunidades de ganhar receitas vindas do público através de associados e mecenato — bem como conteúdo premium — e eu exploraria essas possibilidades com cada novo serviço comunitário que eu desenvolvesse. Ao pensar em associados, precisamos explorar novas tribos, novas recompensas e novas contribuições:

Novas tribos: Da mesma forma que a rádio pública nos EUA aprendeu através de longa experiência, há um limite para o número de pessoas que têm afinidade e estão dispostas a pagar e apoiar uma emissora de rádio: entre 6 e 12 por cento, pelo que ouvi. Os esforços de adesão precisam se conectar com outras afinidades que as pessoas têm — talvez em torno de um programa ou um jornalista ou um projeto, em nossos termos, ou melhor ainda, em torno de uma comunidade nos termos do público. Isso tem conexão com o âmago da estratégia de relacionamento. Provavelmente não vou querer ser um membro da Desgraça Diária do Fim do Mundo, mas eu poderia querer ser um membro apoiador do Clube Ambiental do Fim do Mundo, ou da Sociedade de Voluntários Aposentados ou do Clube dos Padeiros Bêbados. Identificar comunidades autodefinidas é uma habilidade estratégica quando se trata de estimular receita vinda de clientes.

Novas recompensas: Devemos estar conscientes da motivação de uma pessoa em se tornar um membro de uma organização para que possamos oferecer-lhes incentivos adequados — além de apenas acessar nosso conteúdo. Eles podem querer status social (a proverbial sacola #humblebrag das rádios públicas)[links dos tradutores] ou uma sensação de realização (apoiando, digamos, o projeto do Guardian para contar todas as mortes causadas pela polícia nos Estados Unidos) ou descontos (o Pug Club não deveria oferecer cupons de desconto para comida de cachorro do nosso patrocinador?).

Novas contribuições: Precisamos aceitar e recompensar o valor do público em formas que não sejam dinheiro. As pessoas podem nos dar marketing (recomendando nossos serviços em mídias sociais), vendas (trazendo outros membros), esforço (trazendo informações), expertise (anos atrás, contadores e engenheiros se ofereceram para contribuir para uma investigação de um jornal da Gannett sobre auxílio de furacões na Flórida) e dados (interesses, dados demográficos, comportamento, intenção de compra — qualquer coisa que possamos usar para benefício mútuo).

Nada disso funcionará se não reconsiderarmos ao mesmo tempo as métricas que usamos para construir e gerir nosso negócio e motivar a equipe. Sim, alcance ainda é valioso para publicidade baseada em volume, o que (esperamos) não nos deixará ainda. E, sim, o alcance ainda é necessário para empurrar usuários pelo funil para relações de maior valor, incluindo vendas e associações, além de assinaturas e conteúdo premium. Mas alcance sozinho não é mais um negócio por si só. É só o começo.

Eu mediria o desempenho do meu jornal imaginário em métricas de relacionamento: quantas pessoas conhecemos tanto como indivíduos e quanto como membros de comunidades; o que estamos fazendo para que eles deem sinais de interesse e intenção para nós (ou seja, qual o valor direcionado que nós os entregamos); quantos desses sinais nós reunimos; o que sabemos sobre conversão, e assim por diante. Como discuti no Geeks, precisamos ter em conta o valor variável de um usuário, fazendo com que nossa empresa maximize o valor de cada relacionamento. Eu também tentaria medir o quanto somos considerados confiáveis ​​em nossas comunidades. E eu acompanharia nosso impacto em melhorar a vida das pessoas como o melhor indicador de nosso valor. Veja o trabalho que a Chalkbeat, o Center for Investigative Reporting e a ProPublica estão começando a fazer nesse sentido. Eles estão criando mecanismos para que os repórteres estabeleçam metas de impacto centrado no público — não tráfego ou atenção — antes que eles comecem a trabalhar.

Como será a nossa empresa quando começarmos a nos mudar para a nova casa? Ainda não estou pronto para termos um novo organograma. Na verdade, a última coisa que eu recomendaria agora é demolir a redação em torno de uma estratégia não testada. Eu ouvi falar de muitas redações nas quais as equipes têm fadiga da salvação. Embora a forma da organização ainda seja o foco, o que está cada vez mais claro é a variedade de novas habilidades necessárias em ambos os lados do negócio. No Tow-Knight Center da CUNY, pesquisamos as habilidades atuais (e futuras) necessárias para empresas de notícias. Estamos construindo novos currículos, diplomas e ofertas de desenvolvimento profissional em torno dessas habilidades. Também estamos convocando e apoiando comunidades profissionais práticas em torno de algumas dessas disciplinas, reunindo os 20 maiores desenvolvedores de produtos ou executivos de audience development ou varejo para que possam compartilhar necessidades, melhores práticas e avançar em seus campos. Esperamos que isso crie um círculo virtuoso: aprendemos o que é necessário em cada campo e formamos profissionais capazes de ocupar essas vagas.

Em uma empresa de notícias, assim como em um curso de jornalismo, considero dar a cada funcionário de todas as áreas do negócio não só um entendimento firme dos valores e verdades jornalísticas que afirmamos, mas também um conjunto básico de habilidades centrais (por exemplo, todos em equipes editoriais precisam conseguir tirar uma foto decente com um iPhone, manter uma conta em rede social e entender como usar as mídias sociais para pesquisa). Então, podemos oferecer oportunidades para que indivíduos desenvolvam especialidades ou superpoderes, como gostamos de chamá-los no nosso programa de desenvolvimento profissional CUNY J+ (por exemplo, conseguir fazer vídeos na web bem produzidos ou gerenciar a presença social de uma marca ou desenvolver produtos). Escolas e empregadores devem ajudar os alunos e funcionários a compilar o que chamo de roteiro de habilidades — áreas de especialização construídas sobre capacidades básicas em habilidades centrais — para desenvolver suas carreiras e preencher as necessidades do mercado.

A lista de habilidades necessárias continuará a se desenvolver à medida em que encontrarmos novas oportunidades (quem imaginaria que o Washington Post contrataria produtores em tempo integral para o Facebook Live e o Wall Street Journal, um produtor para Snapchat?). Entre elas:

  • Mídia: Na minha noção de roteiro de habilidades, as redações e as escolas de jornalismo precisam classificar habilidades e ferramentas nos seguintes níveis: (1) conhecimento da ferramenta e o que ela pode fornecer para a cobertura, (2) capacidade de conferir requisitos com um programador ou especialista, (3) capacidade de adaptar o que foi programado sem estragar tudo, (4) capacidade de fazer este algo, e (5) experiência ou capacidade de ensinar a ferramenta ou habilidade. Uma empresa deve estabelecer níveis mínimos em todas essas habilidades (por exemplo, todos conseguem tirar uma foto decente com o celular) e oferecer oportunidades para que estudantes e funcionários se tornem especialistas (por exemplo, o gênio do jornalismo de dados). No fim das contas, a gestão da redação deve ter prontamente as habilidades necessárias para aproveitar qualquer oportunidade de fazer jornalismo, e as escolas de jornalismo devem permitir aos alunos que preencham essas necessidades. No programa J+ da CUNY, a escola também está aumentando essas habilidades nas redações. Essas são as habilidades que já sabemos que precisamos. Os funcionários e os alunos também devem ser incentivados a experimentar as ferramentas mais recentes — recentemente, fotografia e vídeo em 360º, AR/VR e outros — sem tentar algo apenas porque é legal.
  • Social: Todo mundo vai precisar manter uma presença social em várias plataformas e alguns precisarão ser especialistas (embora, na nossa comunidade de prática de audience development, tenhamos aprendido — contra-intuitivamente — que as melhores pessoas a manter a presença social de uma marca de notícias provavelmente não são estrelas das redes sociais, pois assim podem se concentrar na marca como seu foco de trabalho). As habilidades sociais devem se estender para muito além de jorrar matérias de jornal para obter mais tráfego — ou seja, marketing — para entender a melhor forma de ouvir o público, não só para ajudar a informar e ver o que está acontecendo, mas também para servir à estratégia de relacionamento que tenho delineado aqui: compreensão das necessidades de uma comunidade para atendê-los melhor e coleta de dados para alimentar os funis de conversão. Tal como acontece com sistemas de gerenciamento de conteúdo, as empresas de notícias usam várias ferramentas de análise — Chartbeat, Parsely, Google Analytics, Omniture e assim por diante — de modo que o treinamento vai variar. E acabei de argumentar que precisamos superar as métricas centradas na mídia (o quão popular é o nosso conteúdo?), para chegar nas métricas baseadas no relacionamento (o que sabemos sobre as pessoas e como isso nos permite atendê-las melhor? … quem é mais provável de se converter em ser um membro ou um cliente de varejo?). Um requisito fundamental na estratégia de relacionamento é construir, analisar e atuar a partir de dados de perfis individuais de usuários e trabalhar com outras ferramentas, como o Salesforce.
  • Dados: Esta categoria ainda é muito ampla, abrangendo tudo, desde raspagem, análise, apresentação e visualização de dados para narrativas, até a coleta, análise e atuação sobre dados tanto para audience development quanto para obtenção de receita. Repórteres investigativos precisam de um conjunto de habilidades e ferramentas, pessoas de desenvolvimento de audiência, outras, os responsáveis por membros e comércio, ainda outras. Entretanto, assim como com habilidades de redes sociais, será fundamental desenvolver em nossos alunos e funcionários uma alfabetização básica de dados. No caso dos jornalistas, isso significa acabar com o medo dos números.
  • Desenvolvimento de produto: Construir um produto — isto é, o serviço — e trabalhar em equipes para apoiar esse trabalho será útil em todos os departamentos: editorial, receita, marketing, tecnologia, dados. Também é claro que o desenvolvimento de produtos e a gestão de produtos são experiências que as empresas de notícias exigirão para altos executivos. Construir novos produtos é essencial para criar uma nova estratégia e novos meios de sustentabilidade em qualquer empresa de mídia.
  • Receita: À medida que empresas de notícias passem a depender de múltiplos fluxos de receita, elas também dependerão de uma ampla gama de novas habilidades. Claro, empresas de conteúdo já estão atuando como agências de publicidade, criando publicidade nativa e construindo planos de mídia em torno dela. Eventos exigem pessoas que possam lidar com reservas e logística. Uma vez que o varejo dê certo, isso significará a contratação de pessoas que possam vender de forma eficaz. As campanhas de adesão de membros requerem um tipo de comerciante diferente do antigo diretor de circulação — pessoas que são mais como organizadoras de comunidades comerciais. E em todos os fluxos de receita, haverá necessidade de experiência em dados: de gerenciar perfis de usuários para analisar o comportamento do público a cuidar de relações com anúncios programáticos.
  • Liderança e gestão da inovação: Na CUNY, ouvimos constantemente a necessidade de treinar os executivos existentes em novas habilidades em torno da gestão da mudança e de dar aos jovens líderes do futuro o negócio, a gestão e as habilidades estratégicas que eles não necessariamente conseguiram aprender na escalada rápida e merecida a sua posição-chave de hoje (estou trabalhando em um currículo para um novo programa de desenvolvimento profissional e graduação para atender apenas a essa necessidade na CUNY. Fique atento.)

Então, o que acontece com o velho jornal (ou revista ou emissora)? Na maior parte do tempo, as empresas estão mandando o velho Vovô Jornal para o asilo, pegando a aposentadoria dele, enquanto dura, mas, de outra forma, abandonaram-no, dando-lhe de comer na boca (com matérias de agência que viralizaram) e esperando que ele morra. Dado que argumentei em favor de uma estratégia digital first, você poderia achar que isso provocaria uma schadenfreude em mim: tudo bem, deixe-o morrer, o velho gagá! Mas não. Digo que esta é uma oportunidade para repensar o caso de uso da publicação ou emissora com legado e assim revitalizá-la. Não estou sugerindo que nós os mantenhamos respirando por aparelhos após sua vida útil rentável. Na verdade, alerto contra sucumbir à tentação de subsidiar a operação de um jornal impresso com modelos de preços de assinatura que lançam e desvalorizam assinaturas digitais apenas para anunciar uma publicidade impressa de maior valor e prolongar a vida do jornal como um fim em si mesmo. Não sugerirei investir muito no desenvolvimento de produtos impressos. Mas argumento que, enquanto deixarmos o impresso continuar por aí — para comer seu fluxo de caixa e subsidiar e promover o desenvolvimento de novos produtos — não há motivo para que não possamos reconsiderar o que é um jornal ou uma revista impressa ou um programa de rádio ou de TV e o que ele pode fazer.

Recentemente, na Alemanha, peguei uma cópia do Der letze Zeitungsleser (O Último Leitor de Jornal) de Michael Angele, uma elegante elegia à velha guarda e seu leitor desaparecido, que é sintomático de nossa tendência a esculpir memoriais aos nossos produtos antigos, tratando-os como santificados, protegendo-os da mudança. Em nossa autojustificativa circular, continuamos dizendo que as pessoas gostam do jornal porque alguns ainda o compram quando é a única coisa que nós os oferecemos para comprar. Vejo ainda mais protecionismo cultural nas notícias televisivas, uma forma cuja ortodoxia muitas vezes insípida pode ser um desafio. A revista pode ser a forma antiga mais defensável que temos porque oferece uma experiência diferente, se abstendo da pressa e servindo uma comunidade de interesse. Mas e o jornal? Quão absurdo é o fato de ele não estar mudando. Quem precisa de um produto que lhe dá o que você já sabe e tenta te enganar, que nem sushi de aeroporto, que está fresquinho? O que poderia e deveria ser um jornal impresso quando a maioria de suas funções foram tomadas pela rede? Do ponto de vista do usuário, ele poderia fornecer background, explicação, perspectiva, opinião e debate civil em torno das notícias e suas questões. Do ponto de vista do negócio, poderia promover o máximo possível do que a empresa jornalística está fazendo digitalmente, levando os usuários a novos produtos, muitas vezes simplesmente ao replicar o melhor deles no papel.

Agora, é verdade que a morte do jornal impresso foi prevista antes e a profecia não aconteceu. Mas todos sabemos que o seu melhor fluxo de receita, anúncios classificados, está morto faz tempo e o varejo continua a evaporar. A última razão boa para continuar a imprimir e distribuir um jornal são os encartes, e já estamos vendo o que está acontecendo com esse negócio; para a McClatchy, o negócio independente de encartes tem diminuído a uma taxa de cerca de 20% ano a ano. Imagino que os jornais que já mudaram de uma rotina de publicação de sete para três dias por semana vão reduzir para a produção apenas no fim de semana, desde que exista um último encarte da Best Buy e enquanto os custos fixos de impressão e distribuição não destruírem a empresa. Posso imaginar um New York Times ou Guardian semanal — pensado como o Die Zeit da Alemanha — sobrevivendo por bastante tempo como revistas inteligentes, competindo com a The Economist.

Assim, à medida que a casa queima, eu tomaria alguns dos meus mais brilhantes e inventivos colegas e daria-lhes a tarefa de curto prazo de repensar o produto impresso: pode chamar este de O Último Redesign. Eu seguiria a política digital first da Advance de não permitir que os editores do impresso gerenciem a nova redação. Eu promoveria explicitamente os esforços digitais da empresa e os esforços da audiência também — honrando as melhores contribuições de opiniões ou fotografia do público, recompensando-os com tinta no papel. Eu designaria alguém do departamento comercial que, sim, provavelmente não está longe da aposentadoria, para maximizar o fluxo de caixa e o subsídio para o negócio digital. Se isto ainda não aconteceu, eu obviamente mandaria para o brejo o equipamento de impressão e distribuição, os imóveis e operações.

E quando chegar o dia do Vovô Jornal sucumbir, eu não lamentaria, eu comemoraria — se, nesse meio tempo, eu tiver ajudado a criar uma nova empresa que possa sobreviver sem ele.

Então, com o que a minha empresa jornalística se parece no final?

É muito menor do que costumava ser — ou já é — e está livre da exigência ridícula de manter seus níveis de receita e escala de alto nível (“quando o digital vai substituir minha receita do impresso?”, “quando a receita digital vai suportar a redação que tive desde que tínhamos um monopólio?”). Ela pode ser altamente eficiente e lucrativa.

Ela — como muitos outros setores da economia na era digital — atua como uma empresa de serviços e não como uma fábrica que monta um produto. É isso que alimenta sua equipe e cultura, que deve começar todos os dias se perguntando o que pode fazer para ajudar suas comunidades a atingir seus objetivos e terminar todos os dias perguntando à comunidade se conseguiu. Ela vai reunir uma grande variedade de habilidades.

Sua equipe será organizada em times habilitados e multifuncionais em torno das comunidades que servem, em vez de silos de produção (um departamento de fotos, um copidesque, um departamento de circulação). Será ágil e capaz de prever novas oportunidades para fazer e melhorar serviços.

Ela existirá em um ecossistema, trabalhando em estreita colaboração e dependendo de outros: sim, isso significa expor nosso estômago a Facebook, Google, Amazon e outros porque não temos escolha. Eles, também, dependem de um fluxo de informações confiáveis e, portanto, podemos trabalhar juntos nesse sentido.

Também significa ser complementar aos outros em nossos mercados: os poucos blogs locais que continuam; outros veículos de comunicação (agora que a TV está percebendo que não pode governar para sempre); outras startups de notícias (um Texas Tribune para cada estado); veículos complementares (deixe que o Washington Post ou o New York Times forneçam minhas notícias nacionais para que eu possa me especializar nas locais).

Será rápido e inteligente ao adaptar tecnologias, mas, a menos que alguém me dê os mundos e fundos do New York Times ou do Washington Post, não será capaz de justificar o ego de construir seu próprio sistema de gerenciamento de conteúdo (o que quer que isto signifique em uma era de serviço) ou muitos aplicativos e bots mobile amigáveis.

Ela colaborará ansiosamente com outras pessoas do setor que invistam na fabricação de tecnologia legal.

Desenvolverá e dependerá de múltiplos fluxos de receita: publicidade de muitas formas e de maior qualidade e valor; receita vindas do consumidor por vários canais, incluindo talvez assinaturas, associação, eventos e comércio.

No lado de negócio assim como na redação, ela irá organizar seus esforços em torno do serviço, em vez do produto.

Ela vai melhorar em termos de qualidade, deixando de produzir conteúdo comoditizado, mas tornando-se um conjunto relevante e valioso de serviços para suas comunidades.

Ela vai crescer e escalar desenvolvendo novas habilidades que pode reutilizar e revender.

Ela se tornará especialista em ouvir.

Será uma casa de muitos quartos, construindo e testando um de cada vez, abandonando alguns e reconstruindo muitos outros ao longo do caminho.

Ela vai valorizar, e não temer, a mudança.

Tudo isso é apenas uma estratégia de curto prazo, uma maneira de reinventar e resgatar o jornalismo antes que seja tarde demais. Precisamos ganhar tempo para reinventar o jornalismo porque podemos — porque haverá tantas novas maneiras de atingir nossa missão — e não apenas porque devemos. Claro, não há garantia de que a minha estratégia vá funcionar e nenhuma maneira de saber até que alguém tente. Então, tente, por favor. Há apenas duas garantias: que não nos reinventar resultará em morte certa e que estamos no início de um longo processo de reinvenção. Nós ainda não sabemos o que a internet é. Nós ainda não sabemos o que o jornalismo pode ser. Mas aqui tem um começo.

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Marcelo Fontoura
Farol Jornalismo

Digital Journalism Professor at PUCRS. Addicted to bits. I also play guitar. https://www.marcelofontoura.com/