Índice de transparência da Moda Brasil

Larissa Henrici
fashionistadobem
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5 min readNov 6, 2018
Arte retirada do relatório oficial da edição pelo Fashion Revolution

No dia 11 de outubro houve o lançamento do 1º Índice de transparência da moda do Brasil, o primeiro país a receber esse projeto em análise exclusivamente local. O primeiro Índice de transparência da moda global foi organizado em Londres pela primeira vez em 2016 e está em sua 3ª edição que através do movimento Fashion Revolution analisa 150 marcas anualmente. (Índice de transparência da moda Global 2017 https://issuu.com/fashionrevolution/docs/fr_indice_2017) . No Brasil o projeto teve parceria técnica da FGVcees (Centro de estudos de sustentabilidade da fundação Getulio Vargas), parceria institucional da ABIT e ABVtex e financiamento do Instituto C&A (Iniciativa de responsabilidade socioambiental da varejista).

Estava presente Carry Somers, cofundadora do movimento global Fashion Revolution, que surgiu em 2014 após o desabamento do prédio Rana Plaza, onde mais de mil trabalhadores morreram numa fabrica de roupas em Bangladesh por falta de fiscalização do local. Diversas marcas foram expostas ao encontrarem suas etiquetas nos escombros e muitas delas alegaram não saber que suas roupas estavam sendo feitas nessas condições. O movimento lançou sua principal campanha “Quem fez minhas roupas?” para trazer essa discussão à tona e conscientizar os consumidores.

Carry Somers- cofundadora — foto : acervo pessoal

Passos para uma mudança maior

Após a abertura de Fernanda Simon coordenadora do movimento Fashion Revolution no Brasil, que este ano consolida o trabalho de 4 anos no país, tornando-o um Instituto, convida Carry ao palco para, de uma forma otimista e prática, fazer seus apontamentos sobre novos caminhos da moda

“Precisamos de uma mudança radical de paradigma e, que a forma como nos produzimos e consumimos as roupas precisa ser transformada. Isso significa que o modelos de negócios vai precisar mudar e uma série de soluções será necessária. A transparência por si só não representa a mudança estrutural e sistêmica que nós queremos ver na indústria da moda mas, com certeza nos ajuda a chegar lá! A nos revelar as estruturas que existem para que possamos entender melhor as coisas e muda-las.”

Sobre o índice ela procurou alinhar as expectativas em relação ao documento, que não busca criar um ranking de marcas mas avaliar o quanto um consumidor interessado poderia ter acesso à informações da marca que consome “O índice de transparência mede o quanto de informação as marcas divulgam sobre seus fornecedores, políticas e praticas da cadeia de suprimentos e os impactos sócio- ambientais. Tanto no índice global quanto o brasileiro olhamos para Políticas, governança e rastreabilidade, como as marcas avaliam seus fornecedores e corrigem seus problemas.”

Marcas analisadas

Apresentação das marcas analisadas. Foto: Acervo pessoal

Foram analisadas 20 marcas, selecionadas a partir de faturamento anual, diversidade de segmento no mercado e posicionamento top of mind. Contemplando os setores de varejo, jeans, jovem casual, calçados e esportes.

A coordenadora Educacional do Fashion Revolution Brasil, Eloisa Artuso destaca a importância desse momento histórico “É muito importante um evento como esse que coloca na mesma mesa o consumidor, a indústria e terceiro setor para pensarem juntos” .

Diferente da edição global em que as marcas foram notificadas sobre o estudo, aqui no Brasil as marcas tiveram um encontro com os organizadores do projeto para poderem entender a ação. A intenção não é dar um troféu para alguém ou só receber a notícia de que está muito ruim mas colocar uma agenda em marcha para melhorias, como pontuaram os organizadores durante o evento. Uma prova disso é que 4 marcas internacionais que foram analisadas no primeiro índice global em 2016, que estão presentes no documento brasileiro obtiveram melhoras em sua pontuação.

Alguns resultados

O documento resultante do trabalho feito esse ano com apoio técnico metodológico da FGVces propõe uma pontuação em porcentagem, resultante de aproximadamente 200 perguntas pesquisadas e feitas às marcas. E os números do Brasil trazem um comportamento similar à analise global, aqui apenas 2 marcas ponturam mais que 50% e 8 marcas com pontuação zero (Brooksfield, Cia Marítima, Ellus, John John, Le Lis Blanc Deux, Olympikus, Moleca e Melissa) . Carry ressalta que “A pontuação baixa não significa que as marcas não adotam boas praticas só significa que elas não estão revelando publicamente informações sobre isso.” Em resumo fica claro o quão pouco sabemos sobre a cadeia que move os produtos de moda tanto no Brasil quanto no mundo e iniciativas como essa criam uma agenda para engajar o mercado, o consumidor e os produtores, a partir do momento que novos valores ganham espaço é interesse de todos os stakeholders de atingir melhor credibilidade.

Link para o ITM Brasil http://issuu.com/fashionrevolution/docs/fr_indicedetranparenciadamodabrasil?e=25766662/65082221

O futuro é transparente

Recorte do documento Índice de Transparência da Moda

Ter um projeto tão alinhado com os movimentos expoentes de inovação na moda com um olhar para o Brasil, com certeza fala muito sobre a relevância de nossa indústria tanto no cenário mundial quanto nacional, como disse Rafael Cervone da ABIT Associação Brasileira da Indústria têxtil) que destacou alguns números “No mundo 1 a cada 6 pessoas trabalha na área têxtil. No Brasil ela representa 6% de todos os empregos, 16,7% dos empregos e 5,7% de todo faturamento na Indústria de Transformação”

Rafael citou países como EUA que passaram por um momento de desindustrialização, com o outsourcing em países subdesenvolvidos. Diferente do caminho trilhado pelo Brasil que detém o know-how de toda a cadeia têxtil e que com as novas tecnologias temos grande potencial orientado à industria 4.0.

Entre diversos movimentos do futuro da moda como: rastreamento do produto com marcadores dentro das fibras têxteis, certificações mais rigorosas, blockchain, inteligência artificial, num mundo em que o consumidor exige entregas cada vez mais customizadas e rápidas, a produção precisa ficar cada vez mais próxima fisicamente, isso pode ser nosso diferencial.

A transparência é um valor dos novos tempos, por motivos morais ou por demanda das inovações tecnológicas, deverá ser cada vez mais almejada não só na moda. Carry ressalta “As marcas envolvidas tem o potencial de melhorar a vida de pessoas do mundo inteiro e a transparência é um passo dessa jornada.”

A iniciativa é tão poderosa que tem grande potencial para extrapolar o mundo da moda e servir de inspiração para que outros setores do mercado, avaliem sua jornada produtiva sob a luz da transparência. Aliás, não podia ser diferente, a moda é especialista em lançar tendências não é mesmo!?

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Larissa Henrici
fashionistadobem

Sem pretensões. Com mais ideias soltas que lições. Caçadora de cores e palavras, fiz um mochilão de volta ao mundo e não sei bem escrever sobre isso.