Por que alguns homens “feministas” não falam sobre as questões das mulheres?

Você tem vontade de falar sobre homens cada vez que alguém começa a falar de igualdade para as mulheres? Aqui está um novo teste pra determinar se você é realmente feminista.

Marília Moschkovich
Feminismo e Gênero: modos de usar
3 min readJan 16, 2014

--

por Emer O’Toole
tradução livre; original aqui, em inglês

Primeira anedota: Ano passado, eu dei uma palestra sobre pelos e sexismo no festival Women of The World. Um amigo feminista assistiu, e me mansou uma mensagem de texto dizendo que os homens são pressionados de maneira similar quando se trata do corpo, apenas com algumas diferenças. Respondi que 9 entre 10 distúrbios alimentares acontecem entre mulheres, 95% das cirurgias plásticas estéticas são feitas em mulheres, e que eu não tinha ainda conhecido nenhum homem que se envergonhasse de pernas peludas. Mesmo assim, ele insistiu que, se eu tivesse falado sobre os homens em minha palestra, teria conseguido mais aliados.

Segunda anedota: Eu estava discutindo assédio nas ruas, com um amigo feminista. Ele disse que os homens têm mais probabilidade de sofrer violência nas ruas do que as mulheres. Eu concordei de verdade, e depois continuei falando sobre assédio. Já aprendi que, se espero que os homens sejam aliados do feminismo, não posso falar de assobios e passadas de mão enquanto os homens correm o risco de levar chutes na boca.

Terceira anedota: Num bar, um grupo de amigos estava discutindo os obstáculos que uma menina nascida hoje poderia ter durante sua vida. Um amigo feminista disse que na firma de advocacia onde trabalha as mulheres com três filhos estão se tornando sócias, e que em 20 anos — ele garantia — o “teto de vidro” não vai mais existir; o problema real, segundo ele, é que os homens que estudam direito estão abandonando suas faculdades. No dia seguinte, ele me enviou um email dizendo que se identifica como feminista, e que o feminismo deve ser mais do que “sexismo reverso”, que as questões masculinas precisam ser levadas em consideração. Ele incluiu um link da Wikipedia sobre homens no feminismo.

Esses não são incidentes isolados e, que conste, eu respeito todos esses homens: eles são pessoas inteligentes e bacanas. Mas não os quero como aliados, mais do que quero passar a me chamar de “generista” porque o Joss Whedon acha que “feminista” soa mal. A questão pra mim é a seguinte: por que esses homens se descreverm como feministas, se eles são incapazes de falar sobre as questões das mulheres sem bradar “E OS HOMENS?” [iuzômi], ou sem insistir que um movimento pelos direitos das mulheres comprometa seus objetivos para que os homens fiquem mais à vontade?

Bem, eu tenho uma teoria. Em algum momento, alguém inventou um teste espertinho e bem expressivo sobre o feminismo, que pode ser ilustrado da seguinte maneira:

É inteligente, certo? Não sei quem usou isso primeiro, mas é esse o tom da Caitlin Moram em “Como Ser Uma Mulher”, e o “Guia do Homem para o Feminismo”, de Michael Kaufman e Michael Kimmel, tem uma passagem perguntando ao leitor se ele “pegou” algum feminismo, o que é uma variação disso.

O teste é divertido, direto, inclusivo: faz com que as pessoas entrem no feminismo, e leva mais homens a se identificarem como feministas. Aliados — EBA!

Só que o teste também é um pouco mentiroso. É preciso acreditar em outras coisas importantes para ser feminista, o que pode ser ilustrado mais ou menos assim:

Opa! Se surpreendeu ao receber um resultado negativo (“Não é feminista”) sendo que se autointitula feminista há anos? Está se prendendo na semântica, dizendo que “depende do que você quer dizer com igualdade”, em vez de responder as questões da maneira direta como estão colocadas? Se sente excluído de um movimento por igualdade que você sente que também deveria ser seu, de alguma maneira? Talvez esteja um pouco nervoso de ter sido excluído? Quem sabe esteja pensando: “Então tá bom! Se é assim que querem definir o feminismo, tudo bem! Mas estou avisando: estão me perdendo como aliado!”.

Originally published at mariliamoscou.com.br on January 16, 2014.

--

--

Marília Moschkovich
Feminismo e Gênero: modos de usar

socióloga-antropóloga, escritora-poeta, feminista-comunista, antirracista, não-mono/relações livres