Império decadente

Apesar da boa embalagem, o conteúdo não tem sabor, nem parece fazer falta — o “novelão” está com seus dias contados

Bruno Viterbo
Ficção brasileira

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Uma missão difícil para um horário que já foi palco de clássicos da TV brasileira. Elevar os índices cada vez decadentes da faixa. É nesse cenário que Império estreou hoje (21/7), a nova novela das 21h.

É chover no molhado dizer que a novela chega para estancar a queda de audiência vinda depois de Avenida Brasil. Esta, terminou com média geral de 39 pontos. Em Família baixou para 30, índice até então “padrão” para novelas das 19h. Para concluir a missão com sucesso, o autor Aguinaldo Silva aposta na volta do “novelão”. Dramalhão. Disputas familiares. Ciúme. Intriga. Maldades gratuitas. Amores proibidos. Será que ainda funciona?

O autor é um dos mais experientes. Suas novelas, geralmente, são sucesso — a despeito da crítica, que pega no pé de Aguinaldo por seus ácidos comentários e declarações. No entanto, suas polêmicas se revertem em bons resultados. O último grandioso sucesso do horário é Senhora do Destino (2004, outros tempos; da inesquecível Nazaré Tedesco), além de Fina Estampa (2011, com os mesmos 39 pontos de Avenida Brasil; de Pereirão e Crô).

Em Império, o autor tenta sacudir o telespectador. Munição: duas vilãs (Cora/Marjorie Estiano-Drica Moraes e Maria Marta/Adriana Birolli-Lilia Cabral), um protagonista de caráter duvidoso (João Alfredo/Chay Suede-Alexandre Nero) e uma mocinha batalhadora (Cristina/Leandra Leal).

Marjorie Estiano dá vida e cores a uma amargurada Cora. Incrível a evolução da atriz. É o único destaque da novela, já que Vanessa Giácomo e Chay Suede não comprometeram e o trio dominou as ações. Alexandre Nero apareceu apenas nos primeiros minutos, como um prólogo, retornando ao local onde começou a enriquecer.

Aliás, as primeiras cenas batem na tecla que virou clichê em qualquer estréia de novela da Globo: imagens aéreas deslumbrantes apenas para impressionar — geralmente a avó. É maçante, ainda mais acompanhada de uma trilha sonora feita igualmente para “impressionar”. Um porre. O gancho final, pelo menos, não envolveu um casal e sim uma participação especial de Regina Duarte.

Império tem uma embalagem bonita, é verdade, e permanecerá assim (como visto nas chamadas; não é apenas por ser a primeira fase). Com exceção das cenas aéreas, há qualidade. Mas não há uma marca, uma identidade, como em Avenida Brasil ou mesmo Amor à Vida. O roteiro, bem… O roteiro é um novelão, mesmo. Repleto de clichês do gênero. De nada adianta uma embalagem bonita, se o conteúdo deixa a desejar. Salva-se a trilha sonora, que conta com Beatles e Ennio Morricone. A abertura, batidíssima (tirando a trilha dos Beatles), com imagens de pedras preciosas, em nada remete as criativas aberturas de novelas do mesmo autor.

O cenário é outro, e as novelas tem que se reinventar. A Rede Globo — assim como a Record — não tem cativado o telespectador nos últimos anos, já que todas as novelas carecem de histórias que prendam a atenção. Império, por este primeiro capítulo, não fisgou. Por outro lado, fugiu do clichê de apresentar todos os personagens logo de cara, focando no trio Eliane/Cora/José Alfredo.

Vista como vilã das TVs, a internet tem o apoio do autor. Aguinaldo Silva já disse que a rede é uma grande aliada, assim como as redes sociais. “Novela precisa de fofoca”, disse Aguinaldo. E é nas redes sociais que ela acontece. O problema é fisgar esse público que comenta sobre TV — geralmente mais jovem — com um produto/gênero cada vez mais obsoleto, ora por culpa das redes, ora por culpa dos autores. O buzz gerado por Império se deu em grande parte por Chay Suede, recém saído da Record.

Ainda falta a verdadeira interação. De nada adianta divulgar tudo — absolutamente tudo — o que vai acontecer no capítulo nos sites das novelas. Império contava com um resumo detalhado do que iria acontecer na estréia. E a expectativa? E o mistério do primeiro capítulo?

São problemas que afundam cada vez mais o gênero, que tem lampejos ou suspiros (Avenida Brasil, Cheias de Charme) de interação e repercussão ou alta qualidade técnica e artística (O Rebu).

Império é novelão, mesmo. Pena que nada condizente com o atual momento da indústria audiovisual do Brasil e do mundo.

O novelão está com seus dias contados e caminha a passos largos para o fim. Ainda bem.

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Bruno Viterbo
Ficção brasileira

Redator, às vezes fotógrafo (como na foto ao lado) e às vezes jornalista. Mas sempre encontrando tempo para assistir alguma coisa (boa) na TV.