Plataformas — Automação de Ordens

Bruno Oliveira
Educação, Finanças & Tecnologia
9 min readNov 10, 2019

Este artigo faz parte de uma série de artigos que eu estou tentando montar sobre plataformas de negociação utilizadas para negociação na bolsa de valores. Veja o artigo introdutório sobre DMAs aqui.

As linhas de código já substituem os corretores gritando nos salões das bolsas de valores

Uma das principais vantagens de se utilizar plataformas de negociação eletrônica é a possibilidade do investidor automatizar o envio de ordens. Ao invés de ficar em frente a um computador durante todo o tempo do pregão, o investidor pode definir uma estratégia de investimento e utilizar algum algoritmo de negociação (algotrading) para implementá-la em sua plataforma de negociação (se essa permitir o uso de algoritmos).

Estratégia: é o que você planeja executar no mercado, as diretrizes de como você vai operar para chegar a um objetivo específico. Óbvio que todo mundo tem como estratégia primordial “comprar na baixa” e “vender na alta”, mas a forma que cada um vai fazer isso compõe a estratégia de investimento (vamos falar de algumas depois)

Algoritmo: é como se fosse uma receita de bolo — a partir do momento que você possui uma estratégia, você precisa definir o passo a passo de como aplicá-la no mercado. Os algoritmos define o passo a passo do que deve ser feito para se atingir o objetivo da estratégia.

Quando as plataformas de negociação vendem os robôs investidores, no fundo eles estão te vendendo uma estratégia específica e um algoritmo determinado de como ele vai colocar isso na prática. A negociação por algoritmos seria então um conjunto de decisões de compra e venda de ativos em algoritmos computacionais projetados, e as vezes programados, por operadores de mercados (traders).

As estratégias e algoritmos do mercado

O mercado é imprevisível, em um momento está em alta, e no outro está lá embaixo. Os fatores psicológicos são fundamentais para a tomada de decisão dos investidores, ainda que tenha uma estratégia muita clara e bem definida, o passar dos tempos e as variações da bolsa provoca uma série de emoções aos investidores. O trading por algoritmos segue uma estratégia rigorosa, exclusivamente fundamentada na análise técnica dos mercados, e não sofre de nenhum estresse ou emoção passível de favorecer erros de avaliação.

Ciclo de pensamento de um investidor acompanhando seus investimentos — o fator psicológico é fundamental

Uma das estratégias da moda é o long short. Basicamente esta estratégia consiste em operar comprado em um ativo (Long) e operar vendido em outro ativo (Short). Nessa estratégia, não importa se o mercado está bom (bullish) — cenário de alta, ou ruim (bearish) — cenário de baixa, o que importa para o lucro é que o ativo em Long tenha uma variação (mesmo que negativa) melhor que o ativo que está em Short. Esse tipo de operação normalmente exige sangue muito frio, pois quase sempre envolve cenário de queda em uma ou duas das ações (o que não necessariamente gera prejuízo no final, se bem executada).

Existem diversas estratégias que podem ser executadas na negociação na bolsa e quase todas elas estão acessíveis para qualquer investidor (vide AQUI, AQUI, AQUI e AQUI).

Se no grande varejo, os algoritmos tem começado a crescer cada vez mais, no mercado institucional ele já está presenta há algum tempo, com estratégias já mais definidas (e que já vem sendo adotado pelo varejo também), como por exemplo:

  • Portfolio Trading ou Program Trading, estratégias que operam uma multiplicidade de ativos para ajuste ou balanceamento de carteiras buscando manter conformidade com um índice ou linha de investimentos;
  • High Frequency Trading, que busca aproveitar discrepâncias momentâneas de preços, mantendo posição neutra quanto aos ativos; e
  • Execution Trading, destinado à execução de grandes volumes, minimizando o impacto no mercado e os custos de transação, sendo usualmente operado nas modalidades:
  • TWAP — Time Weighted Agerage Price (preço médio ponderado no tempo), VWAP — Volume Weighted Average Price (preço médio ponderado por volume), POV — Percentage of Volume (percentual do volume disponível), IS — Implementation Shortfall (diferença entre o preço escolhido e o de execução) e SOR — Smart Order Routing (roteamento inteligente de ordens, buscando liquidez nos mercados)

Qual o nível de conhecimento necessário para operar robôs de investimentos?

É sempre bom ter grandes conhecimentos de investimentos para poder escolher a melhor estratégia para seus investimentos. Em relação aos algoritmos, há diversas lojas de robôs de negociação no mercado e diversos programadores freelancers que pode prestar um serviço para desenvolvimento do algoritmo que melhor atenda suas necessidades. Algumas plataformas de negociação acabam trazendo algumas estratégias pré-definidas para operar. Por isso, é importante entender como funciona o algoritmo, mas é mais fundamental entender muito bem a estratégia que será utilizado e o risco que se está exposto.

Quanto aos algoritmos, há dois grandes tipos no mercado

black-box: são os algoritmos em que o investidor final não sabe muitos detalhes de sua implementação (o código não é aberto), conhece apenas a estratégia que está sendo utilizada — parte deles permitem que o investidor configure alguns parâmetros (ex: o ativo que será operado, quantidade máxima, grau de risco que está disposto a correr, etc). É o modelo de algoritmos usados em plataformas como Smarttbot e Robotrader.

white-box: são os algoritmos abertos e que o investidor pode fazer alterações em sua estrutura diretamente no código. O investidor pode modificar um código ou até criar códigos absolutamente do zero. É o modelo de algoritmos usados em plataformas como MetaTrader e ProTrader.

A maioria das plataformas de negociação disponibiliza aos investidores o ambiente de backtesting. Este ambiente refere-se ao teste de uma estratégia de investimento utilizando dados passados do mercado, e seu objetivo é estimar como essa estratégia teria se comportado em um determinado período do passado.

Exemplo de tela da plataforma de negociação Smarttbot — algoritmo blackbox onde o investidor tem a possibilidade de definir alguns parâmetros da estratégia (nesse caso análise técnica com indicadores de médias móveis)

Os algoritmos de negociação, de forma geral, segue algumas etapas básicas: (i) primeiro, precisa ter acesso aos dados do mercado — quanto melhor for o acesso (latência e integridade do dado) melhor a tomada de decisão; (ii) o algoritmo faz uma análise pré-negociação, baseado em heurísticas e outras configurações pré-estabelecidas sobre como deve agir com as informações disponíveis; (iii) boa parte dos algoritmos podem receber signals (sinais de negociação) de outras fontes, com indicações e outras orientações sobre como operar em determinado momento do mercado; (iv) assim que verificou a oportunidade de um bom negócio, o algoritmo executa a ordem; e (v) análise o resultado obtido pós-negociação; e volta-se o ciclo novamente.

Estágios genéricos de um algoritmo de negociação

Estudo de caso — Planejando um algoritmo de negociação

Este estudo de caso foi retirado do trabalho da Camila Shimabukuro, como trabalho de pós-graduação e pesquisa, chamado O desenvolvimento de uma estratégia automatizada de negociação de ações, vale a pena dar uma lida no artigo completo. O algoritmo de negociação da Camila foi planejado na estrutura da imagem abaixo:

Principais módulos do algoritmo deste estudo de caso

Quando falamos de dados do mercado (o primeiro módulo), falamos de três figuras principais: o livro de ofertas, a lista de negócios realizados e a cotação dos preços de ativos.

O livro de ofertas é o registro na bolsa de todas as ofertas de compra e venda, de determinado ativo ou contrato, em aberto.

Exemplo fictício de informações do livro de ofertas para um ativo fictício AAAA3

Além do livro de ofertas, cada ativo tem uma lista de todos os negócios que já foram executados.

Exemplo fictício de todos os negócios realizados para o ativo AAAA3

Os dados de cotação do preço dos ativos é disponibilizado pela B3 a partir da contratação do serviço de MarketData (UMDF — Unified Market Data Feeders), que disponibiliza informações em baixa latência de todos os ativos de mercado para as corretoras e fornecedores das plataformas de negociação.

Exemplo quantitativo dos dados que percorrem uma estrutura de UMDF (em um dia)

As fases de pré-negociação, sinais e pós-negociação envolve todo o processo de tomada de decisão do algoritmo. Neste estudo de caso, o objetivo do algoritmo era buscar os dados do ativo na outra bolsa (NYSE) na ponta contrária e do dólar futuro, converte o preço da ADR para reais, e identificar se há uma diferença positiva que possa gerar um lucro pré-determinado ao comprar (ou vender) a ação com preço menor (ou maior) numa bolsa e vender (ou comprar) a ação com preço maior (ou menor) na outra bolsa, considerando-se os custos de execução. Uma estratégia de arbitragem (o autor cita a utilização de estratégias combinadas de Index Arbitrage, Delta Hedge e Market Making).

As ordens são colocadas como iscas aguardando serem agredidas ou cruzadas contra ordens de um investidor na ponta contrária. Os preços e quantidades são dinamicamente alterados em função das mudanças nos mercados. Se uma ordem for coberta por competidores, o algoritmo deve cobrir o preço do concorrente até o limite de lucratividade. Caso o concorrente retire sua oferta, o algoritmo restabelecerá o preço para o cobrir a melhor oferta disponível.

Este tipo de estratégia, de acordo com a implementação, pode gerar problemas para o mercado, como o spoofing — mas isso é tema de outro post. O interessante, é que o algoritmo é capaz de tomar decisões complexas, em mais de um mercado, em curto espaço de tempo (já que são ativos altamente voláteis).

Quais são os benefícios para o investidor?

Automatizar seu investimento com robôs é a solução para muitas das suas dores como trader. Além de seguro e preciso, um robô investidor traz vantagens como:

  • desconsidera o fator emocional que prejudica qualquer investidor. Ver as oscilações de preços, acompanhar as instabilidades e até seu humor podem afetar uma decisão consciente que vai contra uma boa estratégia pelo medo de perder dinheiro ou a suposição de que os valores mudarão repentinamente;
  • as operações, sejam as entradas ou saídas, são executadas de forma bem mais rápida do que se fossem feitas manualmente pelo investidor. Um robô leva alguns milissegundos para fazer isso, sendo capaz inclusive de enviar, alterar e cancelar várias ordens em um mesmo segundo e agir rapidamente quando os cenários pré-estabelecidos se apresentam no mercado. Essa velocidade faz toda a diferença para o trader não perder seus preços-alvo;
  • tranquilidade para investir sem perder boas oportunidades. Isso significa que o trader não precisa ficar 100% do tempo acompanhando o pregão na frente de um computador e não corre o risco de perder boas oportunidades de compras e vendas apenas por ter ido fazer qualquer outra coisa;
  • redução de erros na hora de fazer as operações, seja por ler um valor de uma forma, problemas no computador, errar a quantidade nas ordens, em uma interpretação e afins. Esse tipo de falha humana comum não acontece com robôs;
  • teste do robô, que permite simular no passado (backtesting) e em tempo real (paper trading), provendo mais segurança ao trader com relação à estratégia. É possível colocar um robô para operar com gráficos passados ou simulando com dinheiro virtual no presente para avaliar seu desempenho. Dessa forma, o robô é testado, bem como a estratégia também é validada ao ser aplicada para determinado papel;
  • disciplina e consistência do investidor, porque automatizando os trades ele programa para, independentemente de seus compromissos e acesso à internet, realizar as compras e vendas de ações, opções ou contratos seguindo exatamente as regras pré-determinadas;
  • diversificação dos trades, que permite que os traders que usam robôs investidores possam operar com estratégias diferentes e em papéis diferentes simultaneamente, montando inclusive portfólios de estratégias. Também é possível validar um mesmo robô para diferentes papeis e até usar mais de um robô para o mesmo papel.
Um vídeo bem didático sobre o mercado de robôs trader

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Bruno Oliveira
Educação, Finanças & Tecnologia

Auditor, escritor, leitor e flanador. Mestrando em TI, tropecei na bolsa de valores. Acredito nas estrelas, não nos astros. Resenho pessoas e o tempo presente.