IoT nos portos

Mantenha seus amigos próximos e suas máquinas monitoradas

Nicolas Rodriguez
Flux IT Thoughts

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O problema

As oportunidades estão aí

As palestras do gerente da Flux IT Ports com diferentes clientes e agentes da indústria portuária, sobre casos raros e dores que revelaram em seu trabalho, desvelaram algumas situações que foram detectadas como oportunidades — entre elas, a necessidade de ter a localização de uma máquina dentro de um terminal em tempo real e informações relacionadas, para aumentar o controle sobre este maquinário. Aprofundando-nos em entrevistas, descobrimos que deveríamos acrescentar informação sobre os operadores a esta última.

Com este cenário em mente, uma equipe interdisciplinar da Flux IT dedicada à IoT, formada por arquitetos de soluções, desenvolvedores de software, analistas de UX, designers e desenvolvedores de IU, designers industriais e engenheiros de computação, reuniu-se para responder a esse problema.

Então, por que IoT?

Em seu artigo Why the Internet of Things is the real deal , Waweru Mwaura explica que, para considerar que estamos usando IoT em um sistema, ele deve ter uma rede de dispositivos que usam sistemas integrados conectados entre si, deve compartilhar dados através da rede e fazer uso de hardware que rode software que permita ao dispositivo estar “apto para IoT”.

A ideia desta tecnologia é a multiplicação de inteligência em dispositivos fora de computadores, laptops e smartphones e aplicá-la a outros “não inteligentes”. A IoT converte esses dispositivos em smart, adicionando a capacidade de se conectar à rede, comunicar e compartilhar dados.

Existem muitos benefícios que, à primeira vista, podem ser úteis e interessantes para aplicar IoT em um terminal portuário, adicionando sensores e dispositivos aos três tipos de máquinas que desejamos controlar: RTGs, Reach Stakers e empilhadeiras. Estamos falando de controlar dispositivos à distância, interconectados entre si, e que essa interconexão permita que tomem decisões por si mesmos. Assim, poderíamos, por exemplo, monitorar a atividade de uma frota ou de um determinado veículo em tempo real, melhorar o controle e a gestão dos mesmos.

As visitas de campo em um estágio inicial são essenciais

A conectividade em si não é nada; a solução holística é tudo.

Para entender o entusiasmo do gestor portuário ao apresentar-nos o problema do cenário, primeiro devemos ter em mente que a IoT não cria valor para nenhum negócio apenas por meio da conexão, mas que é necessário o processamento dessas informações compiladas.

O artigo “Internet de la cosas” da Deloitte é muito útil para compreender que o valor para o negócio é criado quando as informações são usadas para modificar ações futuras de maneira benéfica. De maneira ideal, esta ação modificada gera e fornece acesso a novas informações, permitindo que o processo de aprendizado continue. As informações, portanto, não criam valor de maneira linear (como um processo passo a passo), mas se torna um processo sem fim. Nesta tabela, eles descrevem os estágios que geram esse loop:

Três desafios e obstáculos

1. Marco operacional

Em uma das visitas da equipe da Flux IT a um terminal portuário, tivemos a oportunidade de ouvir os gerentes desse e de outros terminais na América Latina (Argentina, Honduras e Colômbia). O objetivo era ouvir seus relatos, compará-los com as informações que tínhamos e obter novos dados.

Falando sobre a situação e a possibilidade de intervir no maquinário, encontramos comentários como este em relação à porcentagem de máquinas que falham, mesmo se são consideradas do melhor provedor que existe:

“Se eu adicionar um dispositivo que possa bloquear a ignição do veículo, vai ocorrer uma falha para 1 de cada 10 operários — e não é um custo que estou disposto a pagar”.

A partir dessa análise, começamos a fazer algumas perguntas-chave: Até que ponto o produto que fabricamos não deve ser modificado? Essas restrições se aplicam a todos os terminais? Se não fosse um agente bloqueante, mesmo assim deveria gerar alertas? Esses alertas devem ser monitorados em tempo real?

2. Marco ético e sindicatos

As organizações sindicais são extremamente atuantes nesse setor e evitam fornecer informações dos operadores. Em um dos casos, um gerente disse que demorou muito tempo para que seu terminal (mais de um ano, já estando em operação) instalasse catracas para acesso ao local de trabalho.

Um dos pontos fortes da proposta foi o acesso às máquinas por meio de dispositivos biométricos. No caso da autorização inicial, os Reach Stackers e as empilhadeiras poderiam conter um leitor de impressões digitais que permita ou não sua ignição. Considerando essa possibilidade, encontramos observações como:

- Eles apareceão com sacos cheios de dedos.
- Risos
- Não estou brincando.

3. Conexão

Outro grande obstáculo com o qual tivemos que lidar foi a conectividade dentro dos terminais. Por uma questão de organização e acessibilidade, os contêiners são empilhados (em colunas com mais de 5), formando corredores (“blind spots”), que não permitem a passagem de sinal. A conexão GPS ou LTE (as alternativas originalmente propostas) não oferecem a segurança necessária para detectá-los em todos os momentos, pois nesses blind spots as antenas ou satélites não atingiriam o dispositivo.

Consideramos, portanto, a possibilidade de alternativas como o GPS diferencial ou obter a posição por meio de gateways internos do terminal para realizar a triangulação desses locais.

Nesse caso, a proposta pode ser vista de duas perspectivas que devem ser analisadas em conjunto para avaliar seu ROI:

  • Quanto custa ao porto não contar com a tecnologia IoT para melhorar esta situação?
  • Caso adotar esse ecossistema seja implementado (dispositivo e software), qual é o custo de adicionar mais uma engrenagem na cadeia do sistema portuário atual?

Em suma, as placas e sensores são baratos, mas a IoT não é.

Com toda essa informação, chegamos a uma definição do problema:

Os terminais portuários precisam obter dados com base na ação dos operadores e do estado das máquinas, pois isso lhes dá mais controle e eficiência no trabalho para se tomar decisões sobre seus processos. No entanto, não existem terminais iguais: cada um é regido por regras estabelecidas de forma autônoma, o que torna impossível contar com uma solução global.

Nenhum dos fornecedores de máquinas portuárias oferece soluções para esse problema? Sim, em parte. Aí está a ideia fundamental de TODA a questão, com base nas quais podem ser geradas soluções eficientes e eficazes. Atualmente, esses fornecedores oferecem um pacote de máquinas, hardware e software bem fechado e extremamente caros para serem personalizados, o que cobre parcialmente as necessidades de cada terminal. Com um custo menor, podemos criar soluções personalizadas e flexíveis que respondem a 100% das dores específicas de um terminal.

A solução

Mais vale um café com especialistas do que 100 reuniões com stakeholders

Neste ponto, contávamos com a visão do gestor do porto, uma ideia geral da equipe sobre como fazer avançar o projeto, benchmarking de produtos e sistemas nacionais e internacionais, e os comentários dos stakeholders. Mas ainda faltava a visão que mais importa: a palavra daqueles que estão lá, onde as coisas acontecem.

Tudo bem, não foi um café, mas conversas por Skype e áudio de WhatsApp com Manuel Álvarez, que estava na Malásia trabalhando em um tipo de terminal 1 (classificação de terminais APM , neste caso, apenas transbordos, os maiores do mundo), com atracadouro de 6 km, indo pouco depois para a Holanda, para realizar a estrutura global em outro. Atualmente, é material manager em uma empresa de geração de energia norte-americana, mas na Argentina passou por todas as funções em vários terminais-chave deste projeto: operador de guindaste portuário, yard planner e shift manager. Ele entende do assunto.

Por que, nesses casos, eu considero necessário entrar em contato com um especialista que não faz parte do cliente atual? Que tipo de insights alguém de fora do projeto pode dar a você?

Primeiro, como dissemos, a realidade dos terminais é diferente em cada parte do mundo: eu precisava saber quais são as particularidades das empresas latino-americanas e, mais precisamente, das argentinas. Por outro lado, o pragmatismo da visão do uso dos produtos e sistemas que devemos redesenhar não iria obter de nenhum outro que não fosse quem os utiliza. Por último, se a pessoa não está envolvida no projeto, não precisa tomar certos cuidados e poderá revelar alguns “segredinhos” (para nós, insights).

Com base nessas conversas, recebi comentários como este (citação textual):

“Olha, tem tudo a ver com os custos. Se o seu terminal não puder ter a visibilidade dessa movimentação, você terá um desvio do custo final em seu fechamento anual. Quando um cliente está à busca de um contêiner, esse custo é deduzido do pagamento feito à empresa. Mas se um Reach Stacker se move e esse custo não é pago pelo cliente, temos uma perda muito importante. É por isso que é essencial ter a visibilidade total de todos os movimentos dentro do terminal e, assim, elevar os lucros da empresa, minimizar os desvios e, com o tempo, chegar ao déficit 0”.

Ter todas essas informações não apenas me serviu como designer, mas também imbuiu a equipe com a realidade para a qual iríamos trabalhar. Fazer um download claro e uma transferência do conteúdo acionável não é “um plus interessante”, mas parte essencial do trabalho como designer de experiências.

Ao brincar aprendemos, criamos empatia e projetamos

A coisa mais importante ao escolher uma técnica é ser claro sobre o que você realmente quer ou precisa saber. Nosso objetivo era entender como os operadores interagiam com os novos dispositivos, qual seria um design apropriado, como os entenderiam, que tipo de feedback precisavam e quanto poderiam interferir nas atividades diárias com o maquinário do porto.

Juntamente com o designer industrial da equipe, fomos trabalhar lado a lado para esclarecer nossas dúvidas, usando a técnica do Role Playing.

O Role Playing é uma técnica por meio da qual podemos simular uma situação que ocorre na vida real. Ao praticá-lo, adota-se o papel de um personagem real submerso em um contexto específico e enfrenta-se situações cotidianas. O objetivo nos identificar com os usuários, entender os “porquês” de seus modos de agir e as decisões que cada um dos personagens tomaria em diferentes situações, para descobrir pressupostos errados ou soluções não imaginadas.

Colocar-se no lugar do usuário facilita a descoberta de uma visão de mundo muitas vezes bem diferente da vista por trás do teclado. Por exemplo: se você for projetar para pacientes em um hospital, deite-se na cama e veja como tudo parece diferente quando a única paisagem é o teto e as pessoas são vistas de baixo para cima.

No artigo “El role-playing, una técnica para facilitar la empatía y la perspectiva social” de Xus Martín García (professor titular da Faculdade de Pedagogia da Universidade de Barcelona), oferece uma descrição detalhada desta metodologia dividida em quatro fases: motivação, preparação da dramatização, dramatização e debate.

O protótipo e o teste o dispositivo de feedback para o operador resultou em uma excelente oportunidade para perguntas

A base do entendimento: cenários

Identificamos quatro cenários principais nos quais podemos apoiar-nos para realizar a atividade, entender o escopo final, explorar os recursos da IoT e saber o que nosso cliente em potencial deve ver:

  • O caminho feliz no qual o operador se identifica para, em seguida, acionar o veículo.
  • Um no qual o operador liga o veículo sem se identificar, recebe a notificação mais tarde e se identifica.
  • Outro em que o operador se identifica e aciona o veículo, mas logo toma uma decisão errada (de acordo com as normas da empresa).
  • A sequência final na qual o operador se identifica, aciona o veículo e recebe uma notificação externa.

Luzes, LED e alto-falante

Com base na dramatização desses cenários, conseguimos colocar-nos no lugar dos operadores portuários, obter dados e chegar a conclusões valiosíssimas como:

  • O tamanho que deveria ocupar a interface do dispositivo e a forma com que teria que contar para ser visível e acionável, como um elemento a mais no painel que não interfira nos demais.
  • Que deveria ter uma pequena tela para comunicar o feedback sobre as decisões erradas tomadas pelo operador.
  • Que o feedback se dividia em: sinais luminosos, texto em uma tela e som através de pequenos alto-falantes.
  • Que o som do alto-falante deveria ter um tom agudo. Embora o uso de protetores auriculares seja proibido, o som do maquinário (motores e componentes hidráulicos) pode interferir na recepção do feedback.
  • As luzes devem ser 3: uma para comunicar acertos, uma para erros e uma terceira para notificações externas.
  • Alguém deveria monitorar todos esses alertas em tempo real e gerar um registro.

Personalização: work instructions, uma função nova e horas extras

Tive a oportunidade de ouvir Claudio Dobniewuski (manager de IoT do Grupo Datco) no evento IoT Day, na Capital Federal, e trocar algumas palavras após sua apresentação. Ambos concordamos que a chave está na personalização, pois isso reduzirá os custos do cliente.

No nosso caso, confiamos nos cenários e nas regras de negócios para definir usos corretos e usos incorretos. Um exemplo deste último seria a operação de um operador sem ter-se logado a máquina previamente.

Mas qual era o valor dessas definições?

  • Work Instructions

No dia a dia de terminais portuários, há uma série de ações que são planejadas (com horário, itinerário, veículo etc.) e são atribuídas a operadores para execução, denominadas work instructions (instruções de trabalho). Para resumir, por meio delas são ordenados os movimentos dos contêiners de exportação e de importação no porto.

Apresentando os conceitos de tipos de uso para essas ações, podíamos destacar informações importantes e tornar os processos internos do porto mais eficientes: encurtando as distâncias de traslado (economia de combustível e desgaste dos pneus e motores), evitando problemas (se houver uma área pela qual não se deve passar, negá-la e que o dispositivo dê feedback ao operador caso tenha feito o trajeto errado), monitorar os horários de maior movimento no terminal etc.

Em uma das várias reuniões e entrevistas com agentes portuários, sua opinião foi:

“Isso pode ser-nos útil para a alocação de recursos. Ao planejar quais recursos serão destinados aos turnos da manhã, tarde e da noite, você poderá saber quais equipes vai alocar e designar um caminhão a cada operador de forma automatizada. Se você designou o 18, e ele subiu no 15, bloqueie-o.”

  • Monitoramento em tempo real

Entendemos que todas essas informações tinham valor tanto em um relatório e em tempo real. Alguém deveria avaliar o que está acontecendo no porto durante a execução das work instructions. Chamamos este papel de “Usuário Controlador” e parte da proposta foi projetada para ele.

  • O benefício e a chave para os sindicatos

Parte da proposta oferecida consistia em cruzar dados do maquinário com dados e informações dos operadores. Este foi um obstáculo a ser superado, pois havia um risco de que a unidade dos trabalhadores se sentisse auditada. No entanto, tendo um perfil por operador, com quantidade de horas trabalhadas, máquinas designadas, previsão de turnos e habilidades, as observações por parte dos gestores e demais agentes desses terminais foram:

“No final do mês, chegam as estatísticas das horas trabalhadas para o controlador da equipe e surgem coisas do tipo: Por que você tem 40 horas trabalhadas e ele 20? Com essa solução que apresentam, podemos gerar informações úteis, ainda mais quando você paga horas extras. Eles precisam ter essa visão completa da equipe.”

Cada porto poderia adaptar as regras do negócio às suas necessidades. A personalização já era uma parte intrínseca do projeto. Nós tínhamos o diferencial nas mãos.

Nas demonstrações, mostramos como o sistema funciona em tempo real, com a placa montada em um caminhão movendo-se pelas dependências para obter dados. (by the way: obrigado ao sobrinho do arquiteto de soluções!)

Ferros e telas

O trabalho realizado incluiu a criação (a partir do zero) de um ecossistema de soluções composto pelos seguintes elementos:

  • Um protótipo do dispositivo microcontrolador, que permite coletar todas as informações e trabalhar com os parâmetros do negócio (que intervém no painel elétrico da máquina).
  • Outro protótipo de acesso biométrico, que também ofereça feedback de suas ações ao operador (instalado no painel das máquinas). Para não conflitar com as realidades dos portos e dos órgãos sindicais, oferece uma alternativa com um leitor de RFID e chaves.
  • Um terceiro protótipo de um dashboard que oferece todas as informações de valor para o cliente, processadas.
A interação com os protótipos foi constante. Fizemos iterações 8 vezes ao dashboard do usuário do controlador!

Amostragem e contagem

Como equipe, precisávamos ficar na mesma página, passo a passo. As técnicas que escolhemos para conseguir isso foram desenvolver um Service Blueprint e nos apoiamos nos cenários de uso do operador com narração (storytelling). Deter-nos e aprofundar-nos no que estas técnicas consistem seria muito denso e a nota já se estenderia muito, mas a agência argentina WOW de Customer Experience nos dá uma definição muito precisa:

Basicamente, um Service Blueprint é um mapa de pontos de contato, que descreve como suas qualidades tangíveis e intangíveis afetam o modo como as pessoas se sentem e quanto valor recebem. Como ferramenta operacional, permite visualizar os componentes de um serviço com detalhes suficientes para analisá-lo, implementá-lo e mantê-lo.*

Tivemos a sorte que, no decorrer da terceira “sprint” do projeto, um consultor sênior em operações de terminais portuários juntou-se à Flux IT Ports (mais vale um café com especialista …). Juntamente com ele e com a PO do projeto, conseguimos aproveitar ao máximo essa ferramenta em cada demonstração e validação.

Articulamos os pontos de contato entre:

  • Movimentos no porto
  • Operador (seu dia inteiro no terminal)
  • Usuário controlador (seu dia completo no terminal)
  • Dispositivo de feedback no painel do operador
  • Dispositivo IoT
  • Painel de controle para o usuário controlador

Validação: a última palavra

Com todo o processo e protótipos fechados, nos reunimos com o principal fornecedor de soluções de movimentação de carga e serviços para portos, terminais, centros de distribuição e indústria pesada em todo o mundo.

A proposta era a intervenção de maquinário pelo pessoal treinado da firma e a articulação com nosso ecossistema de produtos nos terminais onde este fornecedor esteva presente com seus sistemas e maquinário.

Fizemos a proposta em seus escritórios e obtivemos a resposta que esperávamos:

“Isto, assim como está, pode funcionar. Nós queremos tentar.”

A ordem altera o produto

Existem muitas maneiras e técnicas diferentes para obter informações valiosas e entender a fundo a situação que enfrentamos quando encaramos um projeto. Não acho que exista uma melhor: acho que há técnicas que se aplicam melhor que outras em certos casos; que, na soma das experiências, cada designer vai montando sua própria caixa de ferramentas.

Entretanto, não quero fechar este artigo falando sobre técnicas, pois acho que o mais valioso em todo o projeto foi a decisão antecipada (e acertada) de toda a equipe de parar a solução inteira desde a dor para desenvolver um serviço.

As oportunidades estão aí. Você precisa apenas ouvir e observar.

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