Deixa o caos entrar (também)

Eliara Rothmann
Fantástico Mundo RP
4 min readApr 3, 2018

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*Por Ingrid Humia

Nasci no comecinho dos anos 90, mais precisamente em 1990. Nessa época era bem comum que as mães, em qualquer evento social significativo (aquele aniversário que o coleguinha faz no McDonald’s. Para poucos), enfiassem sapatinhos bem fofinhos, mas desgraçadamente desconfortáveis nas crianças. Sempre quando minha mãe vinha com esses sapatos, eu pensava que não conseguiria correr muito, brincar muito e, muito menos, tirar os sapatos. Estava bem arrumada, mas presa.

Tenho a sensação que as relações de trabalho estão passando por esse momento: a necessidade de tirar os sapatos apertados demais.

Esse papo das organizações renovarem seus modelos não é novidade, mas a pressão agora parece ter atingido um ponto de realmente estourar a panela. Em todos os grupos de amigos há pelo menos uma pessoa que está decidida a “largar tudo e abrir o próprio negócio”, pois a organização em que está já não a entende e não está alinhada com seus valores.

Dee Hock, autor do livro “O Nascimento da Era Caórdica”, levantava em 1991 esse tema, essa atitude passiva das organizações frente as mudanças das pessoas:

Estamos vivendo no fio da navalha de um desses raros pontos decisivos da história humana. Estão em jogo vidas vivíveis para nossos netos, para seus filhos e para os filhos de seus filhos. As instituições hierárquicas de comando-e-controle da Era Industrial, que, nos últimos quatrocentos anos, cresceram a ponto de vida comercial, política e social, estão cada vez mais irrelevantes face a explosiva diversidade e complexidade da sociedade (HOCK, 1991, p. 18).

O ponto que me vem é: não dá mais. As pessoas não aceitam mais que as organizações encarem que há uma vida profissional e uma vida pessoal, separadas, e que o “funcionário” deve vestir a camisa de “funcionário”. Dar uma esquecida em sua subjetividade durante as 8 horas de trabalho. E Dee Hock deu esse recado, lá em 1991: as organizações precisam deixar o caos entrar. Toda a complexidade do ser humano precisa entrar nas organizações com ele.

Falou e disse, Mindinho.

Essa ideia (entre muitas outras que me tocam) é que as organizações deveriam ser mais caórdicas. Abrirem mão de um pouco da ordem, deixar um pouco de caos entrar e fomentar um ambiente que as pessoas consigam se integrar como um todo, participando intensamente dos processos, resultando em projetos extraordinários. Tá, simplificando ao extremo, mas a próxima imagem vai dizer mais do que as palavras:

Imagem super didática do Cocriar.

A falência dos modelos de gestão, que estão empoeirados, me leva a pensar que a mudança é urgente. Pode ser através do Modelo Caórdico. Ou não. Há diversas outras formas, mas as organizações não podem mais ignorar toda a potência que há na personalidade de cada um.

* Caórdico, adjetivo [português: caos + ordem] 1. Comportamento de qualquer organismo, organização ou sistema autogovernado que combine harmoniosamente características de ordem e caos. 2. Disposto de maneira a não ser dominado nem pelo caos nem pela ordem. 3. Característica dos princípios organizadores fundamentais da evolução e da natureza.

O caórdico abre mão de algumas burocracias e hierarquias para criar mais espaços de diálogos, em que todos possam participar. O resultado é o sentimento real de pertencimento, responsabilidade e liberdade. “Esse trabalho é tão meu, que ele contém parte do que eu sou e eu vou lutar com unhas e dentes por ele”

“Não há a menor dúvida em minha mente que caórdicos nós somos, caórdicos nós vamos permanecer, caórdico o mundo é, e caórdicas as nossas instituições tem que se tornar. É o caminho da vida desde o começo do tempo e o único caminho para um mundo sustentável nos séculos por vir, enquanto a vida continua a evoluir para uma sempre crescente complexidade” (Dee Hock)

Através desse modelo, a dica é: deixa o caos entrar (na sua organização/no seu jeito de fazer/na sua vida), que ele pode trazer projetos incríveis com ele. E, para conhecer mais sobre o modelo caórdico, vale a pena comprar o livro (que está na promoção na Amazon): clica aqui.

Sobre Ingrid Humia.

Ingrid é formada em Relações Públicas pela Universidade Feevale. Começou sua experiência profissional em agências digitais de Porto Alegre e com o trabalho em mídia e conteúdo online. Percebeu o quanto é sedenta por conhecer as pessoas, entender seus hábitos, diferentes formas de pensar e como tantos fatores geram interações diferentes. Assim, foi para o campo da pesquisa. Hoje trabalha profissionalmente com pesquisa (on, off, meu método é “falar com gente”) e planejamento, além de atuar no projeto da Universidade Feevale que pesquisa a relação entre cultura organizacional, comunicação e afetividade.

Um bj :*

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