Jornalismo Inspirador: os 5 pontos mais falados no Festival 3i

Por: Manoella Fortes Fiebig

Fernanda Hack
Fantástico Mundo RP

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Evento ocorreu entre 18 e 20 de outubro, no Rio de Janeiro, e reuniu mais de 300 ouvintes entre oito oficinas, oito mesas de debate e 42 palestrantes de diversos países.

O Festival 3i: Jornalismo Inovador, Inspirador e Independente, evento realizado por um collab de 13 empreendimentos nativos digitais brasileiros, ocorreu no último final de semana na cidade maravilhosa. Os salões da Fundição Progresso, prédio histórico do Rio de Janeiro, localizado no coração da Lapa, serviram de palco para os mais de 42 convidados que palestraram durante os três dias de evento.

O festival parece ter sido um respiro longo e profundo após um bom tempo de asfixia: foram três dias para refletir sobre o papel do jornalista nas democracias prematuras, como a do Brasil, para reafirmar a necessidade de trabalhos investigativos, para abordar a inovação e as práticas digitais, para, enfim, reacender uma chama que parecia se apagar aos poucos nos últimos anos.

O jornalismo, como muitos afirmaram no palco do evento, está mais vivo do que nunca.

Prova disso são os 13 veículos nativos digitais que foram os responsáveis por organizar o evento. Vale a pena enaltecer cada um deles, então, abaixo deixo os links para vocês conhecerem estas iniciativas sensacionais. Assim, você poderá visualizar o trabalho imprescindível (e muito fod@) destes vanguardistas da mídia alternativa nativa digital no Brasil.

Foram três dias inteiros de palestras, workshops, coffee break reforçado e intercâmbio cultural, especialmente pelo fato de que, entre os palestrantes, em praticamente todas as mesas havia convidados de outros países abordando realidades distintas do contexto brasileiro.

Teve gente da Venezuela, Argentina, Colômbia e, inclusive, ilustres convidados que voaram dos EUA para palestrar no evento.

Destaque para a fala de abertura do congresso, ministrada pelo professor Rosental Alves, diretor do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas (uma iniciativa para profissionalizar o jornalismo digital preconizada por Rosental e vinculada à University of Texas) e uma das maiores referências mundiais quando o assunto é inovação no jornalismo.

Vale destacar também a participação divertida e extremamente necessária de Glenn Greenwald, diretor do The Intercept, jornal nativo digital cujas bases estão fundamentadas no jornalismo investigativo raiz (você deve lembrar dos vazamentos do Ministro Sérgio Moro, né? Então, Glenn foi o jornalista corajoso que trouxe ao público reportagens evidenciando todo o esquema que ficou conhecido como “Vaza Jato”). Glenn abordou temas como reportagens e investigações que podem abalar estruturas poderosas, governos e conglomerados econômicos e a importância de publicar investigações desta natureza, pensando sempre no direito da população de ter acesso à estas informações.

Como foram 3 dias intensos de palestras e debates, separei 5 pontos essenciais para se pensar o jornalismo inovador, inspirador e independente no Brasil. Segue a linha:

1. Colaboração é a keyword

Um dos assuntos que permeou os debates em praticamente todas as discussões foi a possibilidade de criar grandes projetos jornalísticos em colaboração, tanto entre empresas jornalísticas tradicionais com veículos independentes, quanto entre profissionais de forma autônoma. Um dos exemplos mais citados foi o collab Panamá Papers, movimento que evidenciou um conjunto gigantesco de documentos confidenciais entre uma sociedade de advogados sobre paraísos fiscais, envolvendo governos presidenciais de 5 países, grandes empresas do mundo todo (incluindo acionistas e administradores brasileiros) e uma série de multimilionários. O Panamá Papers foi um exercício em massa que envolveu jornalistas em diversos países, de diferentes veículos jornalísticos e que resultou, entre outras ações, em diversas prisões, devoluções de dinheiro aos cofres públicos, cassações de mandatos e, inclusive, na mudança de leis em alguns países.

2. Jornalismo raiz

Acredito que um dos ideais mais buscados por estudantes de jornalismo quando entram na faculdade é justamente criar reportagens que contribuam na mudança dentro da sociedade. Sejam reportagens investigativas, denunciando grandes esquemas de corrupção, sejam reportagens educativas, socioambientais ou que simplesmente mostram boas ações para o bem comum. O que pudemos ver e sentir nos três dias de evento é que esses ideais tão presentes no imaginário dos jornalistas estão mais vivos do que nunca. Em tempos em que jornalistas ficam sentados nas redações fazendo entrevistas pelo WhatsApp, o que vimos foi uma ode ao jornalista que vai pra rua, escava documentos, tira o pó dos livros, pesquisa a fundo, minera dados em portais oficiais, cria listas de fontes e contatos com todos os órgãos do estado. Tem faro para a notícia. Tem sangue nos olhos. Tem paixão. E, principalmente: tem noção do impacto que a profissão tem dentro de uma democracia. Uma das frases mais importantes que ouvi por lá foi: “se a notícia é de interesse público, doa a quem doer, você deve publicar”.

E não sou eu quem estou falando isso:

https://twitter.com/manoellaFF/status/1185635984538554369

3. Data journalism

Os veículos nativos digitais já nascem neste contexto, mas grandes empresas como o próprio New York Times tiveram de criar setores específicos para entender e trabalhar os volumes gigantescos de dados que os usuários estão gerando a todo momento na internet. A boa notícia é que, em 2019, temos estruturas avançadas de TI dentro de empresas trabalhando em prol da notícia, desde pequenos negócios digitais, até grandes nomes do jornalismo, como o NYT. Millie Tran, editora de plataformas do New York Times falou um pouco sobre os projetos do gigante norte-americano neste sentido e demonstrou alguns exemplos sobre como a notícia está adaptada para todas as plataformas da marca. O instagram do grupo foi um exemplo sobre como eles trabalham as diferentes audiências do jornal, conseguindo cada vez mais assinantes nas versões online por conta da personalização do conteúdo. Outro palestrante que falou muito sobre o uso de dados no jornalismo foi Tiago Barra, Engenheiro de Computação que já participou da escalada de diversas startups unicórnio (99, Empiricus e Rappi). Para ele, usar métricas no jornalismo é um dos caminhos mais eficazes para entregar produtos assertivos e inovadores para rentabilizar pequenos negócios nativos digitais.

4. Como ganhar dinheiro com jornalismo?

Ok. Tudo o que falei até aqui é importante. Mas o que mais assombra empresas jornalísticas hoje é a incerteza sobre a rentabilidade da atividade jornalística. Palestrantes como Janine Werner, da Sembra Media (empresa que ajuda empreendimentos jornalísticos a alavancarem suas atividades na internet), fala que, para garantir rentabilidade no jornalismo digital é importante criar audiências fiéis e buscar atrair milhares de visitas para seus conteúdos. Ser reconhecido é o primeiro passo (e no site da Sembra há várias dicas sobre como fazer isso). O segundo é não depender de apenas uma fonte de renda, ou seja, combinar fatores é um dos segredos para as startups ganharem dinheiro de verdade com o jornalismo. Assinaturas, brand content aliado à informação, financiamento coletivo e principalmente, criatividade, são ideias que combinadas podem rentabilizar um empreendimento nativo digital.

5. Desinformação é a ameaça real e a relevância do fact checking

O grande problema do jornalismo hoje é justamente o contrário dele: a falta de informação. Diversos palestrantes trouxeram este debate como a grande questão que ameaça a democracia e a credibilidade de jornais (isto pode causar profundas transformações na sociedade!!!). Infelizmente, a desinformação fica ainda mais evidente por conta da arquitetura da rede e das próprias redes sociais, que possibilitam naturalmente a formação de clusters por meio de algoritmos em sites como o Facebook. Os sites de redes sociais são grandes propulsores quando o assunto são os boatos (ou fake news) na internet, já que possibilitam a veiculação exacerbada de publicações por meio de replicação do conteúdo, compartilhamento, etc. Conteúdo falso ou minimamente modificado pode prejudicar o trabalho sério de jornalistas que buscam informar. O fact checking é uma das armas dos jornalistas contra a desinformação e, novamente, num contexto digital, os dados podem ser grandes aliados na hora de criar reportagens investigativas com o auxílio de informações oficiais disponíveis na rede. Esta, no entanto, é uma questão muito, muito mais profunda e não cabe nos caracteres deste artigo.

Foto: Twitter do Festival 3i.

Como bônus, ainda preparei um sexto ponto que ficou muito evidente nos dias de evento: as iniciativas nativas digitais independentes estão crescendo e se mobilizando em todos os cantos do Brasil. São centenas de jornalistas que resolveram se juntar e começar, por conta própria, a criar pequenos negócios digitais. Disruptivos, preocupados em informar em editorias gerais ou em pequenos nichos, estes empreendimentos, que nascem e se desenvolvem na rede, já naturalizam todas as questões envolvendo algoritmos, métricas, automação, big data e como isso tudo pode contribuir para o trabalho do jornalista. O jornalismo alternativo e nativo digital é, de fato, o futuro.

O Festival 3i: Jornalismo Inovador, Inspirador e Independente merece, ainda, mais uma série de textos para dar conta de dimensionar a quantidade absurda de informações e reflexões trocadas entre os últimos dias 18 e 20 de outubro. O que fica é, de fato, a inspiração e o coração batendo ainda mais forte por todos aqueles ideais que TODO JORNALISTA QUE EU CONHEÇO, um dia, já cultivou.

OS ORGANIZADORES DO EVENTO MERECEM SER ENALTECIDOS ❤ :

Agência Lupa

Agência Pública

JOTA

Nexo

Nova Escola

Ponte Jornalismo

Repórter Brasil

((o)) eco

Congresso em Foco

ÉNois

Marco Zero Conteúdo

Poder360

Projeto #Colabora

Por:

Manoella Fortes Fiebig, empreendedora, Jornalista (UFSM), Mestre e Doutoranda em Comunicação pela UFPR | @manoellaff nas redes sociais :)

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