Upcycling — A era da moda consciente

Iniciativas de reaproveitamento de material transformam o setor da moda no Brasil

Paula Leal
Fora da Caixa
4 min readNov 8, 2019

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Quem resiste a uma roupa nova? Mesmo com uma infinidade de opções no guarda-roupa, uma “brusinha” diferente é sempre bem-vinda, não é mesmo? Esse comportamento de consumo, estimulado pelas lojas do varejo fast-fashion, tem se mostrado cada vez mais insustentável diante das frequentes crises ambientes no planeta.

O setor de moda joga fora, a cada segundo, pelo mundo, o equivalente a um caminhão de lixo cheio de tecidos, segundo dados de 2017 da Fundação Ellen MacArthur. Das 170 toneladas de resíduos têxteis descartadas, 85% vão para aterros sanitários.

Mas enquanto uns grudam os olhos em vitrines abarrotadas de lançamentos descartáveis a cada coleção (que fica cada vez mais constante), outros miram nos caminhões de resíduos e descartes. As sobras no mercado da moda estão fazendo a alegria de pessoas que enxergaram oportunidade para transformar materiais descartados em negócios rentáveis e criativos.

É o caso da estilista uruguaia Agustina Comas, que vive há 15 anos em São Paulo e é dona de uma marca com seu sobrenome. Na empresa, ela cria peças novas a partir de camisas masculinas descartadas por defeitos de fabricação e de sobras da produção têxtil. “São toneladas de sobras. Entre 7 e 15% do tecido cortado para fazer uma roupa vai para o lixo, isso se o corte for bem feito”, diz a estilista.

Créditos @konstantin.larsson

Essa tendência na moda para reaproveitar materiais descartados para a criação de algo novo e original é chamada de upcycling. O termo, usado pela primeira vez em 1994 pelo ambientalista alemão Reine Pliz e ainda sem tradução para o português, já está incorporado no discurso da moda sustentável para evitar o desperdício e a poluição têxtil.

Diferente da reciclagem tradicional, que transforma o resíduo em algo com valor menor do que o produto original, o upcycling transforma o descarte em um novo produto que pode ser vendido por um preço mais alto e melhor, sem utilizar aditivos químicos.

Para a consultora do Sebrae Maria Augusta Miglino, “prolongar a vida útil de um material não acaba com o problema da geração de resíduos porque o produto irá para o lixo em algum momento, mas é importante para diminuir a compra de peças novas”.

Em 2006, a curitibana Gabriela Mazepa trocou a faculdade de arquitetura por uma escola de artes na França, onde entendeu a importância da sustentabilidade. De volta ao Brasil em 2013, fundou a Re-Roupa, marca paulistana que produz itens a partir de roupas de segunda mão compradas em bazares e brechós. “Nosso maior diferencial é usar o que a moda em geral rejeita.

Usamos a matéria-prima existente, independente dela estar na moda ou não, porque o que nos interessa é a memória afetiva da roupa”, diz Gabriela. Nas mãos da empresária e de sua equipe, uma camisa usada vira, por exemplo, uma saia ou uma camiseta.

Créditos @yrurari

As iniciativas de Gabriela e Agustina reforçam a tendência de um caminho sem volta para negócios que desafiam a máxima no mercado do “lucro acima de tudo” colocando em seu lugar o “lucro com benefícios socioambientais”. São empresas que utilizam seu poder no mercado para encontrar soluções para questões sociais e ambientais, sem deixar de ganhar dinheiro.

A rede de fast-fashion Forever 21 entrou com pedido de recuperação judicial neste ano. A estratégia agressiva de abrir lojas físicas em todo mundo se mostrou insuficiente para manter os lucros da gigante do varejo, que vinha sofrendo com o mercado de e-commerce.

Para além da concorrência online, a geração millennial está mais preocupada com os impactos ambientais ocasionados pela produção em alta escala das grandes lojas e tem questionado as condições de trabalho dos empregados nas fábricas.

Se o segmento de fast-fashion está com os dias contados só tempo dirá. Mas saber que já existem opções no mercado para adquirir uma “brusinha” diferente ecologicamente sustentável é um alívio para os aficionados por moda.

(Colaboração Valéria Luizetti)

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