“É MUITO DIFÍCIL ESTAR AQUI?”
Não costumo ouvir esta pergunta com frequência. Nunca devo ter dado atenção a esse tipo de pergunta, talvez, mas eu lembro muito bem de quando eu não tive resposta. Foi ano passado, quando eu trabalhava na recepção da internação de um hospital pediátrico. Chegou para internar uma criança de uns 7, 8 anos com problemas cardíacos, viera de outro hospital. Tudo me chamou atenção neste paciente. Ele veio na cadeira de rodas, de bermuda azul. O tubo de oxigênio que o socorrista da ambulância trazia era maior que o menino. Junto vieram 3 malas enormes, 3 travesseiros, cobertas. A mãe da criança muito nervosa, era visível o esforço para se manter calma, ela tinha muita atenção em cada informação que eu passava, mas de fato ela não estava conseguindo me ouvir. Muito difícil dividir o olhar comigo, que passava as informações sobre a internação e olhar o filho para conferir se ele estava bem. Após terminar toda a burocracia, pedi que se organizassem para ir para o quarto. Quando levantamos para organizar as coisas, ela me pergunta, com os olhos arregalados: “moça, é muito difícil estar aqui?” Tomei um susto e num primeiro momento eu realmente fiquei sem entender o que ela queria saber, então perguntei: “como assim?” “Ah… Assim… Ele não tem pai, e eu estou sozinha, nunca passei por isso, é muito difícil?” O que se responde? Lembro de ter respondido algo como: “fácil não é, seria importante alguém para lhe ajudar, a senhora vai precisar descansar em alguns momentos”. Ela disse que veria uma prima, mas eu realmente fiquei tão surpresa com a pergunta, que depois não consegui dar muita atenção ao resto. Quando fui pra casa eu só queria tomar um banho, comer algo bom e deitar, foi então que eu consegui ter dimensão da pergunta, pois quando deitei, a única preocupação que eu tinha era se eu tinha posto o relógio para despertar.
Livia Monteiro
Como artista latina, trabalho de forma politica, radical e visceral. Tenho por objetivo fortalecer a luta feminista com suas produções de múltiplas linguagens e responsável por ações anti-fascistas, antirracistas, que apoiam o movimento LGBTQIA+, estudando, escutando e lutando pela garantia de direitos.
