Literatura cotidiana
Domingo. 16 horas e 27 minutos. Vou lhe poupar dos segundos.
Estou, literalmente, estirada no sofá, com o braço esquerdo apoiado e as pontas dos dedos da mão posicionadas estrategicamente na cabeça, testa e bochecha, enquanto a mão direita segura o celular e o dedão digita essas palavras com relativa dificuldade. Pela primeira vez, eu não sei o que escrever para o blog Frestas. Eu já iniciei exatas quatro crônicas, mas nenhuma foi pra frente. Então, cá estou eu, olhando para o nada, tentando entender os motivos que impedem minha escrita.
Meu pai acabou de estirar o corpo no sofá ao lado. Ele também tem o olhar atento ao nada. Fico imaginando nesse momento o que se passa na cabeça do seu Fernando. Ele coçou o braço, como se estivesse desconfiado do que eu também penso. Estamos olhando para o mesmo rumo e só Deus sabe o que se passa com cada um.
A gente se olha e ele consegue balbuciar as seguintes palavras: “e aí?”. Eu só encolho os ombros e a boca, sem nada dizer. E continuo aqui escrevendo essas palavras que podem não fazer o menor sentido pra você que ainda me lê.
Fui interrompida. Minha mãe chegou perguntando sobre uma compra feita pela internet. “Olha se eu comprei o elástico branco”. Faço uma busca rápida no e-mail. Sim, ela pediu. Mas agora acontece uma certa discussão sobre outra compra, enquanto minha irmã analisa alguma coisa qualquer no celular, sem prestar atenção no que é dito sobre compras, nota fiscal e papéis. Nos momentos de pausa, consigo digitar rapidamente, para não perder os detalhes da situação.
Aí acontece uma sincronia. A poucos minutos atrás eu tinha falado de uma pessoa, e ela acaba de me mandar mensagem falando exatamente o que eu precisava que ela falasse. Muitas concordâncias para o verbo falar em uma frase só.
Todo mundo dispersa da sala. A campainha toca, me tirando do meu momento reflexivo e meditativo. Deve ser hora de encerrar essa literatura cotidiana e abrir a porta para a visita que chega, sabe-se lá de onde e para quê.