Política Externa de um governo Alckmin (ou de volta às raízes há tão pouco renegadas)

Gusttavo
Friday Night Talks
Published in
6 min readOct 5, 2018

Meus colegas do FNT já postaram suas análises de 4 dos principais candidatos a presidência da república nas eleições desse ano. Agora é a minha vez de palpitar a respeito do plano de Política Externa do candidato Geraldo Alckmin (que pode ser consultado na integra aqui).

De todos os candidatos já analisados, Fernando Haddad foi o único que teve como parâmetro algo que já foi posto em prática, tendo em vista que seu partido, o PT, esteve por mais de 10 anos no poder e implementou uma Política externa bastante atuante no cenário internacional alvo de muitos elogios e de algumas críticas.

Nem Ciro, nem Marina, muito menos Bolsonaro possuem por de trás de suas propostas uma tradição consolidada no que diz respeito ao conteúdo programático partidário de suas formulações.

Ao meu ver, as propostas do candidato Ciro Gomes para a Política Externa se assemelham bastante com a tradição petista de Política externa denominada pelo próprio partido de “ativa e altiva” que traz uma ideia de reformismo da esfera internacional atrelado à um projeto desenvolvimentista na economia. Já as propostas da candidata Marina Silva tem na esfera ambiental o seu ponto forte, em tempos de negacionismos a respeito das mudanças climáticas, há certamente um espaço grande para que países com a biodiversidade e o potencial energético (renovável) que possui o Brasil, assumam a dianteira nas negociações a respeito de medidas que assegurem um futuro próspero e sustentável na esfera global. Houveram diversas épocas no passado em que o Brasil já ensaiou assumir essa agenda para si, mas nunca de forma contundente e como principio guia. No que tange a política externa institucional, o discurso do plano de Marina chega a se assemelhar, em partes, com a Política Externa do governo FHC, dando muita ênfase ao multilateralismo e na participação do país em diversas instituições internacionais. Já os planos de Bolsonaro, como bem avaliou meu amigo Bruno, não diz nada que possa apontar para uma analise substancial… Assim como todas as outras áreas de seu plano de governo, a política externa continua uma incógnita.

Com Geraldo Alckmin, do PSDB, é possível situar a analise de seu plano para a Política Externa tanto no plano comparativo no que diz respeito as tradições de seu partido que esteve por 2 mandatos no poder durante o final da década de 90, quanto pela atuação recente que o PSDB teve durante todo o governo do PT como oposição tecendo as principais críticas ao Partido dos Trabalhadores.

Do ponto de vista da tradição do partido como formulador, a política externa levada a cabo pelo PSDB quando o partido esteve no poder foi denominada pela pesquisadora Letícia Pinheiro como “Institucionalista pragmática” — mesmo termo que o colega Bruno utilizou para caracterizar o program de POLEX da Candidata Marina Silva. Esse paradigma de Política Externa seria caracterizado por uma visão que justifica e estimula a adesão aos regimes internacionais e às instituições que os incorporam como solução para os problemas de ação coletiva. Atrelado a essa atuação internacional institucional, o governo FHC caracterizou-se no âmbito econômico, principalmente durante seu primeiro mandato, pela abertura econômica, liberalização das regras de comércio e responsabilidade fiscal.

Após anos negando parte dessas políticas em campanhas eleitorais (principalmente a parte econômica), o plano de governo do PSDB de Geraldo Alckmin para as eleições de 2018 retoma quase que integralmente todas essas características que estavam presentes na política externa do período FHC. Na área das instituições internacionais, o plano de Alckmin afirma querer:

“ Ampliar e tornar mais dinâmica a participação do Brasil nas organizações internacionais, em temas globais como sustentabilidade, energia, tráfico de armas e de drogas, combate à corrupção[…] A política externa continuará a apoiar firmemente o ingresso do Brasil na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Serão buscadas formas de ampliar nossa participação política e econômica no BRICS, no G-20, na CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) e no IBAS (acordo Índia, Brasil e África do Sul)”.

Já na parte da política externa que se refere especificamente a economia, a questão da abertura econômica e liberalização das regras de comércio também voltam a tona com o plano afirmando que o Brasil deve

“ Assumir uma atitude proativa no tocante à integração regional para, com a liderança do Brasil, ampliar a liberalização comercial, aprofundar os acordos vigentes e a integração física. Em relação ao Mercosul, acelerar a recuperação de seus objetivos iniciais e avançar nas negociações com terceiros países”.

e

“A abertura ao comércio exterior por outro lado é componente essencial de um esforço diplomático de maior protagonismo do país no cenário político mundial. Todos os países emergentes com crescimento elevado têm economias abertas e integradas ao mercado internacional. O Brasil é uma das economias mais fechadas ao comércio exterior do mundo.”

A ênfase na crítica ao nível de fechamento da economia brasileira pode parecer rotineira, mas em se tratando de PSDB, ela representa uma vitória de um pensamento mais “cosmopolita” ou “liberal” dentro do partido que por muito tempo foi rejeitado por parte de lideres importantes da sigla como o ex candidato a presidência José Serra que em 2016, quando ainda era chanceller, chegou a afirmar que “Dizer que o Brasil é economia fechada é folclore”.

Já do ponto de vista da atuação mais recente do partido, quando foi oposição ao governo do PT, as características mais presentes na proposta para a Política Externa são: 1.A crítica que caracteriza a política externa dos governos petistas como ideológicas e partidárias e 2. A ênfase nos escândalos de corrupção em que o PT se envolveu nos últimos anos que segundo o plano “Destruíram a imagem do país no exterior”.

“ Os escândalos de corrupção destruíram a imagem do país no exterior; e a diplomacia dos governos do PT se transformou num instrumento de propagação de interesses partidários e ideológicos, contrários ao interesse nacional.”

Como contraposição a crítica 1, o plano fala em dar maior autonomia ao Itamaraty que manteria o “papel central” na formulação e execução da política externa ao coordenar todas as áreas de negociação internacional e regional. Como contraposição a crítica 2 que enfatiza a questão da corrupção, o plano para a polex fala em ampliar a participação do país em organizações internacionais que tratam do tema e afirma que irá ter

“ Condutas de governança de alcance global, tais como as ligadas ao combate à corrupção, à transparência no trato da coisa pública e à adoção de medidas de compliance no setor público serão adotadas e estimuladas pelo Brasil nas relações com países e com organismos internacionais.”

Para além dessas duas chaves de analises, outras questões pontuais podem ser destacadas. Uma delas é a visão por parte dos formuladores da Política Externa do PSDB a respeito do regionalismo. Na última quarta-feira (03) o embaixador Rubens Barbosa, principal responsável pela formulação do plano de Política Externa de Geraldo Alckmin, participou do programa Roda Viva, em que se discutia questões relacionada as Relações Internacionais e chegou a afirmar que o Brasil deveria se juntar a Parceria Transpacífico com fins de integração ao que ele chamou de novos fluxos do comércio internacional. Ao observar no programa do candidato tucano, podemos constatar que há uma passagem que está em consonância com a fala do embaixador

“ Deverá ser iniciado processo de negociação para a adesão ao acordo comercial na Ásia (Parceria Transpacífico, integrada pelo Japão, Aliança do Pacífico e países asiáticos) e finalizada a negociação do Mercosul com a União Europeia[…]”

Outra questão ressaltada no texto, embora não se encontre muito presente do discurso do candidato, é a questão ambiental. Seguindo a tradição de adequação aos acordos internacionais, o plano assume o compromisso de cumprir as metas assumidas no acordo de Paris e toca em outros pontos mais genericamente como gerir a Amazônia com “ atenção, proporcional à crucial responsabilidade que toca ao Brasil” e promover o potencial derivado do uso das energias renováveis e o manejo de recursos hídricos e oceânicos de “modo assertivo”.

Em traços gerais, o plano de Alckmin para a Política Externa brasileira remete à antiga tradição do PSDB enquanto esteve no poder na década de 90 ao enfatizar a participação nas organizações internacionais e a maior abertura econômica com a finalidade de integrar o país nas cadeias globais de produção. Somando-se a essa tradição, está presente as críticas usuais feitas ao governo petista dentro dessa esfera, enfatizando a suposta partidarização da política externa “ativa e altiva” e destacando fortemente a questão da corrupção. Aliado a esses aspectos centrais, encontram-se considerações a respeito de temas concernentes a questões mais atuais como o novo fluxo dinâmico do comércio que parece estar se deslocando para o pacífico e as questões ambientais que cada vez mais se tornam destaque na esfera internacional se tornando motivo de polêmicas.

--

--