Brasil e Portugal: sociedade, poder e cultura

Fundação FHC
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2 min readSep 6, 2022

Fernando Henrique Cardoso

Foto: Alice Vergueiro

Acredito profundamente que o Brasil é uma grande nação, por seu território e população. Contamos no mundo, herdeiros que somos de uma cultura original, mestiça, afeita ao sofrimento, mas movida por uma inquebrantável alegria de viver, e de ativos estratégicos como um patrimônio natural em biodiversidade e biotecnologia que nos projeta no futuro.

Os ativos do Brasil explicam a resiliência de que a sociedade deu provas ao enfrentar o desafio da pandemia a despeito da inércia ou, pior, dos erros do governo. Essa resiliência nos anima e nos alenta. Uma nação é uma comunidade de destino. Precisamos de quem possa inspirar, em lugar de ódio e rancor, confiança em nós mesmos. Confiança requer serenidade de quem busca despertá-la nos seus compatriotas, exige compostura, capacidade de convencer pelas ideias e não de se impor pela ameaça.

Sempre houve no Brasil um pensamento conservador. Hoje há o surgimento de uma ‘nova direita’.

Esta direita é mais reacionária do que conservadora. Não defende ideias, quer voltar para um passado que não existe mais, se é que algum dia existiu. Suas posições extremas podem ser o combustível para ódios e divisões que tendem a prosperar em tempos de crise e ameaçam a democracia.

Há que fugir das ideologias, com suas utopias regressivas, aliados autoritários e inimigos imaginários. Seria uma imensa regressão se, em nome dos “valores do Ocidente” ou de um pretenso imperativo bíblico, o Brasil viesse a se alinhar com os que negam a mudança climática, perseguem artistas e cientistas, são insensíveis às violações de direitos humanos e não aceitam a liberdade de cada um de viver sua vida.

O Brasil já contou com políticas e políticos que despertavam confiança. Convivi com Tancredo Neves. Era homem de fala mansa, mas de valores firmes. Foi um democrata a vida toda, um político de diálogo, atento à necessidade de buscar denominadores comuns em momentos críticos. Convivi com Ulysses Guimarães, que sabia aliar ao diálogo a firmeza, quando necessário. E assim vários outros. Que a lembrança deles nos inspire a fazer frente aos arreganhos autoritários com firmeza e serenidade para que em 2022 não se repita o desfecho trágico de quatro anos atrás.

Este texto é parte do artigo publicado no livro “Minha Pátria é Minha Língua”, que reúne ensaios e textos de opinião sobre as relações luso-brasileiras na cultura, na história e na contemporaneidade.
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