Anitta sim. Ele não!

Polêmica sobre omissão da cantora na campanha virtual contra o presidenciável Jair Bolsonaro levantou questionamentos sobre seu real envolvimento com o público LGBT

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Fundação LGBT+ Agreste
2 min readSep 24, 2018

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Anitta na Parada LGBT 2018 em São Paulo (Foto: Divulgação/Felipe Panfili)

Por Lucas Bulgarelli

Tardou, mas eu achei excelente que Anitta se posicionou apoiando a hashtag #EleNão [que viralizou na web e ganhou, entre os adeptos, artistas internacionais na campanha contra o candidato Jair Bolsonaro].

Quando começaram a cobrar dela uma posição, vi desde liberais que consideravam “um absurdo empenhar essa ‘cruzada moral’ contra artistas” até militantes que decretaram que “dela não se devia esperar nada”. Eu discordei das duas posições.

Ela tem visibilidade e parte expressiva dos seus fãs é LGBT ou LGBT friendly. A inserção de mercado da Anitta é calculada levando em consideração esses nichos.

O movimento LGBT aprendeu em diferentes partes do mundo a manipular o boicote como uma ferramenta de pressão política dentro da lógica de mercado. Da Barilla às marcas de vodka e cerveja, isso tem mostrado resultados efetivos, ainda que pontuais. É, por assim dizer, uma ação completamente compatível e desejável dentro das práticas liberais, para o bem e para o mal.

Ao mesmo tempo, a visibilidade que Anitta tem é fundamental para que as lutas LGBT alcancem mais pessoas. Celebridades que são favoráveis às nossas bandeiras fazem com que nossas hashtags e posicionamentos alcancem lugares que não conseguimos sozinhos.

Se elas fecham logo de cara com o nosso bonde, quanto melhor, mas se não, tem mais que pressionar. Porque o que interessa para nós, ou deveria interessar, é que a visibilidade dela amplie o nosso lado, influencie quem está indeciso. Nem todo LGBT que curte Anitta aderiu ao movimento por detrás do #EleNão e nem todo público de Anitta é LGBT. Temos aonde avançar aí.

“Ah, mas ela podia ter se posicionado antes”. “Ah, mas não é a primeira vez”. “Ah, mas ela só fez isso por benefício próprio”.

Olha, tudo bem, verdade. Mas, honestamente, acho que todos já chegamos à conclusão de que essa cobrança pelo posicionamento sem erros, perfeito, idêntico, não tem levado a gente para um bom caminho.

Se Anitta se posicionou tarde, se ela vai lucrar com isso, ótimo pra ela. Aliança é assim. Interesses distintos, até mesmo divergentes, mas existe um propósito em comum em que todos ganham com essa união até então indesejável.

Anitta não é militante, é artista. Ela não precisa se tornar militante para ser útil a nós. Nós também temos nossos interesses na visibilidade de todos esses artistas que lucram com a gente. E eles são urgentes.

*Lucas Bulgarelli é Mestre e Doutorando em Antropologia Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. É pesquisador do Núcleo de Estudos dos Marcadores Sociais da Diferença (NUMAS-USP) e do COCCIX — Estudos em Corpo e Cidade (USP).

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