Uma nova editora na selva do futebol

Com livro sobre o futebol amazonense e a escolha de Manaus para a Copa de 2014, editora Dolores se lança no mercado

Bruno Rodrigues
Futebol Café
4 min readAug 7, 2019

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Uma edição de “A Selva do Futebol” bem acompanhada de um café expresso (Crédito: Futebol Café)

Quando comentei com o Gustavo Valadares, apresentador do podcast Rock Flu, que um colega de São Paulo estava lançando uma editora especializada em futebol, sua reação foi: “Que coragem!” Pois foi também o que pensei assim que soube do surgimento da editora Dolores, que se lançou no mercado editorial com um livro-reportagem sobre o futebol da Amazônia, a escolha de Manaus como sede da Copa do Mundo de 2014 e a construção da arena local para receber o Mundial.

Mas só coragem não sustenta uma ideia como a do Raul Andreucci, o jornalista responsável pela editora. Tomamos um café na semana passada, no centro de São Paulo, onde ele me explicou não só o que é o livro “A Selva do Futebol”, escrito em parceria com o também jornalista Tulio Kruse, mas também o que é a Dolores, para onde querem ir, o que pretendem ao estabelecer uma iniciativa como essa em um universo tão complicado como é o da literatura de futebol no Brasil.

Interior do livro “A Selva do Futebol” (Crédito: Instagram/Dolores Editora)

O contato físico com o livro mostra o cuidado com o produto. Tudo é pensado, até aquilo que o leitor pode encarar como uma feliz coincidência.

Este zelo pelos detalhes pode ser visto desde a capa, passando pela cor das páginas e a encadernação, mas como o próprio Raul me confessou no café, não vale ficar expondo todos os segredos justamente para que você, leitor como eu, tenha curiosidade sobre o porquê dos processos e das escolhas dos editores.

Fato é que “A Selva do Futebol” se trata de um trabalho artesanal, e essa ideia transcende a questão material da obra.

O texto é uma construção cuidadosa e que, depois de uma série de idas e vindas, termina neste livro-reportagem. Tulio Kruse tinha uma ideia de matéria sobre a escolha de Manaus como sede e as muitas dúvidas a respeito do aproveitamento e da construção da Arena Amazônia. Era um trabalho mais tradicional de reportagem, de apuração jornalística.

Raul Andreucci já caminhava por uma outra vertente, mais literária, de contar as histórias do insípido futebol amazonense e quem, na teoria, poderia ser o herdeiro daquele movimento de levar o Mundial para o Amazonas.

O encontro entre os dois se deu quando foram tentar vender seus conteúdos para veículos de imprensa. Um desses veículos se deu conta de que, ao invés de aproveitá-los separadamente, Tulio e Raul poderiam juntar forças e dar corpo a uma grande reportagem, cada um com sua característica. Mas a história, aqui resumida pois não é do interesse de quem não é jornalista, é a história do próprio jornalismo atual.

Veículos fecham, mudam de nome, editores que vêm e vão, prazos não são respeitados e o que era para dar as caras como matéria antes da Copa do Mundo no Brasil acabou virando livro para depois do evento e, agora, ganha enfim uma editora para chamar de sua.

O futuro da Dolores é tão incerto quanto o nosso, porque se pudéssemos vislumbrar o sucesso do dia de amanhã e não antecipássemos minuto a minuto os nossos fracassos, crises de ansiedade não seriam um problema.

Porém, por trás da editora há mais do que uma iniciativa errante e desesperada por dar certo. Há um processo, que vai tentar se consolidar com mais lançamentos que já estão por vir e outros que fazem parte do planejamento para o curto e médio prazo da empreitada.

Raul Andreucci acredita -e para mim, com razão- de que a Dolores vem para preencher uma lacuna no mercado editorial de futebol. Seus livros (e revistas, ou não era pra falar?) querem contemplar uma literatura mais cuidadosa e, em alguns momentos, até acadêmica, de menor apelo comercial do que o lançamento sobre o título estadual que seu time conquistou.

É um trabalho direcionado para um nicho? Sim, assim como o próprio Futebol Café. Mas é um nicho que ainda não se sente contemplado e pede por alternativas, referências e novidades. O mesmo nicho que entra em uma grande livraria e vai até a prateleira de Esporte só para cumprir com o dever de se certificar que está tudo como estava da última vez. Mesmice e pobreza.

Por esse nicho, e essa ideia de contemplar o que não está contemplado no esporte bretão escrito, é que a Dolores se lançou no mercado. Ou melhor, na selva da literatura de futebol.

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