Turista, Imigrante, Peregrino

Gabriella
3 min readJan 16, 2016

Desde minhas primeiras viagens comecei a pensar sobre as diferenças entre as pessoas que estavam nos mesmos lugares que eu, ali, esperando o check-in, a bagagem, tirando fotos, olhando distantes pela janela do trem, brigando com mapas, perguntando informações com o dicionário da língua local à frente…

Comecei a pensar nas diferenças entre turista, viajante, imigrante e peregrino. Quais seriam os propósitos que levavam cada uma daquelas pessoas até ali, naquele momento? E mais que isso, por que tipo de comoção passaria suas vidas depois daquela experiência?

O ser humano só vive em relação, com o outro. Mas provoco essa afirmativa lembrando que muitos atribuem ao outro suas aspirações, sentimentos e sentidos. Chamo a isso, inspirada em minhas incursões pela obra de Michel Maffesoli, de ex-tensão. A realização e experiência de vida passam a ter o outro como condicionante. Por outro lado, há os que se comovem pela certeza de que está em si o potencial de mudança para todo e qualquer desejo. A concentração e a construção são interiores: in-tensão.

Entre um ponto e outro, onde estariam meus companheiros de viagem? Simplificando minhas reflexões, a fim de deixar nosso diálogo continuar em outras oportunidades, pergunto: o que une esses tipos senão o trajeto que percorrem?

Claro que cada um escolhe suas vias de existência social, mas confesso minha fascinação pelas histórias, olhares e expressões daqueles que viajam em profundidade, buscando o cotidiano bruto do lugar que visitam. Este é o que de mais real pode existir.

Os imigrantes também me despertam curiosidade, uma vez que, mesmo tendo imigrado por razões distintas, têm em comum a possibilidade de reinventar sua cultura, incorporar o que acharem que devem ou adormecer o que não parece interessante ao contexto. Além disso, são agentes em ativo potencial de mudança de sua própria trajetória, em uma escala de intensidade, diria, quase que máxima.

Mas o peregrino, ah! O peregrino é aquele que tem compromisso com a experiência conjunta, consigo e com o outro. Ele se movimenta, viaja, para acrescentar e dividir. E, muito importante, ele acolhe o “ser viajante” e o “ser imigrante”. É aquele que se arrisca, pois conhece bem suas habilidades de adaptação, além de seu olhar ser bastante apurado para reconhecer possibilidades. Talvez este, sim, esteja em equilíbrio entre a ex-tensão e a in-tensão. Ele tem projetos e propósitos, e não são em todo diários nem eternos. São temporais, sazonais. O peregrino reconhece que durante o percurso as perguntas podem mudar e tudo sempre pode se refazer, reconfigurar-se.

Então chega o momento de voltar pra casa. E, como peregrino, você mais uma vez adapta o seu ser e seu olhar, reconhece mais do que nunca o “ser peregrino de si” e busca entender no outro, que antes parecia tão comum, diferenças e outros aprendizados. Mais uma vez o equilíbrio, mas na primeira terra que você chamou de sua, no primeiro lugar que você chamou de seu.

Até o próximo destino.

--

--

Gabriella

A storyteller. Here, what I’ve done and I’ve been doing to get beyond. Instagram— @gabrifisan