Design thinking: o caminho da inovação

Inovação em Jornalismo
Futuro do Jornalismo
6 min readNov 8, 2016

Abordagem pode modificar processos organizacionais, além de impulsionar novas formas de ensino e empreendedorismo na área jornalística

Jonas Gonçalves

Etapas da abordagem Design Thinking — Reprodução/ d.school, Stanford University

“Design Thinking” é um processo colaborativo que visa utilizar a sensibilidade e a técnica criativa para suprir as necessidades das pessoas não só com o que é tecnicamente visível, mas com uma estratégia viável de negócios. É uma abordagem centrada no aspecto humano, destinada a resolver problemas e ajudar pessoas e organizações a serem inovadoras e criativas.

Muitas das empresas jornalísticas criadas no século XX já deram lugar a organizações multimídia produtoras de múltiplos conteúdos no século XXI. A ampla reconfiguração que as diversificou seguiu diferentes caminhos, pavimentados a partir das especificidades e limitações de cada uma. No entanto, todas necessitaram, em maior ou menor grau, de um envolvimento daqueles que as integram. Esse é o ponto de partida para a abordagem denominada “design thinking”, que já influenciou empresas dos mais diferentes segmentos pelo mundo (como Apple e P&G) e que, aos poucos, também está sendo adotada no jornalismo.

Desenvolvido por David Kelley (fundador em 1991 da consultoria de design e inovação IDEO e do Instituto de Design da Stanford University em 2005) e popularizado no livro “Design Thinking — Uma Metodologia Poderosa para Decretar o Fim das Velhas Ideias” (Editora Elsevier, 2010), escrito por Tim Brown (atual CEO da empresa), o conceito de design thinking sistematiza a compreensão de problemas e, ao mesmo tempo, a elaboração e aplicação de soluções nas seguintes fases:

1) Criar empatia ou compreender;

2) Definir;

3) Idear;

4) Prototipar;

5) Testar.

Em linhas gerais, é como uma empresa se dispõe a trilhar o “caminho da inovação”, composto por três esferas principais: inspiração (advinda dos problemas ou oportunidades que ensejam a busca por soluções); idealização (o processo de gerar, desenvolver e testar ideias); e implementação (o caminho entre a organização e o mercado).

O envolvimento dos profissionais nos diferentes níveis da organização tem como base uma “matriz mental”, dividida em duas fases: a divergente, na qual são propostas diversas possibilidades; e a convergente, onde opções são eliminadas e escolhas são feitas. Os projetos elaborados pelos “design thinkers” devem ser criativos o suficiente para serem sustentáveis, entendendo que as ideias devem ser compatíveis com o potencial oferecido pela empresa.

Na esfera jornalística, encontram-se experiências bem sucedidas no ensino e no empreendedorismo. Nos EUA, a instituição The New School, sediada em Nova York, lançou em 2014 com o apoio da Knight Foundation o programa Journalism + Design, que coloca o design como “um aliado natural e parte crucial da solução” para que os jornalistas se insiram e se tornem líderes na nova era da profissão, marcada pelo uso crescente de dados, aplicativos e redes de compartilhamento. Em uma entrevista que concedeu ao Nieman Lab, da Harvard University (EUA), a diretora do programa, Heather Chaplin, explicou que, para fins jornalísticos, o design pode ser pensado de duas maneiras diferentes: em termos de envolvimento de audiência e do desenvolvimento de novos produtos.

Em seu blog no Medium, a jornalista Jennifer Brandel defendeu que é possível aplicar o design thinking no jornalismo, desde que haja envolvimento direto da audiência na produção de notícias. Ela propõe uma nova relação entre as redações dos veículos e seus respectivos públicos, pela qual os jornalistas produzem as pautas a partir de questões levantadas pela audiência e, antes de publicarem as notícias, as disponibilizam para avaliações desses “leitores-participantes”, antecipando o momento do feedback da audiência em relação ao modelo tradicional, que só permite intervenções por meio de comentários nos sites jornalísticos ou nas redes sociais depois que as matérias foram publicadas. De acordo com a abordagem do design thinking, os veículos produziriam “protótipos” para serem “testados”. Como exemplo dessa proposta, Jennifer cita o site CuriousCity, que oferece aos internautas já em sua homepage três alternativas precedidas pela pergunta “O que devemos investigar agora?”.

Experiências no Brasil

A metodologia tem estimulado processos inovadores no país por meio de startups somente nos últimos anos. Na esfera do ensino, há o exemplo pioneiro da Escola Design Thinking (EDT), fundada em 2012 pela designer Juliana Proserpio e pelo administrador de empresas Ricardo Ruffo como um desdobramento do trabalho que desenvolvem na consultoria Design Echos. Ao Projeto Draft, Juliana salientou que o design thinking “é um acelerador de inovação. Um processo centrado no ser humano que resolve problemas complexos a partir de uma abordagem criativa que busca olhar uma situação por diferentes pontos de vista”. Atualmente, o interesse pelo design thinking se estende também a instituições tradicionais de ensino.

Já no mercado, um dos cases é o da Orbitalab, idealizada pela jornalista Adriana Garcia. Em uma entrevista ao Projeto Draft, ela explicou que as ações da empresa “são pensadas para ajudar na construção de ambientes inovadores que resolvam problemas complexos e encontrem soluções digitais sustentáveis que beneficiem empresas, consumidores e a sociedade como um todo. Para isso, levamos métodos utilizados pelas startups de tecnologia do Vale do Silício para dentro das universidades e das redações no Brasil. Queremos ajudar mais jornalistas a empreender, criando novos produtos com novos modelos de negócio”.

Em artigo escrito para o Webinsider, Savio Souza e Alessandra de Falco indicam o design thinking como uma ferramenta de inovação e gestão de conflitos no âmbito organizacional de empresas de comunicação. Os autores ressaltam que “o Design Thinking trabalha com a linha de pensamento que define as etapas de avaliação de uma proposta, para saber se há praticabilidade, viabilidade e desejabilidade. Ou seja perceber se é uma realidade possível, plausível de ser atingida. Se existe viabilidade financeira, se o ambiente e o mercado em que a empresa ou produto se encontra permitirão a implantação da ideia e as condições de mantê-la. É necessário ainda pensar no público que se destina a ideia, se ele necessita daquilo, se condiz com sua realidade e necessidade, se contextualizará com o ambiente em que ele se encontra e suprirá suas expectativas”.

Souza e de Falco apontam que sites com propostas alternativas aos da chamada “mídia tradicional” são mais propensos a adotar modelos de negócios inovadores e aplicar ideias que as aproximam do que preconiza o design thinking, já que “surgiram da necessidade de divulgação de produtos e pautas que na mídia convencional não tem espaço de divulgação, utilizando de aparatos tecnológicos de fácil acesso, como o smartphone. Outro olhar e outras plataformas de interação, como o uso das redes sociais são características destes movimentos e, ainda, a participação popular, a interação do público na sugestão de pauta, disseminação e divulgação dos produtos jornalísticos”.

É o caso do Canal O Sujeito, uma iniciativa voltada para projetos jornalísticos apoiada pelo site Catarse, especializado em crowdfunding e financiamento coletivo. A proposta de O Sujeito é “criar um caminho alternativo ao modelo de negócios tradicional da produção jornalística, ainda dependente de veículos editoriais para intermediar produtores de conteúdo e seus públicos. A ideia é que os leitores possam escolher o tipo de jornalismo que querem consumir e incentivar por meio de financiamento direto. Por sua vez, os jornalistas terão na plataforma uma oportunidade para viabilizar sua produção e, em última análise, viver dela, sem depender do escasso emprego formal”.

Considerações

Embora ainda não se possa dimensionar a influência do design thinking sobre o ecossistema de startups jornalísticas no Brasil, sabe-se que este conjunto de iniciativas teve um crescimento expressivo nos últimos anos, como é possível constatar no Mapa do Jornalismo Independente realizado pela Agência Pública. Nesse contexto, um dos expoentes é o Mídia NINJA (Narrativas Independentes Jornalismo e Ação), que se define em seu site como “uma rede de comunicadores que produzem e distribuem informação em movimento, agindo e comunicando. Apostamos na lógica colaborativa de criação e compartilhamento de conteúdos, característica da sociedade em rede, para realizar reportagens, documentários e investigações no Brasil e no mundo. Nossa pauta está onde a luta social e a articulação das transformações culturais, políticas, econômicas e ambientais se expressa”.

A simples existência de experimentações já denotaria, ao menos, uma inspiração nas ideias preconizadas pela metodologia. No entanto, convém ressaltar que a sustentabilidade do modelo de negócio se configura no elemento que diferencia, de fato, empreendimentos bem sucedidos das ideias que, em virtude de problemas internos e/ou externos, não logram êxito.

Referências

BRANDEL, Jennifer. Design thinking and journalism go together. Here’s how. 29 mar. 2016.

BROWN, Tim. Design thinking — Uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2010.

ELLIS, Justin. A profissão na era do “design thinking”. Observatório da Imprensa, n. 866, 02 set. 2015.

SOUZA, Savio A. e DE FALCO, Alessandra. Design thinking aplicado ao mercado de comunicação. Webinsider, 30 out. 2014.

Jonas Gonçalves é jornalista graduado pela Faculdade Cásper Líbero (2005) e aluno do Mestrado Profissional em Produção Jornalística e Mercado da ESPM-SP, na linha de pesquisa “Lógicas e Modelos de Gestão em Jornalismo”. Atualmente, trabalha na Assessoria de Comunicação do Conselho Regional de Química de São Paulo.

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Projetos desenvolvidos na disciplina “Inovação, Tecnologia e Sociedade” do Mestrado Profissional em Produção Jornalística da ESPM-SP