Rádio Grundig Satellit 2.0

Fernanda Okumoto
Futuros de Curitiba
3 min readOct 20, 2016

Amanhã, dia 22 de abril de 1971… As pessoas testemunharão meu lançamento, que promete mudar a vida de muitas pessoas. “Grundig Satellit 2.0, com tamanho confortável para carregar no bolso”. Até então o povo curitibano tinha que lidar com rádios grandes demais e não conseguiam transportá-los pelos lugares desejados, mas esses problemas estavam chegando ao seu fim.

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Hoje foi o dia do lançamento. Muitos estavam de pé logo cedo para me comprarem, algumas lojas tinham filas enormes. Fui rapidamente levado às praças e aos parques de Curitiba. Aquelas que ainda não tinham comprado ficavam admiradas, e diziam que iriam me adquirir o mais rápido possível. Ouvi muitas pessoas dizerem que duvidavam da minha praticidade, e que eu não passava de propaganda enganosa. Mas mudavam de ideia rapidamente ao me ver de verdade.

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Depois de conhecer o Parque Iguaçu e o Parque Bacacheri, além das praças da cidade, as pessoas parecem estar cada vez mais apegadas a mim. Quando não estou parado em um balcão, elas me carregam para todos os cômodos da casa, e nesses “passeios” vou dizendo às pessoas sobre as notícias mais recentes ou canto suas músicas favoritas. Só não gosto quando me levam ao banheiro e tomam banho. O vapor d’água faz com que eu me sinta meio estranho, mas me esforço para continuar fazendo meu trabalho. No final do dia, geralmente me deixam em cima do criado-mudo ou dentro de gavetas. Tem alguns que até me enrolam em uma flanelinha.

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Um tumulto aconteceu em uma das praças da cidade, pessoas queimam bandeiras com o símbolo de um rádio e uma tarja de proibição em cima dele… Aparentemente alguém fez uma denúncia contra a tal da “poluição sonora” e uma lei de proibição está em andamento. Muitas pessoas estão revoltadas e estão fazendo bagunça nas ruas. Como alguém pode estar incomodado com músicas, com notícias…? Como alguém pode estar incomodado por eu estar fazendo o que eu fui designado para fazer? E só transmito notícias e músicas das quais a população gosta ou escolhe ouvir. Isso não é justo, não estou fazendo nada de errado.

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Percebi que várias pessoas passaram a andar em grupos pelas ruas, para diminuir a quantidade de rádios por pessoa, e assim tentar minimizar esse problema da poluição sonora. Passo mais tempo dentro das gavetas, ou em cima das mesas.

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Na Gazeta do Povo do dia 22 de junho de 1971, foi anunciada minha proibição. Estive presente nos mais diversos locais, nas mãos das mais variadas pessoas — meu preço baixo permitiu, durante esses 2 meses, que milhares de pessoas pudessem ouvir em qualquer lugar, a qualquer momento, as novidades mais fresquinhas — ou aqueles que preferissem, ouvir uma música. Espero que a Grundig consiga criar fones compatíveis e reverter essa situação, para que eu possa continuar fazendo meu trabalho.

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