Envelhecer é viver

Carolina Assunção e Alves
g-old
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3 min readMar 13, 2018

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Cultivei o péssimo hábito de não gostar de ser fotografada ou de me olhar no espelho. Descobri tardiamente que tais futilidades quanto à minha aparência sempre foram sinal de falta de amor por quem eu sou. Meu incômodo com fotos e reflexos de mim seria a casquinha de uma ferida mais complexa: preciso saber me amar. Acho que muita gente possui o mesmo problema.

Tenho fios de cabelos brancos desde os 18 anos. Aprendi que deveria escondê-los, pois estavam a se exibir muito cedo. Especialmente para uma mulher, que não fica bem com esse tipo de moldura facial. Aliás, há muitas coisas “inadequadas para uma mulher”, passei a vida a ouvir isso.

Foto: Cássia Assunção

Sim, as interdições de gênero estão por aí, para todo mundo. Mas eu comecei a refletir sobre como o simples fato de ter que camuflar fios de cabelos brancos revela o quanto envelhecer é proibitivo, quando deveria ser apreciado, de certa forma.

Sabemos que o avanço da idade assusta porque nos aproxima do percurso natural rumo ao fim da vida. Porque aparecem os problemas de saúde, ficamos mais frágeis, sentimos mais medo e/ou solidão. Seria interessante ressignificar o verbo, porém, pois que estamos a envelhecer desde o nascimento, trata-se do passar do tempo, trata-se de viver.

Viver é estranho, mas é bonito.

Foto: Tereza Nery Sá

Foi o que me levou à decisão de parar de tingir meus cabelos brancos, porque percebi que o fazia por imposição sociocultural. Compreendi que isso me incentivava na bobagem de não gostar de mim.

Não estou a defender que ninguém deve pintar os cabelos grisalhos ou fazer intervenções estéticas para se sentir mais jovem ou bonita(o). Apenas proponho que possamos ficar bem dentro da nossa pele, na cabeça e no coração — e por que não diante do espelho ou da própria imagem?

Neste momento, prestes a completar 38 anos, meus fios grisalhos não me perturbam. São marcas do fluxo da minha existência. São precoces por uma questão genética que não posso controlar. E só me incomodavam pelo olhar alheio.

Mas a minha implicância com a minha embalagem, digamos, merecia conserto.

Ao pensar sobre isso, escrevi um pequeno texto. Então pedi a fotógrafos e fotógrafas com quem tenho vínculos afetivos para me ajudarem, por meio de ensaios, a transformar minhas palavras em retratos, até que os cabelos fiquem grisalhos por completo. Isso já dura há alguns meses.

Assim, numa busca muito íntima, acabou por surgir o projeto G-old. Porque durante este caminho tenho entendido que é possível executar processos criativos poéticos e estéticos sobre a arte de existir. Creio que isso pode motivar mais gente a fazer o mesmo, com o efeito de alcançar um amor interno capaz de melhorar tudo em volta, com boas repercussões mentais, afetivas e até mesmo sociais.

Arte: Aline Parada — Trilha sonora original: "Algo a mais", por Murilo Oliveira — Edição: Carolina Assunção e Alves e Samuel Andrade

Para cada pessoa que está comigo, pergunto como aquele resultado foi concebido e o que significa, para artistas, representar uma visão do movimento da vida. As respostas estarão nos ensaios que iremos publicar aqui nesta plataforma.

O texto que escrevi é este:

Arte: Aline Parada

Por sorte, compartilho essa iniciativa com uma equipe linda de criação, com as seguintes funções:

Fotografia: Alexandre de Cadoudal, Alice Leite, Cássia Assunção, Lourenço Cardoso, Marcos Paim, Tereza Nery Sá.

Trilha sonora original: Murilo Oliveira.

Arte: Aline Parada.

Edição de vídeo: Marcos Paim, Paulo Renato Souza Cunha, Samuel Andrade e eu.

Texto: Eu, Carolina Assunção e Alves.

Damos as boas-vindas e esperamos que este projeto te inspire.

Foto: Marcos Paim

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Carolina Assunção e Alves
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Jornalista, pesquisadora, Profa. Dra. em Linguística do texto e do discurso (UFMG), pós-doutorado em narrativas audiovisuais (CNRS-França).