Equilíbrio em tempos te Pandemia — relato

Gabriela Cecon
GabiCecon
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7 min readJul 27, 2020

Escrito no início de Julho de 2020.

Vou relatar para a posteridade como tem sido este momento histórico e que, acredito, mudará o mundo para sempre.

Acredito nesta mudança, porque 90% das pessoas que conheço, quando pergunto como estão, a resposta é que não estão muito bem. E isto inclui amigos, familiares, clientes, colegas de trabalho, amigos virtuais… Antigamente a resposta falsa e automática sempre era “bem e você?”, e hoje em dia passou a ser “estamos fazendo o que podemos” ou “tem sido uma montanha-russa”.

Estamos sem sair para lazer desde Março. Fazem quatro meses. Minha rotina antes era bem movimentada. A semana de trabalho era intensa. Eu usava muito o metrô para me locomover. Visitava muitos clientes, pois trabalho com TI. Tinha semana que eu terminava completamente exausta. Em Fevereiro ainda consegui energia para entrar em um projeto musical, uma vez por semana, na zona oeste de São Paulo, sendo que moro na zona leste.

A noite, visitava meu pai, ou combinava de ver alguma amiga. Uma vez por mês gostava de tirar o dia para ir à um restaurante bom sozinha no meu ritual de solitude. Pedia um drink e escolhia o que quisesse do menu vegetariano extremamente limitado. Em semanas muito corridas, fazia as unhas no shopping, porque não precisava agendar.

Uma ou duas vezes por mês, conseguia agendar de ver uma cabine de imprensa de algum filme para meus projetos geek na internet. E quando não assistia na cabine, certamente ia no cinema.

Outro ritual que também iniciei no começo do ano foi ter meu dia de solitude no cinema. Ir para a Rua Augusta, entrar no cinema Itaú (um cinema de rua) e escolher a próxima sessão de algum filme que ainda não tenha visto, seja ele qual fosse. O random dava uma ansiedade incrível.

Algumas vezes caminhava na Av. Paulista com alguém de domingo, outras, fazia caminhada no Parque Piqueri, aqui em São Paulo.

Visitava minha mãe e meus avós em Vinhedo duas vezes por mês. Ia e voltava de ônibus.

Eu conto tudo isso e fico tão nostálgica… Parece que foi há uma vida atrás. Mas só se passaram alguns meses. Dizem que um hábito se forma a partir de três semanas. Talvez o hábito de se sentir melancólico se instaurou de vez durante esta quarentena.

No início da pandemia ficamos todos assustados e reclusos em casa. E como demorou mais do que uma semana, o lazer foi ter de ficar em casa com minha gata, pedir algo no ifood, fazer videoconferência com algum amigo bebendo algo, me maquiar e tirar fotos e até nudes. A autoestima ficou tão baixa, que fazer nudes ajudou a manter-me inspirada. Pena não poder divulgar, hehe.

Tive tantas ideias neste período… Tentei retomar meu canal no youtube, tentei pensar em projetos de software para minha empresa, tentei fazer cursos para aprender alguma coisa e tentei me exercitar. Mas tudo foi em vão. Não consegui emplacar nada. Absolutamente nada.

Isto me deixou mais triste e deprimida ainda. Aí veio a segunda onda.

Começamos a estudar e nos politizar sobre tudo o que acontecia no Brasil e no mundo. Entender todos os aspectos da doença, prevenção e medidas públicas, virou um vício. Talvez ficamos assim tão frenéticos por querer muito uma notícia que falaria da vacina. Que falaria quando tudo isso terminaria. Isso foi um problema sério, porque o mundo já é ansioso demais nesta geração, e o maior medo de uma pessoa ansiosa, é ter medo daquilo que se desconhece. Não saber quando a quarentena acabará, e se teremos nossa vida de volta nos deixou aflitos. A pandemia gerou uma ansiedade crônica generalizada em todo mundo.

Algumas pessoas lidam bem com a ansiedade, já outras… Nem tanto.

Este consumo desacerbado por notícias aqueceu mais ainda os debates políticos. Se a polarização, antes, já era problemática e causava transtornos em relações sociais, agora, começou a ameaçar vidas. Os fanáticos políticos de direita começaram a negar que o vírus era perigoso e desdenhar dos métodos de prevenção, e outros grupos políticos mistos, porém, anti-bolsonaristas, começaram a exagerar em suas projeções de dados estatísticos, deixando toda uma população em pânico. Ver o William Bonner no Jornal Nacional, pedido para todos respirarem, foi um dia em que ninguém mais aguentava ver a tragédia, que ainda estava 5% da sua capacidade, acontecendo.

Hoje temos mais de 2 milhões de pessoas infectadas e mais de 80 mil mortes.

O problema do hábito é que ele faz agirmos no piloto automático. Nos dois primeiros meses, vimos tanto sensacionalismo sobre a cobertura do covid19 (ainda não sei julgar se foi necessário ou não), que saber que hoje morreram 700 pessoas no Brasil, é só mais um dia triste e melancólico como todos os outros.

E já que todos nos acostumamos com isto, então a necessidade por retomar a vida aos poucos começa a surgir, mesmo tendo julgamento por todos os lados. Algumas pessoas estão tendo todo o cuidado possível, que não garante muita coisa, para retomar suas vidas e seu trabalho. Outras estão cagando pra isso.

E os índices aqui em São Paulo, só crescem, mas a flexibilização está cada vez maior, e isto nos deixa confusos. Estamos exaustos de defender o lado do isolamento social para salvar vidas enquanto vemos tanta gente falir e perder o emprego. Dói muito defender um lado em detrimento de outro. Estamos exaustos de explicar que precisa de base científica para usar a cloroquina e de repente a OMS volta atrás. e de novos artigos pseudocientíficos surgirem e teorias da conspiração dominarem a mente das pessoas deixando discussões mais calorosas. Já não temos forças, e temos que lidar com esse estresse constantemente.

Um dos meus maiores picos de estresse e certo descontrole emocional foi quando perdi meu amigo Leandro para o novo coronavírus. No dia seguinte da notícia, o Bolsonaro fez um vídeo fazendo PIADA com o fato da “esquerda” ser contra o uso da cloroquina. “A direita usa cloroquina e a esquerda tubaína…(sic)”. Cheguei a desabafar no Facebook (é, eu sei…) sobre tamanha insensibilidade, diante da dor de milhares de famílias e amigos de vítimas. E teve gente que ignorou totalmente minha dor para defender o presidente e me questionar sobre a declaração do Lula (?)…

Acabei fazendo vídeos “falando um monte”, o que gerou discussões que não levaram a quase nada. O “quase” foi porque pelo menos uma pessoa me chamou no privado e pediu ajuda sobre algumas questões que tinha muitas dúvidas. Eu consegui ter uma boa conversa com ele.

Eu não imaginava que iria sentir tanto a perda deste amigo. Eu não o via pessoalmente desde 2014. Porém, em 2019, nos tornamos próximos via Whats app. Nos abríamos muito. Muitos áudios longos e desabafos da alma. Farei em breve um texto sobre no futuro.

Meus esforços por ser fitness na quarentena resultaram em dores no joelho. Fui ao médico e descobri que estou com condropatia, nível 4. Isso significa que minha cartilagem gastou pra caramba e devo fortalecer os músculos da perna para não agravar mais o problema, sendo eu, uma forte candidata à prótese de joelho aos 65 anos, segundo a médica, que na opinião de muitos, foi pessimista.

Estou fazendo fisioterapia. E este processo doloroso e que exige muita disciplina tem me feito refletir muito sobre tudo o que estou vivendo nesse período de quarentena.

No início da quarentena eu queria muito não ficar mal. Eu queria muito me ocupar e usar o tempo de isolamento social para realizar tudo o que antes não conseguia por causa de falta de tempo, como citei anteriormente. Com o joelho doendo, antes do diagnóstico, queria sair correndo, andar de bicicleta, entre outras atividades. Queria me inscrever na primeira corrida que abrisse pós pandemia. Queria voltar a fazer lutas. Queria o abdômen sarado.

Mas com a fisioterapia, eu simplesmente entendi que muitas atividades eu não poderei nunca mais fazer, e que outras, poderá levar um tempo, com dedicação para conseguir realizar.

Enquanto o joelho dói, não há muito o que fazer. Na sessão de fisio, ela joga ultrassom, laser e choque. E ainda tenho que alongar e fazer exercícios localizados.

Acho que pra ficar bem nesses tempos sombrios, tem sido muito parecido. Tem coisas que nunca mais serão as mesmas no mundo, e outras que vão demorar muito para acontecer. Ainda dói no mundo, mas com tempo e dedicação, tudo pode melhorar.

E não adianta esperar resultado em um dia ou uma semana. Os resultados vêm a partir de muitas sessões… E são resultados pequenos. Mas uma hora a fisioterapia acaba, e a responsabilidade de continuar se fortalecendo para não deixar o quadro regredir, é nossa.

Além de cuidar do meu joelho, decidi cuidar da minha mente também. Voltei a fazer terapia e tenho me dedicado a entender os gatilhos dos meus maus momentos. No início achava que não estava fazendo nada, mas quatro meses depois, percebi que estou me dedicando para mim mesma. Feito, que nunca parei para fazer antes. E fazer isto está começando a refletir em todas as outras áreas da minha vida. Mas não é de um dia para o outro, e nem em uma semana.

E você? O que tem feito por si mesmo?

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Gabriela Cecon
GabiCecon

Especialista em cultura geek, empresária, design thinker e sonhadora.