Joe Hart: a humildade de um multicampeão que chega ao Tottenham

Lucas Colenghi
Galo de Kalsa
Published in
4 min readAug 19, 2020

“Eu sinto que estou começando de novo e eu gosto bastante deste sentimento. Meu corpo está pronto para começar de novo. Tenho trabalhado duro. Tenho tentado crescer como pessoa e jogador.”

Esta foi uma das frases que as redes oficiais do Tottenham destacaram da entrevista de apresentação de Joe Hart como novo goleiro do clube. Agora com 33 anos, o experiente goleiro chega para acrescentar muito ao Tottenham.

Não se assuste com isso. Todos sabem que ele não está mais em seu auge, mas o mais importante é: o próprio Joe Hart também sabe. No entanto, o foco não é dentro das quatro linhas, mas fora delas.

“Se meu nome está entre os relacionados ou não, isto é uma questão de esforço coletivo e eu sei o que é preciso para ganhar títulos.”

É com essa mentalidade, evidente em mais um recorte de sua entrevista de apresentação, que o multicampeão chega ao clube. Ele chega com toda humildade possível. Humildade que se desenvolveu a partir de dificuldades que chegaram já bem adiante em sua carreira.

Hart não foi um goleiro que surgiu aos 19 anos como destaque. Nesta idade, ele havia acabado de chegar ao Manchester City e só assumiu a titularidade do gol dos Cityzens, após quatro anos e alguns empréstimos, com destaque para a passagem pelo Birmingham City em 2009–10.

Em uma era de contratações milionárias, foi a cria do Shrewsbury Town, aquele que estava no clube desde 2006, que assumiu a vaga em uma equipe que começava a se tornar estelar com a chegada de seus novos donos.

No entanto, a queda veio em 2016–17. Pep Guardiola chegou ao City e chutou Joe Hart de lá. Queria um goleiro que jogasse bem com os pés. Guardiola ignorou 2 taças da Premier League, 1 da Copa da Inglaterra e 2 da Copa da Liga, para poder ter Claudio Bravo como seu titular.

Hart poderia ter se abalado, mas resolveu se aventurar. Acertou por empréstimo com o Torino para a disputa daquela mesma temporada e foi titular na Itália. Só que este foi seu último ano como titular de um clube. West Ham e Burnley vieram em seguida e ele acabou sendo reserva em ambos os clubes.

E aqui no Tottenham? Será reserva também. Hart não chega para disputar a titularidade com Hugo Lloris, nosso capitão. Ele chega para acrescentar outras características ao atual grupo de jogadores.

“Estou aqui para ajudar a equipe da forma que puder, seja em campo, fora do campo, estou aqui para tentar e levar o clube adiante.”

Como eu já disse: humildade. Joe Hart sabe bem que não está mais no ápice de sua carreira, mas ele resolveu participar do projeto. Vem para ganhar, inclusive, menos do que o glorioso Michel Vorm ganhava. Segundo apuração da mídia inglesa, ele deverá receber 27 mil libras semanais.

Não me levem a mal. Não quero dizer que vamos ganhar títulos só por contratar jogadores que já foram campeões e resolveram fazer autoanálise de suas carreiras. A qualidade técnica segue sendo o mais importante. Contudo, os fracassos recentes do Tottenham — aliás, nossos fracassos em busca das glórias desde 2008 — ocorreram apenas por questões técnicas?

Acredito que não. Mas tente se lembrar de momentos em que deixamos de ser campeões por demonstrar arrogância. Tenho certeza que qualquer um que estiver lendo este texto será capaz de lembrar de, pelo menos, uma ocasião em que isso ocorreu. Ninguém aqui é louco de falar que o time que apresentava um grande futebol na média dos últimos 5 anos não merecia ter beliscado uma tacinha que fosse.

O Tottenham, por vezes, foi pedante dentro de campo. A troco de quê? Qual a razão pra isso? Será que os jogadores se achavam neste direito “só” por jogarem bem? Não sei. Poderíamos discutir infinitamente esta questão. Mas o que sei é que falta algo ao grupo atual de jogadores que vestem a camisa lillywhite.

Este algo é subjetivo a cada um, mas acho que a resposta pode estar em Joe Hart. A capacidade que ele, multicampeão, teve de entender seu papel no futebol e enxergar no Tottenham um lugar em que pudesse ser útil, me dão a esperança que tanto me faltou na última temporada.

Há muito a melhorar, mas Hart veio para combater problemas antigos de mentalidade no elenco. Mais do que disputar quem será o suplente imediato de Lloris com Gazzaniga, ele veio para somar, do jeito que for possível.

Talvez não haja time melhor para Joe Hart e não haja goleiro reserva melhor para o Tottenham neste momento. Talvez eu fique animado demais com entrevistas de recém-chegados quando elas são bem fundamentadas. Talvez vocês é que estejam desanimados demais. Ou talvez Joe Hart não seja o herói que queríamos, mas seja o herói que, humildemente, precisamos.

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Lucas Colenghi
Galo de Kalsa

Professor em aprendizado. Escritor frustrado. Torcedor corneteiro.