Melhor o final, melhor assim

Vinícius Nascimento
Galo de Kalsa
Published in
3 min readJan 31, 2022

Eu sei guardar a minha dor

E apesar de tanto amor,

vai ser melhor assim

Paixão e amor são sentimentos distintos entre si, mas que se equivalem tanto a ponto de até se confundirem entre um e outro — isso acontece com certa frequência. Corações bobos e carentes costumam sofrer ainda mais com essa potente mistura. A paixão é algo mais potente, meteórico e imediato. Tão forte que costumeiramente pode nos dar a sensação de que é preciso somente sentir aquilo para se sentir completo. O amor é um pouco mais chato e talvez mais complexo. Talvez seja até potencialmente tão perigoso quanto a paixão porque demanda uma série de fatores no seu entorno para que seja saudável.

A paixão pode simplesmente ser meteórica e sumir de forma tão rápida e intensa quanto surgiu. O amor, pelo menos pra mim, é algo que não some de uma hora pra outra. Ambos são potencialmente lindos e potencialmente destrutivos. No Tottenham, Dele Alli foi amor e paixão. Meteórico, incrível e saído do nada como uma paixão avassaladora, que, convenhamos, virou amor. Mas as linhas supracitadas alertaram: só o amor não basta, nem enche barriga.

Dele achou que era suficiente por si próprio e esqueceu que para as boas relações funcionarem — principalmente as duradouras -, não basta apenas estar ali. É preciso ralar, exige sacrifício, não só fazer oração — como versou Hot numa das músicas sobre relacionamento que mais faz sentido nessa história entre o clube e o talento mais bonito que meus olhos já viram surgir.

O Tottenham tirou a mão de Dele Alli e quis soltá-lo para não se machucar. Os dois se prometeram o mundo em algum momento e, adivinha: não se presentearam assim. A saída de Dele era algo necessário há algum tempo e o fato dele deixar o clube com uma espécie de test-drive rumo ao novo pretendente mostra muito da necessidade de abrir a mão para que as coisas fiquem melhores para todo o mundo. Já passou da hora de seguir em frente.

Isso não significa que toda a história escrita pelo camisa 20 deva simplesmente ser jogada no lixo. Dele fez muito: derrubou tabus históricos como os gols em Stamford Bridge para ganhar um jogo lá após mais de duas décadas; deixou Sergio Ramos e Casemiro no chão em Wembley antes de mandar Navas buscar a bola no fundo das redes. Fez mágica contra o Palace quando o relógio e o jogo se encaminhavam para um empate desgostoso em Londres. Mesmo já vivendo seus dias de baixa e preguiça, tinha talento o suficiente para abrir um espaço no meio da zaga do Ajax e enfiar a bola com espaço suficiente para Lucas transformar real o milagre em Amsterdam.

O fim da passagem do ainda jovem inglês pelo clube (que poderia ter acontecido em pelo menos outras três oportunidades e tendo três clubes gigantes como destino) acabou fazendo jus ao resto da história. Dele deixa um sabor amargo de potencial inexplorado indo embora a preço de banana (a princípio), mas compensa em doçura pela certeza de que um novo ambiente pode fazê-lo voltar a sorrir e acenar como fazia outrora; e é só isso que todas as partes envolvidas querem ver.

*com colaboração de Pedro Reinert

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