Pode rir do Arsenal, mas com cautela

Quem pode passar tanta vergonha quanto eles… somos nós

Pedro Reinert
Galo de Kalsa
4 min readSep 16, 2019

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A derrocada dos falsos nortistas no domingo foi bonita de se ver. Pelo jeito que se deu, a aceitação do empate tardio em Watford pôde fazer rir desinibidamente. Porque — você viu — não foi como se o grande tivesse agredido o pequeno só para acabar dilacerado por um golpe fortuito e fatal; o Arsenal foi escangalhado pelo lanterna do campeonato durante noventa minutos e, no fim, cedeu um brinde à justiça através do penal cometido por David Luiz.

Como rivais, nas horas em que a tristeza ensaiar aparecer nessa semana (e, com sorte, nas próximas), temos o dever de lembrar da cena em que Guendouzi mostra o placar parcial para a torcida da casa com a arrogância errônea e ingênua de quem pouco sabe como é esporte que pratica. Mais do que isso, pensar que Emery evitou reforçar a defesa para desembolsar sei lá quantos milhões no Marcelo Cirino com vidros elétricos é um exercício cada vez mais refrescante pra nossa mente maltratada.

Acontece que apontar o dedo é gostoso por agora, mas se tem outro time do top 6 que pode reeditar a esculhambação dos gunners, esse time é o Tottenham. E não digo isso pela natural capacidade que esse time tem de ser humilhado, pela cultura spursy ou por uma eventual superioridade técnica de outras equipes. Digo isso porque as estatísticas me assombram e me fazem rir do Arsenal com certa cautela.

O clube do norte pero no mucho sofreu VINTE E TRÊS finalizações do lanterna do campeonato no domingo

O retorno de Aurier ao time titular no último sábado foi um alívio imensurável pra quem sentiu diferentes tons de desespero a cada ataque adversário nas rodadas anteriores. O marfinense tragou com excelência a conversa que teve com Pochettino depois das declarações polêmicas que deu no meio da semana e fez uma de suas melhores partidas desde que chegou em Londres.

Da mesma forma, a reunião de Alderweireld e Vertonghen silenciou dúvidas e receios que vinham nos tirando unhas e mais unhas a cada rodada. Depois das medonhas atuações de Sánchez, cada combate no miolo da zaga no sábado foi um afago, daqueles que sussurram que logo vai ficar tudo bem.

Mesmo assim, depois de cinco rodadas, o Tottenham é o terceiro time que mais sofreu finalizações na Premier League. Enquanto o Arsenal foi atacado 96 vezes desde a partida de abertura, nós tivemos só 14 chutes arriscados contra nossa meta a menos que o bobo da corte do campeonato (82 no total). Norwich (91), Aston Villa (77) e Bournemouth (76) inteiram o ranking. Em média, portanto, a equipe de Pochettino encara 16 chutes por jogo. E pensando num clube integrante do Top 6, bem, é chute pra caralho.

Há outras duas estatísticas que chegam vestidas de boa notícia, mas falam alto sobre a instabilidade defensiva da equipe: Hugo Lloris é o goleiro que mais fez defesas nesta temporada (25) e tem a taxa mais alta de sucesso em defesas (80,6%) na Premier League. Ou seja, se não fosse o arqueiro campeão da última Copa do Mundo, o Tottenham certamente estaria se debatendo na parte de baixo da tabela.

Walker-Peters é bom de bola, mas já é mais velho que Alexander-Arnold, Wan Bissaka, Firpo e Militão. Passou da hora de entender que o garoto não deve se tornar titular de um time de ponta

Mais chutes estão passando pela nossa barricada agora do que nas últimas temporadas, e nada disso é coincidência. Walker-Peters não foi mal quando foi exigido, mas talvez a nota 6 seja seu limite; Alderweireld começou a campanha parecendo mais pesado, não era possível contar com Aurier até outro dia e, como já supracitado, Dao não fez uma partida decente até agora. Mais adiante, Ndombele também esteve afastado e Winks, sozinho, não deu conta do recado defensivamente.

Pochettino ainda não achou a escalação ideal para reproduzir o sistema defensivo sólido que nos fez chegar tão longe nos últimos anos e, dessa vez, parece estar com mais dificuldades em fazê-lo. Afinal, Wanyama não voltará a ser o colosso que foi em 2017, Dier já virou carta fora do baralho nesta altura do campeonato e nunca mais haverá outro Dembélé.

O plantel atual, porém, tem tudo o que é necessário para reinventar a forma do Tottenham se defender com a mesma maestria de outrora; é só uma questão de tempo. Problema é que, até lá, vale a pena conter o riso ao olhar para o rival — ainda é bem possível que nos prestemos a esse papel.

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