A trajetória de Sissoko pode inspirar o Tottenham a dias melhores

Vinícius Nascimento
Galo de Kalsa
Published in
4 min readSep 30, 2019

O volante precisou se reinventar, baixar a bola para se tornar um pilar da equipe

É normal existir estranhamento rodeando a renovação de vínculo entre Moussa Sissoko e Tottenham. A relação do volante francês com o clube tem nuances estranhas, como aquele relacionamento meio duvidoso vivido por um amigo próximo, que à primeira impressão você não gosta do CONJE, acha meio desleixado para com sua pessoa querida, até já chegou a aconselhar um término, viu seu amigo dar um gelo na pessoa e do nada percebe que a relação está fluindo. Essa analogia um tanto quanto randômica serve bem para explicar.

Sissoko e Tottenham viveram altos e baixos muito devido à postura do francês em seus primeiros passos em Hotspur Way. O combo formado pela ótima Eurocopa que disputou em 2016 e o rebaixamento de seu ex-clube, o Newcastle, dava como certa a mudança de clube àquela altura. Talvez Sissoko se ame muito, o que seria admirável, ou se deixou admirar pelos bons dias vividos em seu país durante o torneio continental.

Com a abertura da janela, o próprio volante tratou de tentar se vender para o Real Madrid, só para se ter uma noção. Também deu um perdido no Everton e àquela altura já tentara cavar uma vaguinha no Arsenal, a quem classificou como o clube de seu coração, chegando a exibir uma camisa dos falsos nortistas compondo o seu guarda-roupas.

“The club of my heart”, disse Moussa

No final das contas, quem desembolsou os 30 milhões de libras foi o Tottenham e aparentemente Sissoko se achava um tanto quanto superior ao clube.

Não é novidade que o futebol de Sissoko depende de seu poderio físico. A força é seu grande diferencial e nas duas primeiras temporadas em Londres, ele pouco parecia interessado em demonstrá-la.

O resultado óbvio disso era amargurar o banco de reservas e se tornar uma peça de rotação nas Copas. Jogadores da base como Harry Winks ganharam mais espaço e ultrapassaram o francês na hierarquia do meio-campo — algo tranquilamente justificável. Sejamos honestos: era doloroso saber que Sissoko entraria em campo.

As primeiras duas temporadas de Sissoko foram sofríveis

Sem espaço no clube e com uma geração promissora no setor, Didier Deschamps escanteiou seu antigo pilar, que sequer foi convocado para a Copa da Rússia, onde os franceses foram bicampeões do mundo. Certamente, foi um duro golpe para o camisa 17. Ele precisava lidar com isso de alguma forma. Baixar a bola e diminuir a marra foi a solução.

Na última temporada as coisas mudaram. É bem verdade que as chances que Pochettino ofereceu a Sissoko decorreram mais da escassez no elenco, que ficou ainda mais carente de peças com a saída de Dembelé e sucessivas lesões de Wanyama (RIP).

Ninguém foi contratado, o jeito, portanto, era promover alguém da base (alô, Skipp) e usar quem já estava por aqui. Sissoko soube passar uma borracha em sua própria sina, mudou completamente sua postura e se tornou, enfim, uma peça indispensável.

Como esquecer a tragédia anunciada que se desenhava em New White Hart Lane no jogo de ida contra o Ajax? O time já havia passado por maus bocados contra o City na mesma Champions League após o francês deixar o campo com lesão na coxa. Foi para o banco contra os holandeses no sacrifício e se viu obrigado a entrar no jogo por conta da lesão de Vertonghen. Mesmo baqueado, conseguiu dominar o meio-campo e simplesmente anular a sufocante pressão que os Godenzonen impuseram no primeiro tempo.

A imposição física que levou o Tottenham à Liga dos Campeões passou pelo crescimento de Sissoko

Foi graças a Sissoko que o time foi até Amsterdam precisando reverter apenas o placar mínimo. Ele possibilitou o gigantismo de Lucas Moura, a dividida de Llorente, o -hoje raro- acerto de Alli e a consequente classificação heroica.

O pênalti duvidoso na final contra o Liverpool foram apenas um acidente de percurso. O fato é que até os dias de hoje, Sissoko segue fundamental aos Spurs. A renovação de contrato até 2023 é uma premiação justa para um jogador que precisou se reinventar.

A superação de Moussa Sissoko pode servir de inspiração para um elenco que vem sofrendo alguns baques nesse início de temporada frustrante. Enquanto Eriksen faz questão de não esconder a frustração por ter permanecido (sequer recebeu propostas), Dele Alli parece mais preocupado com sua carta no UT do Fifa do que em jogar bola. Precisam segurar um pouco a onda. Sissoko tem algumas coisas para ensinar.

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