Torcer por você é incrível, Sonny

Vinícius Nascimento
Galo de Kalsa
Published in
4 min readOct 31, 2019

Numa das raras tardes que passei na casa de meu pai desde que me mudei, em 2014, vi na programação da ESPN Brasil que o jogo entre Watford x Tottenham seria transmitido. Parei para assistir.

Lamela abriu o placar no começo do primeiro tempo, mas o final daquela etapa não foi tão generosa quanto seus primeiros minutos: Ighalo, àquela altura brigando pela artilharia do campeonato, fez uma jogadaça e empatou antes da arbitragem encerrar os primeiros 45 minutos.

O segundo tempo foi uma murrinha desgraçada. A expulsão de Nathan Aké parecia um bom presságio, mas se tornou o começo de um inferno imposto pelo time de amarelo no Vicarage Road.

Lloris impediu um gol olímpico de Watson aos 43' do segundo tempo e o Tottenham puxou contra-ataque. Trippier cruzou, Gomes socou para a linha de fundo, mas o inglês foi persistente, não deixou sair e cruzou novamente para um raio vestido com a camisa 7 atravessar a zaga e chegar pulando para marcar de letra o gol que deu os três pontos para o Tottenham.

Na saída do campo, Son foi breve ao descrever o que acabara de viver: “Foi uma atmosfera louca e um gol muito importante para a equipe. Estamos muito felizes”.

Felicidade parece o estado natural do sul-coreano que não tem a menor vergonha de mostrar os próprios sentimentos. Em momentos tão complicados como o que vivemos neste exato instante, o sorriso de Heung-Min Son aparece com frequência nos feeds de Instagram e Twitter como um alento. Não, mais do que isso. É um presságio de esperança de que existem dias melhores.

Pense bem e responda rápido: quem no mundo joga bola com tanta felicidade?

Aqui no Galo de Kalsa, Pedro Reinert já tinha rabiscado as seguintes palavras para justificar a participação de Heung-Min Son entre os melhores do Tottenham na década:

Rob Hawthorne, narrador da Sky Sports, uma vez comentou: ‘Desde Ronaldinho eu não via um atleta iluminar todo um estádio com sua aura alegre como Son faz’. Achei exagerado no momento. Deixei passar. Mas foi assim, misturando tenacidade, habilidade e carisma fora do padrão (pra não falar da extravagante ambidestria), o sul-coreano conquistou meu carinho e o de quem sequer apoia o time que ele defende — você sabe, o mundo todo comemorou sua epopeia particular nos Jogos Asiáticos. Com um estilo de jogo tão lúdico quanto ameaçador, Sonny contempla quem preza pelo futebol competitivo, pelo gol decisivo, pela tenacidade impetuosa, e quem assiste pela estética, pela diversão, pelo circo. Bem como Ronaldinho costumava fazer.”

A alegria de Sonny está longe de ser algo forçado. Como dito, o atacante não tem o menor pudor para exibir suas emoções. Como esquecer o desespero dele após a eliminação contra a Juventus numa noite em que ele fez tudo, mas o time insistiu em não segui-lo?

Os choros de tristeza e alegria na Copa do Mundo de 2018 são outro exemplo fantástico. Quando viu seu país ser eliminado na segunda rodada, desatou a chorar. Foda-se que a Coreia do Sul era a equipe mais fraca no grupo que tinha Alemanha, México e Suécia. Son não entra em campo para perder. Muito pelo contrário, busca com ares de desespero qualquer oportunidade para se transformar em relâmpago no meio de defesas que se tornam… indefesas perante a sua gana de colocar a bola no fundo do gol.

Foto: EFE/EPA/YONHAP

Entre o choro da decepção e a alegria por jogar a última pá de terra sobre o caixão da Alemanha, então atual campeã mundial, se completam de uma forma que não dá para descrever de outra forma exceto… verdadeira.

Heung-Min Son é verdadeiro. Contra o Liverpool, completou 200 jogos pelo Tottenham. Os 72 gols marcados e os milhares de quilômetros corridos não dão conta de explicar a importância do atacante para a história do clube. Sequer o seu gigantismo pessoal que nos conduziu a momentos de glória (alô, City!) conseguem explicar o que é esse rapaz.

O sorriso de Sonny naquela tarde de uma sexta-feira 13, contra o Watford, espantou qualquer demônio, iluminou a escuridão que se tornaria morada para qualquer medo. Valeu a minha torcida e sei que vale pelo menos o carinho de tanta gente pelo mundo. Quem não ficou feliz ao saber da medalha nos Jogos Asiáticos, que podiam tirá-lo do futebol profissional por dois anos?

O mundo se rendeu ao seu sorriso por vários motivos. Vê-lo em campo é bom porque ele sempre está disposto a ganhar. E porque, se ganhar, o mundo será premiado com a felicidade que ele faz questão de dividir. Torcer por você é algo incrível, Sonny. Que bom que está por aqui.

Talvez este seja o texto com mais imagens da história do site. Mas não faz o menor sentido saber o que esse jogador representa sem mostrar a característica que o faz tão único. Muitos jogadores são rápidos, outros tantos são habilidosos, milhares finalizam com maestria usando qualquer uma das pernas, há, ainda, um punhado daqueles que reúnem todas essas características. Mas com a alegria de Heung-Min Son, ouso a dizer que não há ninguém capaz

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