Contaminante Ambiental: Mercúrio

Giulia Resta
geologicalthings
7 min readMay 24, 2021

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O mercúrio é uma neurotoxina poderosa. Uma vez emitido, o mercúrio pode viajar grandes distâncias pela atmosfera, causando contaminação global de ecossistemas, peixes, pássaros, mamíferos e da cadeia alimentar humana. Em todo o mundo, o consumo de frutos do mar contaminados com mercúrio expõe as pessoas em risco de intoxicação por mercúrio (UNEP, 2012). As exposições locais em comunidades de mineração que usam mercúrio podem ser ainda mais graves.

Características físico-químicas do mercúrio:

De acordo com (Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007), o mercúrio possui baixa abundância na crusta terrestre (0,02–0,09 mg/kg). O mercúrio forma compostos cujos estados de oxidação não são superiores a +2 e facilmente formam ligações entre metais. O mercúrio habitualmente se concentra em sedimentos argilosos e no carvão. O minério principal do mercúrio é o cinábrio (HgS) (fig. 1) que já foi utilizado como cosmético por povos antigos. Há muitos outros minerais de mercúrio, sendo a maioria meramente compostos simples sem grande importância. O mercúrio pode ocorrer em rochas na forma de óxidos, sulfuretos, sais, halogenetos, complexos inorgânicos e metal nativo. Os minerais que hospedam o mercúrio são as anfíbolas, esfena, blenda e outros sulfetos. O mercúrio pode evaporar de outros compostos e libertar-se nos ecossistemas.

Fig. 1. Cinábrio (Mindat).

O mercúrio existe em vários estados como inorgânico, orgânico, líquido, gasoso, vapor e sal. É um calcófilo (baixa afinidade com oxigênio e preferencialmente forma sulfuretos). Os sais de mercúrio (HgCl2) são solúveis na água, enquanto os Me-mercúrio (metilado) não são solúveis e nem reagem com ácidos e bases fracos devido a baixa afinidade do mercúrio com o oxigénio. O mercúrio pode ser encontrado com várias formas, tais como, Hg0, HgCl2, HgO, HgS, CH3HgCl e (CH3)2Hg.
Na amálgama do ouro, parte do mercúrio não combinada com o ouro é perdida para o ambiente, como também a parcela amalgamada durante o processo de queima desta liga para purificar o ouro (Caheté, 2016).

Fig. 2. Como o mercúrio é usado para “capturar” ouro (UNEP, 2012).

Amalgama — quando o mercúrio é colocado em contacto com partículas de ouro em sedimentos ou minério triturado, ele forma “amálgama” — uma mistura macia de aproximadamente 50% de mercúrio e 50% de ouro. Para recuperar o ouro do amálgama, ele é aquecido para evaporar o mercúrio, deixando o ouro para trás. O mercúrio é liberado no ar, na água e no solo em várias etapas desse processo.

Consequências

As emissões de mercúrio no ambiente podem ter sérios efeitos na saúde humana. É considerada preocupante a contaminação em mercúrio nos peixes e em animais selvagens que por sua vez contaminam o Homem através da cadeia alimentar. A Lei Federal dos EUA sobre o Ar Limpo (1963), considera o mercúrio como um dos elementos traço que são poluentes no ar, devido a sua toxicidade, disponibilidade e o seu potencial de bioacumulação nos ecossistemas. O aumento da quantidade de mercúrio no ambiente deve-se ao seu uso nas minas de ouro ao ser utilizado no processo de amalgamento. A sua utilização apresenta uma ameaça na Amazónia e na Sibéria. Devido a toxicidade do mercúrio (1/-100 mg/Kg dependendo do tipo), a sua produção e uso foi restrito em muitos países. Contudo, algumas indústrias na Europa ainda utilizam métodos de recuperação e armazenamento de mercúrio (Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007).

Produtos

O mercúrio é utilizado na produção de soda cáustica e cloro, no processamento do ouro, termómetros, baterias, condutores elétricos, fungicidas e inseticidas, entre outros. Existe, por sua vez, uma tendência em substituir o mercúrio por outros metais ou compostos.

Fig. 3. Resumo de informações sobre abastecimento, comércio e demanda do mercúrio (Modificado, UNEP, 2012).

Solos

Os teores naturais de mercúrio nos solos são bastante baixos e raramente excedem 1 mg/kg. Os maiores níveis de mercúrio aparecem associados aos histosoils (orgânico). Contudo, a maioria dos top soils contém quantidades elevadas desse metal especialmente quando estão próximos de zonas mineiras e de fundição.

Fig. 4. As propriedades do mercúrio de acordo com as suas espécies químicas (Modificado, Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007).

O mercúrio entra nos solos através de várias formas como precipitação e deposição atmosférica, esgotos, pesticidas a base de Hg, depósitos industriais, resíduos sólidos domésticos e cinzas de inceneração. Os reservatórios de Hg e Hg orgânico no solo são a fonte potencial de mercúrio acumulado na cadeia alimentar de água doce. o Me-Hg não é apenas de fontes atmosféricas, mas também da metilação do mercúrio inorgânico no sistema solo / solo-água, especialmente em áreas húmidas.

Devido às propriedades específicas e ao comportamento do mercúrio nos solos, a remediação de solos contaminados com mercúrio é complicada e cara.

Entretanto, a vaporização do mercúrio dos solos é geralmente acelerada por processos microbianos e não-microbianos e a taxa de volatilização é provavelmente máxima quando os processos microbianos são mais intensos. Vários estudos demonstraram que a adição de água aumenta significativamente a libertação de Hg do solo e a magnitude da sua libertação se correlaciona com a concentração de Hg no solo. Supõe-se que o mecanismo de libertação de Hg do solo seja devido ao deslocamento de Hg pelas moléculas de água mais polares (Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007).

Águas

O mercúrio ocorre na água em há várias formas: Hg0, Hg+, Hg2+, HgCl02, HgS2- e várias espécies de metilados (Me-Hg). A metilação do mercúrio e sua bioacumulação nos ecossistemas aquáticos (fig. 5) dependem de cargas de Hg, atividade microbiana, conteúdo de nutrientes, pH e potencial redox, carga de sedimentos, temperatura e outros fatores. Existem dois processos, biótico e abiótico, que orientam os mecanismos de formação do Me-Hg. O mercúrio na água pode revolatilizar-se, depositar-se nos sedimentos e ser absorvido pela biota aquática. O Me-Hg é altamente biodisponível e acumula-se facilmente nos peixes através da cadeia alimentar (Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007).

Fig. 5. Teores médios de Hg em espécies de peixes de acordo com seus hábitos alimentares (Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007).

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Fig.. 6, Emissão atmosférica (Martin Adams, Unsplash ).

A concentração média mundial de mercúrio na atmosfera varia entre 0,01 e 0,06 ng m^– 3, enquanto nas áreas urbanas / industriais pode aumentar até a faixa de 0,17 a 11,2 ng m^– 3.

As fontes de mercúrio e seu fluxo da atmosfera para a terra ou bacias hidrográficas geralmente se originam do ciclo global natural e de fontes antropogénicas. Em uma escala global, o ciclo de Hg atmosférico é dominado por vapor de Hg elementar (> 95%), enquanto sua deposição em ambientes terrestres e aquáticos depende fortemente da especiação de Hg libertada de diferentes fontes industriais para a atmosfera (Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007).

Animais

O mercúrio está presente nos tecidos de todos os organismos e geralmente está mais concentrado nos animais marinhos do que nos terrestres. A biomagnificação e transferência de mercúrio através das cadeias alimentares de mamíferos é evidente, mas variável. Existem diferentes concentrações de mercúrios em mamíferos herbívoros e em mamíferos carnívoros.

As quantidades de mercúrio nos tecidos de mamíferos variam entre 0,02 e 0,25 mg kg^–1, sendo os mais elevados nos rins e os mais baixos nos músculos (Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007).

Humanos

O Me-Hg pode ser retirado do trato digestivo e transportado pelo sangue para outras partes do corpo humano, causando grandes danos.

Ambas as formas de Hg, elementar e orgânico, têm efeitos agudos ou crónicos em humanos. Quantidades excessivas de Hg são ingeridas ou inaladas; a maioria das funções metabólicas são inibidas, o que finalmente leva à morte. Em um breve resumo, a toxicidade do Hg para humanos está associada a:

· Efeitos mutagénicos, carcinogénicos e teratogénicos (neonatal);

· Doença cardíaca;

· Danos no sistema nervoso central;

· Baixa fertilidade;

· Perturbação do desenvolvimento infantil.

A concentração de mercúrio nos tecidos dos peixes é de grande risco para a saúde humana. Um estudo aponta que 20–35% do Hg é contribuição da dieta de peixes para as populações nórdicas.

Diversas populações, ao redor do mundo, foram identificadas como pertencentes a grupos de alto risco devido ao consumo de peixes com elevados teores de Me-Hg. No entanto, o maior consumo de cereais e outros alimentos contribui mais ou menos com a mesma quantidade de mercúrio em relação a ingestão de peixes. No entanto, geralmente se considera que os peixes contribuem com uma grande proporção de mercúrio na dieta. No entanto, na França, Holanda, Reino Unido e EUA, o consumo de peixe contribui com 35% do mercúrio na dieta, enquanto na Finlândia o é de 85% (Kabata-Pendias & Mukherjee, 2007).

Considerações Finais

O mercúrio é um contaminante ambiental presente sob várias formas no meio ambiente, é um bioacumulador devido a dificuldade em se decompor. Portanto, é importante restringir o seu uso, encontrar alternativas e utilizar métodos de remediação para que o mercúrio não se concentre ao longo da cadeia alimentar. Só assim será possível diminuir os riscos associados a assimilação do mercúrio nos animais e no Homem.

Referências

Caheté, F. S. (2016). A Extração do Ouro na Amazônia e Implicações para o meio ambiente. Novos Cadernos NAEA, 1(2). https://doi.org/10.5801/ncn.v1i2.14

Cristina, M., & Jardim, W. F. (2004). O COMPORTAMENTO DO METILMERCÚRIO (METILHg) NO AMBIENTE Márcia. 27(4), 8.

Kabata-Pendias, A., & Mukherjee, A. B. (2007). Trace Elements from Soil to Human. In Journal of Chemical Information and Modeling (Vol. 53, Issue 9). Springer Berlin Heidelberg. https://doi.org/10.1007/978-3-540-32714-1

UNEP. (2012). A PRACTICAL GUIDE REDUCING MERCURY USE IN ARTISANAL AND SMALL-SCALE GOLD MINING. Iugs-Gem.

by. G. Resta

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Giulia Resta
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