Métodos de Estabilização de Taludes

Giulia Resta
geologicalthings
9 min readFeb 23, 2022

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É de conhecimento universal que a estabilização de taludes é um factor preponderante para preservação de vidas, integridade de edifícios e do funcionamento das vias de acesso que permitem o desenvolvimento socioeconómico universal. Assim sendo, é relevante conhecer conceitos polivalentes para além os meios de estabilização de taludes, como o ordenamento do território, processos de meteorização, processos geológicos e outras ações antropogénicas como passagens de veículos nas zonas adjacentes aos taludes.

Este artigo consiste num guia introdutório a partir da compilação dos métodos de estabilização mais relevantes descritos principalmente na dissertação de mestrado da engenheira Nicole Oliveira com o título «Soluções para a Estabilização de Taludes em Linha Férreas». Através de esquemas e descrições, é realizada a síntese dos métodos mais utilizados; modo de aplicação, objetivo o seu objetivo para garantir a estabilidade como, aumentar a resistência ao corte ou diminuir a pressão intrínseca; vantagens e desvantagens consoante as características limitadoras in situ e ao orçamento; e, por fim, algumas recomendações.

Os métodos mais relevantes estão agrupados em cinco grupos: sistemas de drenagem, alteração da geometria, estrutural, muros e elementos de contenção e, por fim, proteção superficial.

Factores Decisores do Método de Estabilização de Taludes

Os métodos a serem escolhidos para um talude vão variar muito consoante os factores descritos a seguir.

· Características geotécnicas do talude — altura, declive, resistência ao corte, cota do nível freático, tipo de material litológico, grau de coesão das partículas, descontinuidades, etc;

· A origem da instabilidade do talude e o grau de risco;

· Orçamento disponível para aplicação do método de estabilização e a sua manutenção;

· Ocupação do terreno e área disponível para a implementação de certos tipos de estabilização;

· Factores meteorológicos.

Principais Tipos de Estabilização

Os métodos descritos ao longo deste artigo estão condensados em cinco grupos (fig. 1):

Fig. 1. Organograma dos principais tipos de estabilização de taludes.

Métodos de Estabilização

1 — Sistemas de Drenagem

A água superficial e/ou de recarga subterrânea num talude aumenta a pressão intrínseca que atua como uma força desestabilizadora nas descontinuidades e nas superfícies de rotura do maciço rochoso, impulsionando assim a instabilidade deste.

De acordo com Oliveira (2010), os sistemas de drenagem podem ser superficiais como as valas de drenagem e as canalizações ou então profundas através de drenos horizontais, poços ou drenos verticais, galerias de drenagem ou telas drenantes. Estes sistemas têm como objetivo diminuir o nível freático e escoar a água que está no interior do talude. É a solução mais frequente para maciços rochosos. As perfurações devem atingir a cota do nível freático até à nova cota desejada para o novo nível freático. Sendo importante ter em atenção que, caso ocorra movimentação do talude, a cota do nível freático pode mudar encaminhando a água para a superfície de rotura ou para uma zona instável.

Para selecionar o sistema de drenagem (superficial ou profunda) deve-se verificar o tipo de escoamento que garante maior estabilidade do talude. Sendo relevante considerar que diferentes estratos têm valores de capacidade de permeabilidade diferentes fazendo variar o trajeto do nível freático no maciço (Oliveira, 2010).

No caso dos drenos horizontais, estes têm por volta de 5–15 cm de diâmetro e possuem uma inclinação de cerca de 3–5º. O comprimento dos furos tem que ir para além superfície de falha, sendo que a direção dos drenos depende da orientação do maior número de descontinuidades significativas no maciço (Kliche, 1999). Contudo, a sua implementação pode ser problemática caso o terreno apresente partículas finas que possam obstruir a passagem de água para o interior dos drenos através dos tubos-ralos por onde deveria passar somente água.

Deve-se evitar que a água entre em fraturas de tensão acima da crista de um talude. Isto pode ser feito ao desviar a água ou selar as fraturas de tensão. Quando as fraturas de tensão estão sendo obstruídas, a parte inferior deve ser preenchida com um meio poroso e a parte superior deve ser vedada (Kliche, 1999).

As galerias de drenagem (também conhecidas como “minas de água”) são áreas (1,0–1,5 m por 2,0–2,2 m) de drenagem colocadas sob um poço — ou em um declive ou uma escarpa para intercetar as águas subterrâneas. Apesar de caras, elas são um método eficaz de drenagem (Kliche, 1999).

2 — Alteração da Geometria

De acordo com Oliveira (2010), um declive muito verticalizado é um impulsionador de instabilidade (fig. 2) em um talude, principalmente quando este está muito alterado. A diminuição do seu declive permite que as forças de atrito atuem diminuindo assim a instabilidade do talude e a velocidade de movimento dos blocos que se desprendem de um afloramento, por exemplo.

A diminuição da inclinação do talude gera um aumento da força estabilizadora (fig. 2). A alteração da geometria, dependendo da rentabilidade do equipamento, pode ser feita através de detonações controladas e com a escavação do talude com pá escavadora/carregadora (ideal para material pouco consolidado ou granular). Todavia, este último método, apesar de barato, só será possível se o talude não for muito alto e se o seu material constituinte não for muito duro como um quartzito, por exemplo. A detonação controlada, por sua vez, permite o desmonte do maciço com alta resistência de forma expedita, contudo, esta técnica não se aplica em qualquer sítio devido a sua periculosidade.

Fig. 2. Variação das forças estabilizadora e desestabilizadora com a variação da inclinação do talude.

A redução do declive do talude pode ser complementada com a depositação de materiais ao sopé do talude, de forma a impedir o deslizamento deste através das tensões normais. Contudo, para isso, deve existir espaço suficiente para a deposição do volume suficiente de materiais para garantir a sua estabilidade.

Existem diferentes abordagens para estabilizar um talude através da escavação, um desses modos é combinar a inclinação do talude com o pendor das suas camadas. Esta abordagem pode ser eficaz em xisto, ardósia, calcário. Para inclinações elevadas esta abordagem pode ser combinada com o uso de pregagens e ancoragens (Kliche, 1999). Resumindo, a escavação seria feita numa orientação em que os planos de estratificação fiquem orientados para o interior do maciço (fig. 3).

Fig. 3. Corte transversal de um talude cuja escavação favorece a sua estabilização.

Outro método seria a implementação de rockshed ou abrigo para quedas (fig. 4) em taludes muito inclinados ou sub-verticais adjacentes às rodovias e ferrovias estreitas de forma a aparar a queda de blocos. Para este abrigo é necessário a colocação de uma cobertura de grande inclinação com um vão estreito, sendo recomendado o uso de gravilha ou solo sobre o abrigo de modo a retardar a queda de blocos. Esse abrigo tem um aspeto de túnel.

3 — Estrutural

A aplicação de suportes estruturais aumenta a estabilidade do talude ao longo de descontinuidades e planos de estratificação. Permitindo assim um aumento da resistência do talude contra o corte.

De acordo com Oliveira (2010), os elementos introduzidos no terreno que contribuem para o aumento da resistência do talude são estacas, microestacas ou jet-grout. A função das estacas e das microestacas é de atravessar a curva de rotura até atingir a zona estável do maciço. Sendo que as microestacas são apenas aplicáveis em taludes de materiais granulares. Também existem elementos que contribuem para a estabilização no terreno que são as ancoragens e pregagens. As ancoragens são colocadas no terreno atingindo a zona estável e trabalham em tração, criando assim uma força no sentido contrário ao movimento, aumentando desta forma as tensões normais sobre a superfície de rotura. No caso das pregagens, na cabeça de uma pregagem, prende-se uma rede de alta resistência para impedir a queda de blocos ou deslizamento de terras. De ambos os métodos, a ancoragem é a que tem maior resultado contra os riscos. Sendo que o dimensionamento destes elementos depende do esforço a que estarão sujeitos durante a fase de construção e durante a vida da obra.

4 — Muros e Elementos de Contenção

Segundo Oliveira (2010), o material colocado entre o talude e o muro de sustentação, como os gabiões, serve como uma capa protetora para evitar a erosão do pé do talude e proporciona um peso adicional que permite maior estabilização do talude. A construção do muro no pé do talude como contenção ou sustentação é uma solução eficaz contra a instabilidade superficial. A desvantagem dos muros de contenção está relacionada com a fase de escavação neste pé que favorece a instabilidade e a impossibilidade de saber se a superfície de rotura está situada acima ou abaixo do muro.

Os muros podem ser rígidos ou flexíveis consoante o seu objetivo de impedir um movimento ou agir como resistência adicional. Os muros de gabiões são muros flexíveis que têm as vantagens de não necessitarem de fundação, serem fáceis de projetar, boa adaptação ao terreno, trabalham por gravidade, são autodrenantes e até permitem a circulação de água do talude, apresentam grande durabilidade e são esteticamente admissíveis. No entanto, é importante que, caso seja colocado junto às partículas finas, que este tenha um filtro no enchimento para evitar o acúmulo de sedimentos no seu interior (Oliveira, 2010).

Outro exemplo são as paredes de betão armado tipo «Berlim» que são formados in situ, através de valas por baixo da superfície do terreno. Para grandes profundidades será necessário recorrer a apoios, como se designa a parede ancorada que aumenta a resistência contra o topplling e o deslizamento. É essencial a drenagem dos muros de betão dado ao fato do terreno adjacente a eles estarem saturados em água, gerando assim impulsos sobre a estrutura devido ao aumento da pressão intersticial. Para este caso, a drenagem pode ser feita por meios mecânicos ou através de drenos horizontais que atravessem o muro (fig. 5) (Oliveira, 2010).

Fig. 5. Métodos de reforço de taludes de rocha (adaptado de TRB, 1996).

Para casos mais pontuais de blocos desapoiados, cunhas, cavidades. Utiliza-se os maciços de recalçamento que atuam como muros de suporte. A partir do uso de betão armada ou pedra com argamassa. Esta é uma solução ativa e não preventiva dado que atua diretamente na instabilidade.

5 — Proteção Superficial

A proteção superficial dos taludes é importante para tornar o local de trabalho de operários, caso estes estejam próximos de taludes muito inclinados, mais seguro e para proteger as rodovias e ferrovias de obstruções que possam impedir a circulação (Oliveira, 2010).

Para esta categoria, as soluções mais frequentes são o betão projetado (5–8 cm de espessura), a colocação de redes metálicas. As redes metálicas é outra solução agradável esteticamente, são de alta resistência com dupla ou tripla torção com a vantagem de serem flexíveis, de alta resistência, baratos, fácil montagem, são resistentes a incêndios, raios-UV e permitem a estabilização e reconstituição da vegetação. Além disso, a sua aplicação é vantajosa para superfícies irregulares. A implementação mais simples são as redes suspensas sobre o talude com pregagem no topo atrás da crista do talude (Oliveira, 2010). Também é possível colocar nas secções adjacentes das redes, pesos como blocos de cimento e madeira para conter a queda de detritos (fig. 6) (Kliche, 1999). As redes podem ser eletrossoldadas e utilizadas como revestimento de gabiões.

Fig. 6. Influência do aumento do peso no sopé de um talude.

Outra solução consiste na junção das redes metálicas com pregagens ao longo de toda a malha ou então se opta também pela adição de betão projetado para uma maior estabilidade. Como alternativa, existe a colocação de geotêxtil ou impermeabilizações nos taludes cujo objetivo é controlar a erosão e assegurar a estabilidade das terraplanagens devido a alta capacidade de drenagem e uma aceleração da consolidação dos taludes (Oliveira, 2010).

Considerações Finais

Ao longo deste guia, é notável como existem métodos de estabilização que se adequam melhor em relação a outros consoante as características in situ, principalmente, devido às características geotécnicas do talude a ser intervencionado. Portanto, não existe um método perfeito, mas sim um método ou uma combinação de métodos que se adequa melhor para as condições in situ, factores estéticos e para um dado orçamento.

Referências

Kliche, C. A. (1999). Rock Slope Stability. In Rock Mechanics (p. 273). Society for Mining, Metallurgy, and Exploration, Inc.

Oliveira, N. C. D. (2010). Soluções Para a Estabilização De Taludes Em Linhas Férreas. Faculdade de Engenharia, Universidade do Porto.

Transportation Research Board (TRB) (1996) Landslides, Investigation and Mitigation. National Research Council, Special Report 247, Ch. 1, Washington DC, 482 p.

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Giulia Resta
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I do not sing in the shower, I travel through time and space.