Fórmula do Amor
Pequenos Frascos
Além de uma ruiva me faltava também uma anã em meus escaninhos sexuais. Não por fetiche. Apenas por uma questão de amplitude de amostragem. Mas, apesar de minha ausência de critérios, eu tenho problemas com simetria. Sim, meu TOC me faz ter alguma compulsão pela questão estética da simetria. E anões… bem, via de regra eles não são muito simétricos.
Eu vinha pensando em como resolver essa questão quando entrei no metrô, tarde da noite, na estação Nova América. Era o último trem da linha dois e eu estava bastante cansado. Ao meu lado sentou-se uma mulher loira e baixinha. Ela era acintosamente baixa e bem simétrica e torneada como se malhasse profissionalmente. De soslaio arrisquei alguns cálculos mentais para ver se aquela mulher atendia aos meu critérios (básicos) de simetria. Sim, ela era perfeita. Não tinha um membro sequer fora de esquadro. Tentei não pensar mais no assunto, pois não queria parecer ‘o tardado do metrô’. Tentei ler um livro no celular.
Depois que descobri um aplicativo de leitura de livros em formatos digitais minha vida ficou bem melhor. Sou de uma geração que ama as coisas atômicas, mas entendi que não há mais sentido nisso. O meu apego à matéria foi dando espaço para a apreciação do conteúdo por si só, independente da plataforma. Entendi que é o que importa. Mas, não sem sofrimento. Sou um homem velho. Mas, preciso admitir que uma música independente do formato ainda é uma música. O mesmo acontece com a escrita. Estamos vivendo um momento em que o conteúdo é o grande rei, independente da plataforma.
Eu me distraía com meus pensamentos jurássicos, quando o meu objeto de estudo encostou sua cabeça em meu ombro. Ela dormia o sono dos justos. Fui tomado por uma verdadeira onda de amor por aquela minúscula criatura. Senti vontade de colocá-la no colo, acarinhar seus cabelos, dar-lhe pequenos beijos em seu rosto, mas fui impedido pelo meu pavor de ser confundido com ‘o tarado do metrô’.
Não foi orgulho.
Foi penas por uma questão de autopreservação física. Se as pessoas pudessem ouvir meus pensamentos eu seria encarcerado em uma ilha deserta pelo resto da vida. Se elas soubessem que muitas vezes eu as vejo sem roupas eu seria condenado à cadeira elétrica. Mas, ainda não inventaram leitores de mente.
Ainda bem.
A minha pequenina diva agora roncava e babava em meu ombro. Fui tomado por uma segunda onda de amor, dessa vez, ainda maior. Não era tesão o que eu sentia. Era algo como um sentimento de proteção e cuidado. Sim, talvez eu (ainda) tenha sentimentos puros. Talvez, eu faça sexo apenas para preservar intactos os meus sentimentos mais puros. Mesmo que seja necessário endurecer (no bom sentido) a ternura ainda permanece dentro de mim. Mas, somente dá o ar de sua graça em momentos inusitados como este metrô. Agora todos me olhavam atentamente para captar minha reação. Eu continuava lendo como se nem fosse comigo, e me perguntando como uma pessoa tão desprovida de espaço físico poderia ter tanta baba em seu corpo. Próximo à estação de Botafogo, resolvi acordá-la. Precisaríamos trocar de trem e eu desejava evitar constrangimentos. ‘O tarado do metrô’ dentro de mim falava impropérios, mas consegui contê-lo e acordá-la gentilmente. Por um momento ela ficou constrangida frente a visão de minha manga de camisa completamente molhada. Procurei mudar de assunto para deixá-la mais à vontade. Descemos na mesma estação em Copacabana. Peguei seu telefone, mas eu o deletei ao sair do metrô. Não posso mais me dar ao luxo de fazer sexo por amor.