Pontos Cegos — Márcia

Novembro 2008

Robson Felix
Gotas de Prazer
5 min readAug 27, 2016

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“O poder que não se exerce e é exercido sobre você.

Eu achei que podia apenas te ver e sair ilesa, mas você não permitiu.

Provou-me supremacia.

Me botou no mundo, me tirou do conto.

Ali, eu intensificava o meu processo de aprendizado interno, o exercício de cavar até chegar ao fundo, pra retornar mais forte.

Hoje você representa pra mim ‘o futuro’, ‘o irreal’, ‘a transmutação’, ‘a sombra’.

Eu vejo em você a porta para a minha liberdade, para a minha revolução pessoal.

Não que você precise necessariamente despender qualquer sentimento ou desenvolver qualquer relação, esforço, envolvimento.

Só quero proximidade, atenção, troca, diálogo, percepção e um pouquinho de carinho.

Não sei por quanto tempo, como você mesmo diz, porque habitamos mundos internos díspares.

Ao contrário do que disse na nossa última conversa, não gosto de quem me pisa ou me faz sofrer.

Gosto de sentir intensamente e não tenho medo de sofrer no final, há uma ponte entre o permitir de um e de outro.

Gosto de me sentir valorizada, adulada, apreciada, desejada, seduzida — com calma e respeito — gosto de saber o que sentem por mim.

Quando não se dá desta forma percebo que sou mais uma, apenas, e isso me expele quase que de imediato, é involuntário.

Nada flui.

Que todos os recomeços me permitam intensidade, sem limitações.

Não falo de sexo, falo de alma.

Não sei ser pouco, sentir pouco.

Quanto ao sexo, não é a minha porta de entrada, preciso me sentir tomada para sentir tesão, com a sensação de que não caibo mais em mim, volúpia, desejo, ânsia e não meramente experimento.

A transa pode muito bem ocorrer no primeiro encontro, mas a arte do encontro, a força da sedução, o poder do olhar, fazem enlouquecer e gerar o choque das almas e atrito das peles.

Sei que não posso esperar isso de todos os homens com quem me deito, por isso procuro escolhê-los bem.

Por isso, também, muitas vezes caio fora sem explicação.

Um homem, pra mim, tem que ser especial, as conversas me seduzem e excitam, o intelecto me embriaga.

O deitar, não é para mim, um ato animal, meramente instintivo e não vai ser nunca.

Não tem nada a ver com ser uma menininha, e sim com personalidade, com objetivo de vida, com o que me é afim, com o que me faz bem.

Eu só sei que você me faz bem.

Não me pergunte como ou ache mais do que isso.

O que pode acontecer?

Veremos…

O meu momento?

Estou no olho do furação, metamorfose.

A minha intenção?

Intensidade, liberdade, conquista e felicidade.

O meu medo?

Família, criar filhos, solidão.

O meu fraco?

Insegurança, o sofrimento do outro.

Homens hoje?

Os que tiverem algo a acrescentar.

Conceder algo, dentro dos meus objetivos.

Aonde tudo acaba?

No desrespeito, na mentira.

Estou passando por aqui e você estava à beira do caminho, quero me envolver com você, mas não sei até qual página.

Estou em um momento egoísta, isso é paradoxal em minha personalidade, mas preciso sê-lo.

Não quero grau de parentesco com você, apenas proximidade.

Existem muitos tons em sua aquarela, aos meus olhos pastéis, suas cores vivas são as que me atraem.

Não veja soberba nas minhas palavras, também não me perceba na ofensiva.

Tudo é apenas uma exposição, uma organização dos fatos.

Sei das minhas imperfeições e hoje passo pela maior batalha já travada, contra os defeitos que localizei no meu sistema central.

Procuro constantemente me analisar e também os acontecimentos e as pessoas que me cercam.

A observação é meu estado de espírito!

A verdade?

Preciso de alguém que cuide de mim, cansei de cuidar, de arrastar a carroça.

Estou de fato exausta e frustrada.

Preciso me reestruturar e para tanto preciso dividir as culpas, os esforços, as vitórias, os devaneios, os planos… eu não gosto de ser só, sou mais completa e radiante quando posso trocar com o outro e em um relacionamento a dois.

A fidelidade é essencial, digo, em todos os âmbitos do relacionamento.

Nos objetivos, na parceria, na amizade, na criação dos filhos…

Entende?

Estou pensando em voltar para a vida que deixei no meio, quero acreditar em uma mudança do outro, acreditar que conseguirei reacender o sentimento através da admiração, do compartilhar e do respeito.

Manso isso, não acha?

— “Aonde está a tal intensidade?”, você pode se perguntar.

Ao mesmo tempo, queria ser mais forte ao tocar a vida.

Acreditar em um futuro implacável, mas neste momento escolho ser mãe, responsável e renunciar a muitas vontades.

Não estou colocando obstáculos.

Nem impondo condições.

Ao contrário.

Quero ser uma pessoa infinitamente melhor.

Porém, escolhas foram feitas e não é fácil simplesmente optar por outros fins, sem pensar nos meios.

Esse egoísmo a que me referi anteriormente está me fazendo pensar nos meus prazeres, em novos amigos, afinidades, em meus estudos e investimentos para um futuro sólido e estruturado.

Outros romances não encontram espaço, não tenho tempo disponível para envolvimentos fúteis.

Me falta tempo para conhecer pessoas à fundo, me dedicar.

Estou em uma fase de ‘preguiça emocional’, como você bem diz.

Sinto que um romance precisaria ser arrebatador para me tirar do traçado que rascunhei para mim.

Não me resta mais tempo para pensar em conhecer um aqui, outro ali e deixar rolar até sei lá quando.

Depois, as pessoas estão tão desinteressantes, que os encontros se transformam em desencontros constantes, frustração…

Por tudo isso, acabo pensando na ‘comodidade’ de ter alguém que de fará tudo para manter um casamento de pé, já que errou tanto.

É aí que entra o meu ex, sei que ele será um companheiro dedicado, vai batalhar pela relação e me dará conforto para seguir a minha vida profissional, além de dividir comigo a criação do meu futuro filho.

E financeiramente a vida tenderá a se tornar mais estável.

Cara, pode me chamar de escrota, de ridícula, hipócrita, sei lá… mas, isso é um caminho paralelo à desconstrução, apesar de ser também uma contramão.

A inconstância dos dias.

Tem dias que eu acordo pronta para ser a dona do mundo, para ser independente fazer a diferença, com ânsia, força, uma vontade de trocar, me propagar, sede de conhecer.

Outras dias acordo tipo ‘só me deixe aqui!’, querendo apenas a simplicidade, um cantinho, noites tranquilas, acreditar, não saber mais do que devo, não ter ira e seguir mansamente o caminho do bem.”

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