Meu radinho

Zeca Lemos
Granulações com Clarice Lispector [1]
2 min readMar 14, 2021
Ilustração: Filipe Evans

Um rádio não é apenas um aparelho tecnológico, é um destino. A energia de seu som simboliza a paixão de quem entrega parte relevante da vida por uma causa. Como torcedora do Fortaleza, apaixonei-me por ele quando comecei a acompanhar futebol.

Houve um tempo em que eu não tinha condições de ir ao estádio nem de pagar TV por assinatura. Assim, minha única alternativa para ouvir os jogos era meu radinho de pilha. Era mágico. Eu escutava as narrações e ficava imaginando todos os lances ocorrendo no fervor de um estádio lotado.

Foi dali que nasceu minha intimidade com a arte e com a subjetividade. Por meio de uma locução, eu conseguia inventar todo um acontecimento na minha cabeça. Aqueles jogos para sempre seriam lembrados, mesmo que eu não visse uma só imagem deles. Palavras são muito mais instigantes do que imagens.

Era domingo e o jogo era contra o Ceará, nosso maior rival. Quando o locutor gritou gol e quase perdeu a voz, meu mundo mudou. O Fortaleza virou a partida, e eu virei a vida. A partir daquele dia, comecei a sonhar em ser jornalista esportiva. Enchi-me de paixão.

Eu tenho tudo anotado. As escalações, estatísticas. Meu caderninho imortaliza números mágicos, resultados inesquecíveis. Sempre que penso em desistir de algo, lembro da conexão do meu time do coração com meu radinho. É quando tudo é mais difícil de conseguir que se torna mais especial.

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