Quando não se pode ter tudo, mas se tem paz

Rebeca Quirino
Granulações com Clarice Lispector [1]
2 min readMar 14, 2021

Texto de Rebeca Quirino de Oliveira

Photo by Jana Sabeth on Unsplash

As águas falam, basta que você esteja atento o suficiente para escutá-las. Eu vivo nas águas, nasci nelas. Na terra, contam muitas histórias sobre mim, sobre meu encanto e minha cauda de peixe. Mal sabem eles que sei mais sobre suas histórias do que eles sobre a minha.

Como já disse, as águas falam. E um dia me contaram sobre uma mulher que brincava com as águas de um chafariz. Ela se banhava e se encharcava com toda aquela água como se fosse muita. Acho que ela não conhece a abundância do mar. Me senti intrigada. Como alguém pode ser feliz com tão pouco? Como se alegrar quando aquilo que se tem é apenas uma parte de tudo que se poderia ter? Como se contentar com um chafariz quando se tem um oceano inteiro a explorar? Tenho muitas perguntas, mas as águas
não me trouxeram respostas.

Ao anoitecer, boiei no oceano como já tenho costume e vi o céu cheio de estrelas. Sinceramente, sempre achei o céu mais lindo que o mar. Percebi ali que o céu não estava ao meu alcance, não por inteiro, mas apenas em parte, apenas aquilo que meus olhos conseguiam enxergar, mesmo assim estava feliz. Vi que no escuro da noite não conseguia mais ver a linha que separa o céu do mar, agora são um só. Agora sei que de alguma forma o céu me toca pelas águas e sou feliz por isso.

Não conheci essa mulher que brincava no chafariz e sei que ela nunca poderá responder às minhas perguntas. Mas me contento em saber que tenho para mim parte do mesmo céu que a cobre à noite. Enfim, agora me contento. Mesmo ainda sem respostas, tenho paz.

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