Maria Firmina dos Reis e o resgate das produções de mulheres negras

Guia Maria Firmina
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3 min readNov 11, 2017

Em mil novecentos e dezessete
A Firmina faleceu
Mas deixou para memória
A herança que escreveu
E que sempre a duras penas
Para o mundo ofereceu

Mulher. Negra. Maranhense. Primeira concursadA para o cargo de professora em seu Estado. Romancista. Poeta. Contista. Fundadora da primeira escola mista do Maranhão. PrimeirA a publicar um romance no país. PrimeirA a escrever um romance abolicionista. Apesar do pioneirismo, Maria Firmina dos Reis não está nas discussões das aulas de literatura, tampouco é citada pela academia e pelos críticos como os cânones da literatura brasileira. Para nossa sorte, porém, há cada vez mais mulheres, principalmente negras, resgatando sua obra e importância histórica para o Brasil.

“Uma moça do Maranhão me sugeriu que eu registrasse a história de Maria Firmina e fiquei completamente chocada com o fato de que nunca tinha ouvido falar dela. Firmina foi uma verdadeira pioneira, cheia de uma coragem inexplicável, e é absolutamente vergonhoso que isso não seja sequer citado, nem mesmo rapidamente, durante as aulas de História”, diz a escritora Jarid Arraes. Em seu livro Heróinas negras brasileiras em 15 cordéis, Jarid conta a história da romancista abolicionista em versos ritmados de cordel.

Ela foi tão importante
Para outras instigar
E a mim muito emociona
Quase ao ponto de chorar
Quando penso em sua vida
Quero assim compartilhar.
(…)
No entanto me revolta
O nojento esquecimento
Pois nem mesmo na escola
Nem sequer por um momento
Eu ouvi falar seu nome
Para o reconhecimento.

O falta de informação sobre a obra de Firmina é tanta que até hoje o rosto da escritora é desconhecido. Em matéria para o Estadão, a jornalista Bruna Meneguetti conta que o retrato existente na Câmara dos Vereadores de Guimarães foi inspirado na imagem de uma escritora branca gaúcha, que acreditava-se ser Firmina, e o busto que está no Museu Histórico do Maranhão também reproduz a imagem de uma mulher branca.

Busto Maria Firmina dos Reis | Foto: Divulgação

A cantora e compositora Socorro Lira lançou em outubro o EP Seu Nome, com quatro poemas de Firmina musicalizados. “Eu não a conhecia, o que prova que existe uma borracha que apaga os nomes das mulheres da história. O trabalho veio com o Mulherio das Letras, evento que aconteceu em João Pessoa mês passado e a homenageou. No começo era apenas para musicalizar alguns poemas para cantar na abertura, mas precisava gravar as canções porque a poesia dela é sensacional”.

Maria Firmina deveria ser reconhecida como ícone para escritoras brasileiras, pois teve coragem de publicar seu romance Úrsula em uma época na qual mulheres, principalmente negras, não eram aceitas na arte. “Ela é uma das minhas maiores inspirações. Sempre penso nela e em como o fato de eu continuar escrevendo e insistindo é algo que vai além de mim. É algo que já começa além de mim, porque se tornou possível depois que ela e outras heroínas lutaram e abriram caminhos antes impossíveis de pisar”, explica Jarid.

Para Socorro, a obra de Firmina foi invisibilizada por ela ser mulher e negra, existências que são renegadas do século XIX, época em que viveu a escritora, até o momento. “Mas o que tem força acaba por romper o tempo e o silêncio, reaparecendo quando é preciso. Por tudo que acontece agora no país e no mundo, pela nova Idade Média que vem com tudo, a memória de figuras fortes como Firmina oferece pistas, inspira e fortalece a luta que ainda temos de travar contra a exclusão das mulheres”.

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Projeto criado para divulgar o trabalho de mulheres artistas. Por Taís Cruz e Victória Durães