Yzalú: “O rap me tirou do mundo frio”

Guia Maria Firmina
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Cantora, compositora e intérprete que faz rap na batida do violão. Essa é a paulistana Luiza Yara Lopes Silva, mais conhecida como Yzalú. O violão é a ligação da artista com a MPB, e a sua vivência de mulher negra, periférica e com limitações de locomoção (Yzalú usa uma prótese em uma das pernas) dá o tom às suas rimas.

Desde a adolescência tocando em barzinhos, não demorou a perceber que o rap, que era uma febre na sua quebrada, em São Bernardo do Campo, nos anos 2000, dialogava com a sua realidade. De barzinho em barzinho, sempre acompanhada pelo vilão, anos mais tarde subiu ao palco de um grande show de rap pela primeira vez para cantar “Um bom lugar” (Sabotage), antecedendo a Facção Central, e nunca mais parou.

Ganhou bastante destaque com a interpretação da música “ Mulheres negras “, escrita pelo rapper Eduardo Taddeo, que virou um hino do feminismo negro. Mas não escapou de comentários machistas que vincularam o seu sucesso apenas ao trabalho de um homem.

Mulher negra não se acostume com termo depreciativo
Não é melhor ter cabelo liso, nariz fino
Nossos traços faciais são como letras de um documento
Que mantém vivo o maior crime de todos os tempos
Fique de pé pelos que no mar foram jogados
Pelos corpos que nos pelourinhos foram descarnados
Não deixe que te façam pensar que o nosso papel na pátria
É atrair gringo turista interpretando mulata

Em 2016, Yzalú lançou o seu primeiro disco “Minha bossa é treta”, título definido por ela, em entrevista à revista TPM, como uma referência à sua própria realidade, de mulher negra moradora da periferia, filtrada pelo violão, que a acompanha no mundo do rap desde sempre.

Batemos um papo com Yzalú sobre sua carreira e planos para 2019, que estão cheios de novidades. Vem ver!

Como foi os seus primeiros contatos com o rap?

Cresci num ambiente em que se ouvia muita música negra, e já no início dos anos 90, nas festas de família tocava Ndee Naldinho, Pepeu, que até então era um ritmo novo. Em 2002, o rap já estava em grande ascensão e por onde se andava na quebrada era o que se ouvia, nos carros, nas rádios, era uma febre.

Você tem forte uma influência da MPB, por que optou pelo rap?

Nesta época em que o rap estava em alta, eu já tinha ciência de que ele dialogava comigo no sentido geográfico, político e social, muito do que era tratado no rap tinha haver com o que eu enxergava na quebrada. As minhas composições nessa época já eram genuinamente um rap no violão, eu escrevia umas rimas e desenrolava um ritmo muito semelhante ao rap. A Lauryn Hill era minha maior referência por utilizar bastante o violão também.

Eu acredito que não optei pelo rap, na verdade em muitos momentos eu evitei a música, não me enxergava sendo um dia uma artista, eu só queria tocar meu violão. Hoje me sinto muito honrada e grata, porque vejo que o rap me acolheu, permitindo com que eu pudesse expressar a minha arte, minha linguagem, e com isso promover uma transformação social a partir da minha condição e vivência enquanto mulher, preta cafuza, oriunda da periferia que utiliza prótese e que a partir de então é enquadrada em vários recortes nesta sociedade, tendo que sair lá no final da largada simplesmente por ter esta condição. Por isso que falo, foi o rap que me tirou do mundo frio!

Foto: Thiago Drummond

Você acha que as mulheres tem tido mais visibilidade no rap?

Não acho que temos tido mais visibilidade, na verdade o que acontece, na minha opinião, é que atualmente é impossível não notar o que as mulheres tem produzido na cena. Cada vez mais vemos mulheres no game, empresárias, produtoras, dj’s, fomentadoras da arte…. Ou seja, percebemos que nada mais nos impede, e tenho certeza que é disso para mais!

Quem são as rappers que te inspiram?

Lauryn Hill, Dina Dee, Negra Li, Patra, Roxanne Shanté e Eve.

Você está desenvolvendo algum novo projeto para um futuro próximo?

Agora no início do ano eu lanço um EP com 4 faixas, em parceria com a Shirley CasaVerde. E em maio lanço meu segundo álbum.

Então vamos aguardar que vem coisa boa por aí, enquanto isso ouvimos mais um pouquinho Minha Bossa é Treta:

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Guia Maria Firmina
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Projeto criado para divulgar o trabalho de mulheres artistas. Por Taís Cruz e Victória Durães