A lei da ferradura

Gustavo Ramos
Gustavo Ramos
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3 min readJul 24, 2017
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Em tempos binários e radicais, nunca Blaise Pascal foi tão atual: os extremos estão de mãos dadas. Mais próximos do que podem admitir, e estão ligados pelo desprezo à razão, pela ausência de dúvida e admissibilidade da realidade.

Um tempo em que um antitabagista é capaz de queimar o fumante com um cigarro; em que o vegano é capaz de comer o fígado alheio na intolerância ao ato do outro que escolheu comer carne; um pacifista é capaz de dar um soco no próximo para provar seu ponto.

Uma das tragédias atuais é a renúncia da razão em detrimento da certeza radical. Só os iluminados tem a capacidade de duvidar; a dúvida leva à curiosidade, que leva à observação da realidade, que nos leva mais próximos da verdade.

Ousar voltar atrás ou mudar de opinião é um movimento ímpar, altivo e amoroso. Não há nada tão racional do que a própria retratação da razão. É muito provável que os que têm certeza estão muito mais próximos à loucura do que o que questionam.

Os olhos atentos à realidade são os intérpretes do coração, mas só os interessados entendem essa linguagem. Como disse Schopenhauer, se contemplarmos longamente a escuridão, algo real e concreto sempre aparece.

A lei da ferraduraem que os extremos estão muito próximos – se aplica ao extremismo social e político que estamos, infelizmente, vivenciando. Momento em que pessoas que acreditam ser de direita veneram o Estado quase tanto quanto os que se dizem de esquerda. Nestes casos de briga de torcida, a indiferença pacífica e determinada, é a mais sábia das posições.

A intolerância impera. A raiva dicotômica põe a mesa da divisão binária e idiota de lado a lado, com discussões não civilizadas. A insensatez permite que os mesmos argumentos sejam usados para justificar ideais antagônicos. A civilização consiste em libertar o homem dos outros homens.

Não há palavras para qualificar aquele que tem certeza e não se permite o benefício da dúvida, a busca pela liberdade e da felicidade; aquele que, ao mesmo tempo, é infeliz e injusto, e ainda se sente tranquilo e satisfeito, se vangloriando de ser prisioneiro de suas convicções, cristalizadas pela própria certeza.

É uma estranha e perversa inversão a sensibilidade do homem às pequenas coisas e a insensibilidade dele às grandes coisas. A liberdade e a razão são os únicos grandes valores humanos.

Todos os homens, sem excessão, procuram ser felizes. Embora por meios diferentes, tendem todos para este fim. Felizes daqueles que não deixam que as alegrias passageiras cubram os males eternos que elas próprias causam. O desespero pela segurança e provimentos, tende a ser mais forte do que o amor à liberdade. E esta é única razão para que o populismo e estatismo ainda vivam entre nós.

A certeza, mesmo que insana, será sempre mais confortável e fácil do que a incerteza. Não seja preguiçoso. Não tire de seu aprendizado a conclusão de que você sabe tudo, mas sim a certeza de que ainda resta muito a saber. E, se por ventura, chegar a se perguntar quem poderá lhe ajudar, olhe-se no espelho e liberte-se.

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Gustavo Ramos
Gustavo Ramos

Fã da liberdade, do comportamento humano, inovação, mercado, empreendedorismo, tendências, história, política, café, psicanálise, gente e da @esentiabrasil .