LITERATURA

Todas as cores de Carlos Pena Filho

Filósofo da Academia Pernambucana de Letras, Ângelo Monteiro comenta obra de poeta recifense

Guto Moraes
Guto Moraes

--

Publicado no caderno Viver, na edição impressa e no site do Diario de Pernambuco, em 23 de setembro de 2020.

‘O Tempo da Busca’ (Edições Região, 1952) está esgotado. O único exemplar do primeiro título do poeta recifense Carlos Pena Filho (1929–1960), disponível para a venda em toda a internet, custa R$500 no sebo online Estante Virtual. “De tiragem muito restrita, raro”, justifica a descrição. Sua obra embora pequena, em número, foi fundamental para a poesia no Estado, defende o ensaísta e filósofo Ângelo Monteiro. Na quarta-feira (23), às 17h, ele estreia o circuito de oito palestras promovidas pela Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), em parceria com a Academia Pernambucana de Letras (APL), e transmitidas no canal da Instituição, no YouTube.

A primeira publicação de Pena foi no dia 12 de novembro de 1950, aos 20 anos, quando três sonetos seus integraram o suplemento literário do Diario de Pernambuco. Foram eles, ‘Quando a noite for grande’, ‘Entre a pedra e o sino’ e ‘Marinha’. “Também a sua expressão contribui para conferir uma aura de renovação e forma raras vezes realizada com êxito, embora mais frequentemente tentada. Nenhuma palavra e nenhuma ideia exumadas aparecem nestes sonetos. Neles tudo chegou com uma indisfarçável força de emoção e permanência”, adiantava a edição, em que também figuram textos do sociólogo Gilberto Freyre e do jornalista Assis Chateaubriand.

Detentor da cadeira 34 da APL, Monteiro promete resgatar fragmentos da bibliografia do poeta-pintor, comentar aspectos de estilo e o impacto que ele causou no Recife, em meados do Século 20. “Sou da época que existiam os suplementos literários. Morava em Gravatá [no Agreste de Pernambuco] e os jornais da capital chegavam, às 9h, pelo trem. Foi quando conheci os poemas de Carlos Pena Filho”, recorda. “Ele representou na poesia pernambucana um momento novo. Ainda que muitas vezes identificada com a Geração de 45 — a mesma do cronista Mauro Mota — , se distinguia pela ênfase no aspecto lírico da poética e uma liberdade de expressão aliada à perfeita forma.”

Para o filósofo, qualquer pessoa que ler o autor de ‘Soneto do desmantelo azul’ e ‘A mesma rosa amarela’ — esta última musicada pelo frevista Capiba e eternizada na voz da cantora Maysa Matarazzo — poderá memorizar seus textos com facilidade. “Os grandes poetas são fáceis. Não há um artificialismo formal”, adverte, ao manusear um original da antologia poética Livro Geral (Livraria São José, 1959), último título publicado por Pena, que faleceria no ano seguinte, aos 31 anos. “Para alguém que morreu moço, ele deixou uma obra altamente expressiva. Sua poesia preservou a vivacidade. É como se fosse uma juventude permanente.”

Sobre a recorrente associação do poeta à cor azul, o escritor retruca. “Ele ficou mais conhecido pelo azul, pois falava em situações luminosas, mas abordava todas as cores. É, portanto, o poeta da luz. Sua poesia é vivaz e repleta de brilho. Sob o sino da juventude é que ressalta essa luminosidade”, diz Ângelo Monteiro, que também é autor premiado pelo título ‘O rapto da noite ou o sol como medida’ (1983). Em seu livro mais recente, Arte ou Desastre (Realizações, 2011), dedica ao poeta o capítulo ‘A suspensão do tempo em Carlos Pena Filho’. Embora nunca o tenha conhecido pessoalmente, lamenta. “Aqueles que os deuses amam, morrem jovens, meu filho.”

--

--

Guto Moraes
Guto Moraes

Repórter de Cotidiano da Folha de Pernambuco. CEO da Revista Dona Custódia. Colaborou com o Catraca Livre e Revista O Grito!.