COTIDIANO

Vítimas de deslizamento ainda aguardam ajuda

Quase um mês após a tragédia que provocou a morte de sete pessoas em Camaragibe, sobreviventes dependem de doações para viver

Guto Moraes
Guto Moraes

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Publicado pela Folha de Pernambuco e no Portal FolhaPE, em 04/07/2019

Sob uma geladeira, os escombros da casa em que vivia desde que nasceu e da lama que deslizou da barreira a menos de 100 m da residência no Bairro dos Estados, em Camaragibe, Larissa Lafaiete, 20 anos, aguardou consciente as sete horas de seu resgate. O deslizamento ocorreu no último dia 13, vitimou o marido dela e outras seis pessoas. Hoje, na casa da irmã Marta Lafaiete, ela passa a maior parte do tempo na cama que ganhou em doação. À Folha de Pernambuco, Marta denunciou que o nome de Larissa tem sido vinculado a campanhas de arrecadação, mas as doações não têm chegado.

“Tudo o que recebemos faço registro, compartilho com os amigos. Quando a doação é em dinheiro, também fotografo o que compramos e mando a foto pra quem fez a doação, que é pras pessoas saberem o que estamos fazendo”, conta Marta, que reclama a falta de suporte do poder público. Vinte dias após a tragédia, a irmã depende dessas doações para a manutenção do pós-cirúrgico. Ela ficou com os movimentos limitados pelo uso dos ferros que ajudaram a colar o fêmur e a bacia, fraturados no acidente. Da prefeitura local, recebeu R$ 200 e um edredom cinco dias após o resgate.

“O suporte que recebemos vem dos parentes e amigos. Não há até o material para curativo nos postos [de saúde] próximos e profissionais para virem até aqui fazer a troca”, relata. Apesar das dificuldades, a recuperação de Larissa tem sido bem sucedida. A expectativa é de que os ferros sejam removidos em até dois meses e que ela volte a andar entre nove meses a um ano de repouso. Além do material, das fraldas e do remédio anticoagulante — que custa até R$ 600 -, ela também precisa de móveis para guardar as poucas roupas que a família conseguiu retirar dos escombros. O resto foi perdido.

Perguntada sobre como se sente, Larissa Lafaiete conta que não superou as perdas e conserva os detalhes daquela quinta-feira chuvosa. “As pessoas falam que perdi só o meu marido, mas tinha a menina que morava ali e tinha os filhos dela, que eram crianças”, lamenta. Interessados em ajudar no tratamento devem entrar em contato através do número (81) 9.9996.0071 ou na rua Eliza Cabral de Souza, 486 B, no Centro de Camaragibe. No endereço, ela também recebe as visitas de pessoas comovidas com a tragédia da qual foi vítima. Desde a última semana, 38 assinaturas constam no caderno destinado à memória da solidariedade dos desconhecidos.

Legado de risco

Ao todo, quatro imóveis foram destruídos pelo deslizamento no Bairro dos Estados. O terreno era de propriedade da família de Maria José da Silva, 63 anos, avó de Larissa Lafaiete. Ali, ela cresceu e criou os filhos. Nos anos 1990, a Irmã Zezé, como é conhecida, perdeu, também em um deslizamento, uma “casa de tábua” construída no local. Mas a família nega ter conhecimento de que a área fosse de risco. “Recebemos uma visita da Defesa Civil duas semanas antes [da tragédia], mas em nenhum momento nos foi informado que seria uma área de risco”, declarou Auxiliadora Lafaiete, tia da Larissa, que também teve a casa atingida.

Depois da visita, parte da encosta recebeu a construção de muro de arrimo, mas a área afetada não havia sido contemplada. Moradores da segunda travessa Bom Jesus culpam a falta de canaletas adequadas para escoamento da água da chuva. Auxiliadora lembra do “tsunami” de barro e lama causado pelo deslizamento. A última imagem que tem é das meninos de 6 e 14 anos sendo atingidos pela parede do vão em que moravam e cobertos pela lama. Desde então, ela mora de favor na casa de parentes. “A prefeitura coletou os nossos dados. Disseram que iam entrar em contato para informar se receberíamos auxílio moradia ou algum lugar para morar, mas até agora não foi feito nada.”

No bairro, os moradores contam da tristeza causada pelas perdas e do clima de insegurança causado pela tragédia, mas também pela imprevisibilidade da área. A Folha de Pernambuco procurou a Prefeitura de Camaragibe nessa terça-feira para saber da situação do local e quais medidas serão adotadas para as famílias atingidas, mas, até a publicação texto, não obteve resposta.

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Guto Moraes
Guto Moraes

Repórter de Cotidiano da Folha de Pernambuco. CEO da Revista Dona Custódia. Colaborou com o Catraca Livre e Revista O Grito!.