Crescimento de telas vivas

Haline Farias
Haline Farias
Published in
6 min readMar 7, 2018

Por: Haline Farias (halinefarias@gmail.com)

O artista visual aracajuano Alef Freire, 24 anos, há um ano e meio trabalha como tatuador. Foi ainda quando criança que Alef entrou no mundo artístico. Segundo ele, desde pequeno praticava muito desenho e então já pensava diversas em profissões ligadas à arte. Aos 18 anos o artista iniciou o curso de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Tiradentes (Unit), mas trancou a faculdade no 7º período, assim que percebeu quais caminhos realmente gostaria de seguir.

Alef já tinha três anos trabalhando como artista visual com arte gráfica, produção de quadros, exposições artísticas e fechava trabalhos residenciais. Mas com o incentivo de amigos que acompanhavam seu trabalho e também com uma necessidade financeira, o ramo da tatuagem foi a saída que ele encontrou para se manter no meio que trabalhava, se estabelecer financeiramente e fazer o que gosta: arte.

Alef Freire tem seu estúdio em sua própria casa e consegue se manter financeiramente através da tatuagem. / Foto: Haline Farias

Crescimento e formalização

De acordo com Débora de Aragão, gerente UAI (Unidade de Atendimento Individual) do Sebrae Sergipe, são 69 MEIs de estúdios de tatuagem formalizados em Sergipe, sendo 35 em Aracaju. “São 69 em Sergipe, mas o número total de estúdios no estado com certeza é maior devido aos que trabalham na informalidade.”.

Débora conta que o número de pessoas desse ramo que procuram o Sebrae é pequeno. A maioria tem procurado devido à Vigilância Sanitária ter ficado mais exigente com os estúdios de tattoo, preocupados com questões de higiene e saúde.

“Como a Vigilância Sanitária está tendo uma exigência um pouco maior agora com os estúdios de tatuagem, então eles precisam ter o CNPJ e estarem formalizados. Sem O CNPJ a Vigilância Sanitária pode multar. Então, nós aqui do Sebrae incentivamos a formalização.”

A gerente UAI justifica que a baixa procura dos donos de estúdios pode ser em virtude da informalidade que era tão comum. “É questão de hábito. Era muita informalidade nessa área, agora que está crescendo os tatuadores começam a entender que é importante procurar uma instituição de apoio, como o Sebrae.”.

Artistas e suas telas vivas

Samille Justos, 30 anos, trabalhou por um tempo em sua área de formação, designer gráfico. Mas em um período de um mês, no qual ficou desempregada, o amigo tatuador Fábio Oliveira a convidou para aprender a tatuar. E nesse acaso, já trabalha como tatuadora há quatro anos e meio.

Samille Justo trabalha até hoje com o amigo e tatuador Fábio Oliveira. / Foto: Haline Farias

Samille conta que tinha muita resistência no começo quando foi aprender a tatuar. “Era um pouco resistente e tinha medo, pois é algo sério, definitivo.”. Mesmo assim continuou seus estudos e práticas de desenho e em dois meses já se sentia apta e confortável para tatuar, deixando de vez o mundo do designer para trabalhar apenas com tatuagem.

Mesmo com qualquer dificuldade que viesse aparecer no caminho, a tatuadora nunca pensou em desistir e desde o começo percebeu que tinha futuro. “Comecei a ver futuro nisso, por isso que eu investi em material, investi no meu tempo.”. Assim como Samille, Alef também nunca pensou em desistir e as coisas que aconteceram só o fortaleceram.

“Todos os momento que eu tive fraqueza mental em relação ao trabalho de tattoo foram só para eu poder remover aquilo e mostrar uma nova proposta. Isso acontece de diversas formas, a gente lida com várias questões na tatuagem, tanto do desenho, cliente, a pele, assepsia, questões biológicas, sangue. Foram mais debates entre essas questões que me fizeram crescer e amadurecer.”

Vídeo: Haline Farias

Os dois tatuadores nunca sentiram necessidade de sair de Aracaju para ter oportunidades no ramo. Alef já foi duas vezes para São Paulo e conseguiu fechar agenda lá, mas que fez isso por vontade própria para se descobrir na arte. “A tatuagem é algo que em qualquer lugar se aplica, então eu levo isso como uma forma itinerante.”. Já Samille conta que viajou algumas vezes para cursos de desenho, o que a ajudou muito.

O fato do mercado ter crescido se dá também pela demanda de pessoas que procuram se tatuar. Em 2013 a revista Super Interessante organizou uma pesquisa sobre tatuagens no Brasil com a participação de mais de 80 mil pessoas e 150 mil tatuagens mapeadas.

As tatuagens são feitas pelos mais diversos motivos, desde apenas uma identificação e gosto por um desenho ou estilo de tattoo, até questões emocionais. Samille percebe que as pessoas passaram a ver a tatuagem como uma expressão artística importante, expressando um gosto pela arte ou algum sentimento do momento que ela quer guardar. “O motivo mais recorrente […] são coisas emocionais ligadas a pessoas queridas, familiares e animais de estimação. A maioria das tatuagens são seguindo essa linha emotiva.”

Cláudia Valeria, 53 anos, tem apenas uma tatuagem, feita em 2017, foi um presente de aniversário para si mesma.

“Demorei para fazer uma tatuagem por não achar uma imagem que gostasse de ter realmente comigo para sempre. […] Quando meu filho me mostrou algumas tattoos e bati o olho no mapa mundi, falei ‘É essa que quero!’. Amo viajar e o mapa mundi me representa muito bem.”

Diferente de Cláudia, Edmilson Teixeira, 55 anos, já tem três tatuagens e fez sua primeira aos 15 anos, mesmo com a mãe não concordando muito com a ideia. Assim como Edmilson, Isabela Meneses, 27 anos, fez sua primeira tatuagem ainda muito jovem, com 14 anos, e seu gosto de tatuagem começou ainda na infância com programas na televisão. “Eu sempre assisti programas na TV que passavam ‘tribos’ de pessoas tatuadas e eu sempre me interessei por esse tipo de ‘tribo’.”.

Eduarda Ribeiro, 19 anos, tem duas tatuagens, fez a primeira em 2016 e em 2017 tatuou mais uma, as duas motivadas por questões emocionais e de identificação pessoal. Eduarda conta que deseja fazer mais tatuagens, mas para Isabela, fazer mais tatuagens já se tornou quase que impossível, pois, segundo ela, com 70% do corpo tatuado, já não sabe mais quantas tatuagens tem e o espaço na pele para tatuar tem diminuído.

Isabela Meneses é apaixonada por piercings e tatuagens . / Foto: Haline Farias

Claúdia conta que percebeu um aumento de estúdios de tatuagem em Aracaju e que agora ficam em locais mais visíveis. O mesmo percebeu Edmilson, que justifica esse crescimento com a diminuição do preconceito que muitas pessoas tinham com tatuagem. A tatuadora Samille também comentou sobre a diminuição desse preconceito e que as pessoas estão aceitando a tatuagem de uma maneira mais natural. Antes, ela era muito marginalizada, mas agora grande parte da sociedade já consegue ter uma visão artística da tatuagem.

Alef afirma que em Aracaju o ramo da tatuagem está em expansão. “Tem diversos artistas surgindo. […] Tem artistas visuais que estão migrando para a tatuagem ou pessoas que se identificam fazendo um desenho bom e veem a possibilidade de se tornar tatuador.”. A capital sergipana tem realizado muitos workshops e cursos voltados para o mercado da tatuagem, com temas sobre biossegurança ou áreas especificas de estilos de tattoos, assim afirmou Samille.

Esse crescimento do mercado pode trazer consequências positivas, como aumento de workshops e cursos, mas também negativas: mais competitividade. Mas para Alef “quem está preparado, essa ascensão é só como se fosse uma corrente para alcançar onde quer chegar”, Samille segue o mesmo pensamento e afirma que tem muita oportunidade para todo mundo, pois o público é muito vasto e a competitividade pode vim de forma positiva.

As expectativas, tanto para quem trabalha quanto para quem aprecia as tattoos, é de que o mercado só tem a crescer e ser mais valorizado. Segundo Alef: “Daqui para frente é só arte!”.

--

--