Os anos 80 continuam pop

Samuel Fernandes
Hello Band
Published in
6 min readJun 13, 2024

Pode ser um gatilho para quem está lendo, mas 1980 já faz mais de 40 anos. Sim, hits como Billie Jean e Like A Virgin já entraram ilustremente na seleta casa dos “enta”. Porém, estes e outros sucessos estão longe de terem seus dias de glória encerrados. Neste artigo, vamos falar sobre porque a música 80s está cada vez mais presente em playlists, como este gênero encontrou sua reinvenção e sua influência na música brasileira.

P.S.: Pode aproveitar também para curtir os sons!

O que caracteriza a música dos Anos 80?

Referência para a cultura pop num todo, os anos 80 foram responsáveis por levantar icônicos nomes na música e criar costumes que se fazem presentes até hoje, sendo uma década pautada pela revolução tecnológica e pelo sonho neon da vida no futuro.

No cinema, ela originou clássicos como Blade Runner (1982), O Exterminador do Futuro (1984) e De Volta Para o Futuro (1985). Na moda, criou tendências que se mantém atuais até hoje, como paetês, calças de cintura alta e maquiagens coloridas. Portanto, na música não seria diferente.

Nesta época, surgiu o movimento New Wave, que deu seus primeiros passos nos anos 70, mas cresceu mesmo na década seguinte.

Duas das grandes características do New Wave eram sua abordagem pop humorística (até peculiar) e o uso de notas angulares no instrumental, uma técnica resgatada do jazz, que consiste em incluir notas fora da escala tonal da música a fim de criar tensão e dar complexidade à composição.

Época de reis e rainhas, como Michael Jackson e Madonna, a década foi responsável pela ascensão de boy bands e de hits que embalaram trilhas de clássicos do cinema, como Footloose, Top Gun e Curtindo a Vida Adoidado. Algo que dava muito certo na época e que continua trazendo frutos até hoje.

Coisas estranhas acontecem

A série Stranger Things é um dos maiores sucessos da Netflix na história e não à toa. Além de um bom enredo e uma perfeita sinergia entre personagens, a produção soube nadar entre referências dos anos 80, compreendendo que a nostalgia conforta, cria pertencimento e nos conecta com uma parte de nós que, em muitos casos, se encontrava esquecida.

Mas algo “esquecido” nem sempre permanece assim. Exatamente o caso de Running Up That Hill, a música sucesso de 1985 de Kate Bush, que, após ser inserida numa das cenas mais importantes da quarta temporada de Stranger Things, retornou ao Top 100 da Billboard, alcançando a 8ª posição e batendo a extraordinária meta de 1 bilhão de reproduções mundiais no Spotify. Um sucesso repentino e espontâneo que surpreendeu até a cantora:

“Um bilhão de streams. Tenho a imagem de um rio que, de repente, inunda e se torna muitos, muitos afluentes — um bilhão de afluentes — a caminho do mar. Cada uma dessas correntes é um de vocês… Obrigada! Muito obrigada por enviar esta música em uma jornada tão incrivelmente surpreendente. Estou espantada.”

Kate Bush em seu site oficial

Como os anos 80 aparecem no pop atual

Mas Stranger Things não foi o precursor disso tudo e, sim, um beneficiado. A nostalgia dos anos 70 e 80 (e, muito em breve, os 90 também) está em voga há muito tempo e se tornou artigo de apreço de grandes nomes da música pop, que encontraram no estilo sua pegada perfeita e uma forma de reinventar sua discografia.

Um exemplo evidente disso é o The Weekend, que desde o lançamento do seu álbum Starboy, em 2016, vem inovando sua estética de forma brilhante (até de forma literal), com forte inspiração no New Wave, resgatando a batida eletrônica da música Disco, algo que também replicou nos trabalhos seguintes, After Hours (2020) e Dawn FM (2022).

A britânica Dua Lipa é outra artista pop que abraçou completamente o ritmo em seu Future Nostalgia (2020), criando uma lista de músicas e uma turnê com tudo que um sucesso dos anos 80 precisa: batidas dançantes de Disco; coreografias performáticas; figurinos coloridos e espalhafatosos (no melhor sentido); e refrões contagiantes para cantar sem medo de ser feliz.

Um trabalho que, de fato, agradou tanto ao público mais novo que teve contato com este tipo de manifestação musical pela primeira vez quanto a quem viveu a época e sentia falta de algo do tipo na música popular. Se você ainda não escutou, fica aqui a indicação da Hello Band.

Tendência viva não apenas no pop

Mas se engana quem pensa que os anos 80 viveram apenas de discotecas e roupas coloridas.

Logo no início da década, o Pós-Punk e a cultura underground se tornaram terreno fértil para o surgimento de sucessos como The Cure e Joy Division. O New Wave do metal também recebeu inúmeras vertentes, consagrando bandas como Metallica (também presente na 4ª temporada de Stranger Things) e Iron Maiden. Além do casamento perfeito do rock e do pop, que inspirou bandas como Queen e The Police.

Com isso, vê-se que o rock dos anos 80 não apenas era um grande expoente, como também capaz de unir diferentes técnicas, certo?

Foi exatamente isso que a Miley Cyrus compreendeu ao pensar seu álbum Plastic Hearts (2020), uma homenagem poderosa a grandes nomes do rock da época, como a Blondie, que está “presente” no álbum com um cover de Heart Of Glass, hit de 1978.

No Brasil também

Já em terras brasileiras, a década de 80 começou com uma árdua tarefa: superar a anterior, que foi berço de álbuns como Acabou Chorare, Elis & Tom, A Tábua de Esmeralda e o icônico Clube da Esquina — recentemente eleito o 9º melhor álbum da história.

Com este grande repertório em mãos e uma forte necessidade de se libertar da repressão política (afinal, o Brasil passava por um grande momento ditatorial), o rock nacional encontrou seu ambiente perfeito para evoluir sua essência.

Os Paralamas do Sucesso, Blitz, Legião Urbana, Cazuza e tantos outros nomes ditaram o que seria o pop rock brasileiro, com influência direta no Pós-punk e no New Wave, mas com um toque latino.

Esta década também foi casa para Mano Brown, Edi Rock, Ice Blue e KL Jay, fundadores do Racionais MC’s, no ano de 1988. Após um enorme sucesso e a revolução da cena do rap brasileiro, Mano Brown revisitou os anos 80 quase três décadas depois, mas agora com um olhar diferente, para lançar seu primeiro disco solo: Boogie Naipe (2016). Seu trabalho de estúdio que, junto a nomes como William Magalhães (Banda Black Rio), presta homenagem ao Soul brasileiro:

“O William veio com toda a bagagem dele de Soul Music e eu trouxe a coisa de São Paulo, da massa, do povão, da periferia. E eu sempre achei que o Soul tem tanto a ver com a periferia quanto o rap.”

Mano Brown em entrevista para o Vagalume

Outro artista que, com maestria, adotou a proposta de trazer o ouro dos anos 80 de volta à música atual é o rapper mineiro FBC, que após resgatar o funk anos 90 e 2000 no álbum BAILE (2021), lançou seu novo trabalho, que convida o público a mergulhar de cabeça na Dance Music, com direito a tudo, desde coral no melhor estilo Tim Maia até impecáveis instrumentais de metais que formam um casamento perfeito com cada set de DJ.

O nome do álbum é: O AMOR, O PERDÃO E A TECNOLOGIA IRÃO NOS LEVAR PARA OUTRO PLANETA; e eu vou dispensar explicações, e apenas te recomendar que abra seu aplicativo de músicas agora mesmo e o escute. Garanto que não vai se arrepender.

Os anos 80 voltaram com tudo, o que já era esperado com a nostalgia tão em evidência em tudo. Lá atrás, em 1976, Belchior nos avisou: “Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais. Nossos ídolos ainda são os mesmos”. Portanto, é normal que novas gerações reproduzam os hábitos de antigas, mas que também adicionem sua personalidade.

E, no fim das contas, esta tendência não é algo a ser combatido, mas, sim, apreciado. Porque seja no celular ou no disco de vinil, o importante é curtir este som que está mais vivo do que nunca!

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