Manifestações Patológicas em Construções Habitacionais de Pessoas de Baixa Renda

Alice Almeida
hexágono
Published in
4 min readJun 19, 2019

Clique aqui para ler a pesquisa na íntegra 📋

“Estudo da doença” é o significado etimológico de uma das palavras-chave da iniciação científica do estudante Alberto Colares. Em primeiro momento, você pode achar que se trata de um projeto no campo da saúde, como de Medicina ou Enfermagem, mas na verdade esse PIBIC pertence à área de Engenharia Civil, por abordar as diversas doenças que uma casa pode ter.

Alberto sempre gostou de matemática e escolheu estudar Engenharia quando viu uma notícia sobre o baixo número de engenheiros no Brasil. Quando passava por uma fase de desânimo com o curso (quem nunca né?), descobriu o ramo da patologia da construção, e foi aí que ele pensou:

“Pô, to fazendo Engenharia Civil, como posso ajudar a melhorar a situação do meu bairro?”

Morador do bairro da Glória, que como muitos de Manaus não é um bairro planejado, ele já observava por fora os problemas variados que as casas dali apresentam. Por falta de recursos financeiros, pessoas costumam praticar a autoconstrução, ou seja, o futuro morador constrói a própria casa à sua maneira com os seus próprios meios.

“Além do descumprimento de leis e normas, a autoconstrução pode levar ao aparecimento de manifestações patológicas inerentes a diversas etapas do processo construtivo, desde a escolha dos materiais até a execução.”

Mas a pesquisa de Alberto chama atenção por ir além dos estudos teóricos. Depois que ele viu uma palestra da professora Ivana Soares sobre patologia das edificações, estudou sobre o assunto em livros da biblioteca e então procurou a professora, que ainda era nova no departamento e de imediato se prontificou a orientá-lo na pesquisa. Em três dias eles terminaram o pré-projeto do PIBIC, pronto pra ser submetido. E é claro que foi aprovado 👏.

O projeto atendeu à seguinte proposta: entrevistar e visitar 10 casas que foram autoconstruídas na zona Oeste, identificar as manifestações patológicas nessas moradias e produzir um manual de pequenas intervenções com base nos problemas encontrados. Para realizar essa pesquisa de campo, primeiro ele criou um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, a ser assinado pelos voluntários. Após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa, Alberto pôde continuar.

Ele conheceu alguns moradores do bairro e os convidou para participar do projeto. Nas visitas agendadas, conversou um pouco sobre a casa e aplicou um questionário sobre a percepção dos moradores em relação às manifestações patológicas. Para a vistoria, fez uso de ferramentas como lupa, trena, fissurômetro, paquímetro, régua e máquina fotográfica. Todas essas etapas ajudaram Alberto a entender a origem, causa e efeito dos problemas. As visitas ocorreram entre dezembro de 2017 e fevereiro de 2018.

Manifestações encontradas

Em todas as casas vistoriadas foram encontrados casos de fungos nas paredes ou teto, causados pelo clima quente e úmido da nossa região, e em 90% havia ocorrência de trincas, fissuras ou rachaduras. Além disso, problemas como desplacamento da camada de tinta ou reboco, corrosão nas lajes, afundamento do piso e infiltração por umidade (ou eflorescência) também foram detectados.

Quadro elaborado para o relatório do PIBIC de Alberto, que tá disponível aqui.

A partir disso tudo, foi elaborado o Pequeno Manual de Pequenas Reformas: um guia prático para cuidados com a casa, que foi distribuído para as 10 famílias que se voluntariaram para a pesquisa, além de 50 exemplares para o restante da comunidade. Detalhes sobre como resolver os problemas citados e por quê eles ocorrem podem ser vistos neste link 😉.

Captura de tela de uma das páginas do manual. Acesse!

O PIBIC de Alberto ainda rendeu participação no XLVI Congresso Brasileiro de Educação em Engenharia e a publicação de um capítulo no livro Contribuições ao estudo de Patologia e materiais de construção.

Lei da Assistência Técnica

Desde 2008, existe no Brasil a chamada Lei da Assistência Técnica à Moradia de Interesse Social, que assegura às famílias de baixa renda assistência técnica pública e gratuita ao projeto e à construção de moradias. Até hoje, muitas pessoas que poderiam se beneficiar por essa lei não têm conhecimento sobre ela, e por isso, perdem a chance de melhorar a qualidade de vida de suas famílias.

“A falta da elaboração de projeto e de auxílio técnico de profissional arquiteto ou engenheiro civil, associados à qualidade dos materiais e da mão de obra pode ser apontada como fator origem das manifestações patológicas.”

Alberto ressalta a importância da divulgação dessa lei, para que ela chegue em todas as comunidades e possa então ser efetiva. Por conta das manifestações patológicas, algumas pessoas que o pesquisador conheceu nas visitas apresentavam sérios problemas respiratórios, causados pelas infiltrações e pelos fungos. Para uma família que é grata por ter um lugar para morar, construído com base em economias de uma vida toda, infelizmente, saúde é um luxo; devemos lembrar, no entanto, que para o governo é um dever, o qual cabe a todos nós cobrar.

--

--