A piada acabou

Samir Mello
HIGH FIVE
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16 min readNov 14, 2018

Os Clippers estão tentando se transformar em algo diferente daquele outro time de L.A.

Por Howard Beck
Traduzido por
Samir Mello
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LOS ANGELES — Steve Ballmer está gritando comigo.

Quer, dizer, não é bem assim. Steve Ballmer está gritando na minha direção. Para ser sincero, ele está mais implorando, desejando, persuadindo vigorosamente do que gritando. O volume aumenta proporcionalmente ao entusiasmo. E o entusiasmo dele é sem limites.

Você provavelmente já o viu antes: Ballmer empolgando insanamente os torcedores do Los Angeles Clippers, time do qual ele é dono desde 2014. Dançando ao som da Fergie em um jogo em casa. Pulando, gritando e cantando como um palestrante motivacional em seu antigo emprego como CEO da Microsoft: “Desenvolvedores! Desenvolvedores! Desenvolvedores!”

O homem é animado, especialmente ao discutir suas maiores paixões. No momento, essa paixão são os Clippers. E ele acabou de ser perguntado algo importante — talvez a mais crítica das perguntas — sobre o destino de sua equipe.

No próximo verão, os Clippers terão espaço para assinar não um, mas duas superestrelas. Kevin Durant estará disponível, assim como Kawhi Leonard e Jimmy Butler, e talvez Kyrie Irving. Meia-dúzia de outras estrelas irão se juntar a eles em um dos mercados de agentes livres mais visados de todos os tempos.

Nenhum agente livre superestrela nunca escolheu os Clippers. Porém, poucos tiveram a chance. Durante décadas, os Clippers nem se incomodaram em perguntar. Mas era uma época diferente, outro dono, outra realidade. Tudo mudou.

A atual edição dos Clippers acabou de completar os melhores cinco anos na história da franquia, encantando os torcedores com um basquete vibrante e arrojado. Apenas os Warriors e os Spurs venceram mais jogos entre 2012–13 e 2016–17. Os Clippers de hoje são competidores. Eles superam dificuldades. Eles investem. Eles exigem sua atenção e respeito.

No entanto, as estrelas que motivaram esse progresso não estão mais lá — Chris Paul em Houston, Blake Griffin em Detroit, DeAndre Jordan em Dallas — deixando os Clippers com um quadro em branco, uma folha de pagamento enxuta e a chance de construir algo talvez ainda mais significativo quando o próximo período para contratações abrir em julho. Então, eu faço a seguinte pergunta para Ballmer, em uma noite de outubro: qual é o seu apelo?

Ele começa a responder antes da pergunta terminar, se dirigindo diretamente a mim. De repente, eu sou Kevin Durant. Eu sou Kawhi Leonard.

“Você quer ter um legado?”, Ballmer pergunta. “Você quer poder dizer que esteve envolvido em algo super especial? Você vem pra cá”, ele diz, o volume e a intensidade aumentando rapidamente. “Você estará em L.A., o maior mercado do mundo, e você poderá dizer às pessoas: ‘Eu sou o cara! Eu fui para a franquia que nunca ganhou nada! Eu sou o cara! Eu fiz acontecer! Eu tenho um legado!’”

Cada “eu” é mais enfático que o anterior, vocalizados com um leve urro, os pontos de exclamação se multiplicando conforme ele continua, suas palavras ditas com um fervor evangélico.

Essa modesta suíte, onde nós nos encontramos para um jogo de pré-temporada no Staples Center, mal consegue conter a energia e o otimismo de Ballmer. Durante a conversa, ele, em diversos momentos, bateu palmas, fechou ambos os punhos, bateu na mesa e gritou de forma tão animada que fiquei em dúvidas em reproduzir suas falas em negrito, itálico, tudo em maiúsculas ou de todas essas formas ao mesmo tempo.

Quando o sermão de Ballmer acabou, o ouvinte está praticamente procurando um contrato para assinar. Quem não ia querer viver aqui, jogar aqui, vencer aqui?

Há mais de uma resposta para essa pergunta. Há outro time no fim do corredor, que já venceu 16 campeonatos e possui um passado glorioso. Um time que acabou de contratar LeBron James, o melhor jogador de sua geração. Esse time vai ter espaço na folha salarial no próximo verão também.

Os Lakers? Sim, os Clippers já ouviram falar deles. Mas eles estão realmente determinados a criarem o seu próprio espaço nesta cidade de 13 milhões de habitantes, a qual, durante mais de três décadas, mal teve tempo para pensar nos Clippers.

Eles têm uma visão: o time brigador, de colarinho azul, que apela à classe trabalhadora numerosa da região, em contraste à imagem glamourosa dos Lakers.

Eles têm os recursos: valorado em US$ 42 bilhões, Ballmer é o dono mais rico dos esportes americanos. Ultimamente, ele tem usado essa fortuna para melhorar o gerenciamento e departamento médico dos Clippers.

Eles têm um plano: usar seus prováveis US$ 70 milhões na folha salarial para atrair duas estrelas no próximo verão e criar um contender instantâneo.

E eles têm o próprio Ballmer: um líder, empolgado, entendedor de marketing e um nerd de basquete cuja própria ascensão à proeminência após origens humildes encontra identificação fácil com atletas profissionais.

Jogadores notam essas coisas. Incluindo o que foi 4 vezes MVP e que agora reside no fim do corredor.

“Eu acho que um dono que cuida de seus jogadores e fará qualquer coisa para eles terem êxito, ele atrai atletas mais facilmente”, James declara. Embora ele não conheça Ballmer pessoalmente, James diz, “Caras se identificam com pessoas que ligam para a franquia, que querem ver seus jogadores sendo excelentes e são tão animados em estar no jogo quanto os próprios jogadores.”

É preciso mais do que paixão para construir um vencedor na NBA, mas é um bom lugar para começar. Atrai outras pessoas com intenções parecidas.

No último ano, os Clippers contrataram Jerry West, o executivo mais respeitado da história moderna, como consultor. Eles atraíram dois executivos conceituados — Trent Redden (assistente elogiado de David Griffin em Cleveland) e Michael Winger (que trabalhou com Sam Presti em Oklahoma City) — para reforçar a gerência do time, junto com o respeitado Mark Hughes (New York).

Este é, sem exagero, um momento inédito na história da franquia — com um dono competitivo e presente no comando, uma equipe técnica inteligente, um técnico vencedor (Doc Rivers), uma imagem esculpida pelo seu recente sucesso e, ah, sim, todo esse espaço na folha salarial.

Não há garantias, é claro. E a competição por estrelas será intensa, com tanto as franquias de Nova York e as duas equipes de L.A. tendo espaço na folha no próximo verão. Algumas estrelas deverão permanecer no mesmo lugar. Alguns times ficarão de mãos abanando. E, no entanto, a equipe de Ballmer está extremamente confiante.

Não, os Clippers nunca foram um destino para superestrelas. Mas esta versão dos Clippers não existia até então.

“Vocês vão amar este time”, Rivers falou ao microfone, com sua voz grave ressoando pelo USC’s Galen Center. “Vocês vão realmente amar estes caras”.

A audiência é um grupo de pessoas que possuem ingressos para toda a temporada, e eles irão acompanhar um treino aberto no começo de outubro. Os fãs dos Clippers podem precisar de um pouco mais de incentivo agora, e possivelmente uma foto para reconhecer o elenco, em meio a este período de transição.

Durante 5 anos, eles acompanharam temporadas de mais de 50 vitórias, classificações para os playoffs e uma sequência interminável de alley-oops — Paul para Griffin, Griffin para Jordan, Jordan para Griffin. Lob City, eles batizaram. Os Clippers nunca se classificaram para as Finais de Conferência, porém, poucas equipes eram mais emocionantes de acompanhar.

Tal era, na prática, acabou quando os Clippers trocaram Paul para os Rockets em junho de 2017. Eles logo renovaram com Griffin, por cinco anos, a US$ 171 milhões, mas mudaram de curso seis meses depois, trocando Blake para os Pistons em uma negociação na qual eles receberam Tobias Harris, Avery Bradley, Boban Marjanovic e duas escolhas no draft. Jordan foi o último a sair, se juntando aos Mavericks na última off-season como um agente livre.

O que permaneceu foi uma coleção de veteranos sólidos bons (Bradley, Pat Beverley) e muito bons (Harris, Lou Williams, Danilo Gallinari), mas sem uma estrela fundamental. A esperança é que o promissor armador Shai Gilgeous-Alexander — indiretamente adquirido junto a uma das picks de Detroit — se desenvolva e chegue a um papel de liderança.

Por agora, o plano é confiar na profundidade, raça e defesa, criando, tomara, um novo apelido (embora não tão bom): Clamp City.

“Acho que nós somos um time mais raçudo”, Beverley afirma. “Somos um time mais faminto, com mais sede. Somos uma equipe”.

O objetivo é uma vaga nos playoffs, embora pareça improvável. Há uma leve sensação de orgulho no ar.

Os Clippers justificaram seus planos mirabolantes nos primeiros dias da temporada, ao bater o Thunder por 16 pontos e ao superar os Rockets duas vezes. Eles perderam a revanche contra Oklahoma City, mas confirmaram sua nova identidade quando Beverley fez uma falta dura em Russell Westbrook e os dois quase foram às vias de fato.

Vencer mais de 50 jogos por ano foi divertido, é claro, mas ter a chance de reformar a imagem e estilo da equipe é, nas palavras de Ballmer, “duas vezes mais divertido”.

Cada vitória brigada agora traz um benefício extra, uma propaganda sutil para a próxima classe de agentes livres.

“Se você quiser vir pra cá, nós adoraríamos tê-lo”, Beverley afirma. “Se não, nós vamos f… com você”.

A vibe underdog combina com os Clippers, já que eles habitaram a sombra dos Lakers por todos esses anos. Está até presente no seu slogan, “L.A. da nossa maneira”, o qual coloca um pouco de distância entre eles e aquele outro time da NBA.

“Se nós vamos pegar o tipo de cara que nós queremos, as pessoas têm que saber sobre os nossos valores”, Ballmer explica. “Eu quero que nós joguemos defesa. Eu quero que nós sejamos resilientes”.

Aqui, Ballmer reforça a imagem de underdog dos Clippers, acreditando que irá atrair um certo tipo de Angeleno para sua franquia.

“Nossos fãs vão dizer, ‘Nós estamos com vocês. Nós estivemos com vocês em momentos piores’”, Ballmer acredita, e de repente, sua boca fica mais tensa, sua face se contorce e ele fecha os punhos novamente. Sua voz começa a urrar o lema dos torcedores dos Clippers: “Nós somos resilientes! Nós somos leais! Nós somos apaixonados!”

O ambiente parece vibrar um pouco.

Ahistória de Steve Ballmer é aquela do self-made man — filho de imigrantes europeus que construiu sua própria fortuna. Porém, como um dono da NBA, ele mesmo admite: “Eu nasci na marca do pênalti”.

A piada esconde sua modéstia, mas é basicamente verdade. O time comprado por Ballmer em 2014 já tinha três estrelas estabelecidas, um técnico realizado e pouco espaço ou razão para mudanças.

“Você não quer se meter muito, mesmo que você pense que sabe o que está fazendo”, Ballmer diz.

Então ele gerenciou a situação com cuidado e aproveitou as vitórias. Ao mesmo tempo, ele também sofreu com os fracassos da equipe: os desastres nos playoffs, as gafes, as reclamações constantes com os árbitros.

“Era um problema para nós”, Ballmer diz. “Nós éramos reclamões. Certo? Éramos conhecidos por isso. Você não quer ser assim. Nós não queremos ter essa fama”.

As vitórias e reclamações estavam conectadas, então Ballmer deixou o barco seguir. Quando chegou a oportunidade de refazer o elenco após a troca envolvendo Paul, os Clippers tentaram reviver Lob City.

Eles deram um contrato máximo para Griffin. Eles juraram que ele seria um Clipper por toda sua carreira. Eles se agarraram a sentimentalismo.

“Blake é um franchise player”, Ballmer afirma. “Ele foi recrutado por nós. Fazia todo sentido para nós querer que funcionasse com ele”.

Porém, os Clippers encontraram dificuldades na última temporada, Griffin se machucou novamente e a direção do time, repentinamente, alimentou ideias de uma reconstrução. Eles mandaram Griffin para Detroit. Os torcedores ficaram chocados. Griffin, furioso.

Uma reviravolta completa? Sim, mas as circunstâncias haviam mudado, Ballmer explica, e os Clippers precisaram ser “ágeis”.

Quanto a Griffin? O contrato máximo de cinco anos que ele conseguiu dos Clippers foi mais longo e rentável do que qualquer outro time poderia ter oferecido.

“Eu tenho uma certeza: nós pagamos bastante dinheiro extra para Blake”, Ballmer diz. “Então, pelo menos financeiramente, nós fomos corretos com ele”.

A troca foi quase uma unanimidade entre os executivos rivais e comentaristas — um pequeno motivo de orgulho para Ballmer e sua nova equipe técnica. Ter o envolvimento de West, Ballmer revela, “deu confiança para as pessoas no sentido de saber o que estávamos fazendo”.

“Nós saímos muito bem depois daquela troca”, West declara. “Isso tudo se trata do desejo de Steve em construir uma equipe que tenha longevidade, e não dure só um ou dois anos. Nós temos um bando de ótimos jogadores no momento”.

Há uma curva de aprendizado para cada novo dono, não importa o quão bem-sucedido eles sejam em outros campos. Comandar uma franquia da NBA é diferente de qualquer outra coisa. Alguns donos nunca compreendem. Excesso de confiança, ego e impulso de microgerenciar já atrapalharam muitos donos.

Tal cenário parece distante de Ballmer, que frequentemente é descrito como alguém modesto, sociável e um ouvinte atento por todos ao seu redor.

“É impressionante sua total falta de ego”, afirma West, que trabalhou com quatro times em mais de 40 anos. “É uma alegria estar perto dele. Ele é divertido, focado e sabe o que quer “.

Próximo dos escritórios da franquia em Playa Vista (operações de basquete) e no centro (negócios), todos se referem ao dono simplesmente como “Steve”. E quando Steve vai ao escritório ou está em um jogo, invariavelmente ele está usando uma camiseta polo dos Clippers. Ele é alegre e conversador. Ele sabe o nome de todo mundo.

E ele tem consciência de suas limitações. Um fã de basquete devoto — ele foi criado fã do Detroit Pistons e ainda ama a era dos Bad Boys — Ballmer compreende os limites do seu conhecimento nesta nova arena. Ele compara a comandar a Microsoft, outro negócio no qual ele confiou em conhecimento especializado o qual ele não tinha.

“Em uma empresa de software, você tem essas pessoas chamadas de engenheiros”, Ballmer explica. “E se você não for um deles, da mesma forma que você não é um profissional do basquete, você tem que entender qual seria seu envolvimento apropriado”.

Então, Ballmer diz que faz muitas perguntas. Ele estabelece parâmetros e expectativas, oferece sugestões e ocasionalmente dá seu voto de minerva em grandes decisões. Mas ele afirma que não se lembra de uma única vez na qual tenha vetado sua equipe especializada.

Levou um tempo até ele se sentir seguro para fazer grandes movimentações.

Quando Ballmer chegou, Rivers já era tanto o técnico como o presidente das operações de basquete — uma dinâmica problemática que durou até agosto de 2017, quando Ballmer aliviou Rivers das obrigações executivas e promoveu Lawrence Frank para o cargo.

Há uma ponta de arrependimento quando Ballmer discute a decisão — um entendimento de que deveria ter sido feito antes.

Em quatro anos, Rivers trocou três escolhas de primeiro round — incluindo uma para se livrar do salário de Jared Dudley e uma para adquirir Jeff Green, um favorito de Rivers, que acabou disputando apenas 27 jogos com os Clippers (A franquia também enviou uma escolha de primeiro round de 2013 para Boston, como compensação por ter liberado o técnico de seu contrato com os Celtics).

“Nós queremos um time no qual obtemos o máximo de retorno dos caras que estão aqui, não somos bobos”, Ballmer afirma. “Se você olhar para trás, nos últimos cinco, seis anos, foram feitas algumas movimentações que eu diria, agora, ‘Jesus, agora que eu estou aqui há mais tempo, eu não daria uma escolha de primeira rodada por Jeff Green’. Nós não estávamos tão perto de um título quanto pensávamos. Nós não deveríamos ter feito essa negociação”.

Porém, reorganizar as obrigações de Rivers, Ballmer diz, foi mais sobre reconhecer que o cargo de presidente da equipe necessitava de foco total. Frank estava trabalhando com Rivers na gerência antes de ter sido promovido por Ballmer.

“Havia alguns assuntos que eu queria discutir com Lawrence, não Doc”, Ballmer revela, se referindo a operações de basquete. “Doc era, como eu diria na Microsoft, uma camada desnecessária”.

Quando os Clippers tiveram dificuldades na última temporada, parecia que Rivers perderia seu cargo de técnico também. Porém, Ballmer o bancou, e Rivers respondeu com, o que muitos consideram, um de seus melhores anos, guiando um grupo humilde para um recorde de 17–16 após a troca de Griffin.

E lá estava: força, resiliência, raça. Todos os ideais que Ballmer estava pregando.

Naesquina da Venice Boulevard com a Normandie Avenue, você encontrará um centro recreativo. Lá, você verá três quadras de basquete novas em folha. Em cada uma dessas quadras, há um logotipo: um grande e azul C, envolto por um LA vermelho.

Eventualmente, haverá cerca de 350 dessas quadras públicas renovadas em Los Angeles, um investimento de mais de US$ 10 milhões, cortesia de Steve e Connie Ballmer.

Filantropia tem sido uma missão definidora da vida pública de Ballmer. É uma das primeiras coisas mencionadas por West quando perguntado sobre o que torna Ballmer especial — “Ele tem alma para as coisas”, West afirma.

O prefeito de Los Angeles, Eric Garcetti, havia vislumbrado um esforço conjunto, envolvendo múltiplos doadores, cada um patrocinando algumas quadras. Ballmer respondeu com seu próprio questionamento: “Por que não fazemos todas elas?”

“Eu fiquei comovido, mas não surpreso”, Garcetti afirma. “Eu estava comovido porque foi algo inédito. Mas eu não fiquei surpreso, porque eu conheço os Ballmers. E eles fazem gestos grandiosos”.

O comprometimento em renovar cada quadra pública de basquete até o fim de 2021 demonstra bem isso. A presença do logotipo dos Clippers sugere uma motivação secundária: um sutil esforço de conquistar as mentes e os corações dos torcedores de L.A. Ou pelo menos daqueles que ainda não torcem para aquele outro time.

Os Clippers acreditam que existe uma legião de torcedores ainda não conquistados na região — os trabalhadores, excluídos, artistas e tipos da contra-cultura que podem não se identificar com a imagem hollywoodiana dos Lakers. O time pediu um estudo de marca de seis meses que chegou a essa conclusão.

“De algumas maneiras”, explica Gillian Zucker, presidente de operações de negócios dos Clippers, “é um anti-vira-casaca. Mas eles estão 100% comprometidos, e há algo de mágico nisso”.

Passo a passo, os Clippers estão criando o seu próprio espaço.

Quando Rivers chegou em 2013, ele ordenou que as faixas dos títulos dos Lakers fossem cobertas no Staples Center em jogos dos Clippers. Ballmer dará um passo além, com planos para uma nova arena financiada privadamente em Inglewood — apenas alguns blocos do Forum, a antiga casa dos Lakers.

O projeto enfrenta um potencial problema legal com o atual dono do Forum — o dono dos Knicks, James Dolan -, mas Ballmer está confiante de que irá prevalecer. O objetivo é se mudar em 2024, quando o aluguel dos Clippers com o Staples se encerra.

“Nós queremos nossa própria casa”, Ballmer afirma. “Eu acho que é algo importante para nós”.

Estamos há 90 minutos do tipoff no Barclays Center, no Brooklyn, e o público antes do jogo começar é maior do que o normal, devido ao oponente: o Golden State Warriors. Parado próximo ao banco dos visitantes está um rosto familiar: Lawrence Frank.

É uma cena curiosa. Presidentes de times raramente comparecem a jogos que não envolvem sua própria equipe. Mas ali está Frank, próximo à quadra durante o aquecimento dos Warriors. Ele também foi visto em Oakland contra Oklahoma City.

Em uma liga comandada por paranoia e cinismo, essas coisas são notadas — e viram fofoca.

“Recrutando KD e Klay”, um olheiro rival comenta ao ver Frank.

Executivos não podem recrutar abertamente jogadores de outras equipes durante a temporada; isso seria aliciamento. Porém, estar presente e visível — mesmo que só para dizer ‘olá’ — não é ilegal. Executivos rivais ouviram que Frank ou um de seus tenentes pretendem estar presentes regularmente em jogos envolvendo os Warriors (para ver Durant e Klay Thompson) e os Raptors (Leonard) durante toda a temporada.

Ao ser questionado sobre isso posteriormente, Frank sorri e diz que está apenas fazendo o seu trabalho: estar em todos os lugares, observar todo mundo e coletar a maior quantidade de informação possível. Nesse caso, suas viagens o trouxeram à cidade na mesma época que os Warriors estão aqui. A família de Frank é de New Jersey.

Todas essas coisas podem ser verdade ao mesmo tempo. E ninguém poderia culpar os Clippers por ser superagressivos neste momento único da franquia. Eles têm uma chance real no próximo verão de fazer o que eles nunca fizeram antes: contratar uma estrela como agente livre.

Kobe Bryant considerou a mudança em 2004 antes de acabar renovando com os Lakers. James se encontrou com membros dos Clippers em 2010, mas ninguém acredita que ele considerou seriamente ir para a franquia.

Enquanto decidia seu próprio futuro no último verão, James afirma que ele “nunca teve visões de jogar pelos Clippers”, mas notou, “Quero dizer, para ser honesto, eu não tinha visões, até os últimos meses, de vir para cá [para os Lakers]”.

James acrescenta: “Eu posso dizer que há uma atmosfera mais positiva aqui desde que Ballmer passou a comandar a franquia”.

É possível que eles não consigam ninguém. Leonard poderia permanecer em Toronto. Butler, que está tentando forçar sua saída de Minnesota até a data limite para trocas em fevereiro, poderia assinar com qualquer time que o adquira. Durant pode escolher New York ou Brooklyn.

E, no entanto, um executivo rival considera os Clippers “a situação mais atrativa para agentes livres entre todas as opções, porque nenhum agente livre quer ser o número 2 de LeBron. E eles podem se tornar o maior jogador da história de uma franquia em um mercado incrível com o dono mais rico da liga. Por que isso não te animaria?”

Havia um tempo em que ninguém usaria as palavras “ânimo” e Clippers juntas. Em uma reportagem de capa da Sports Illustrated de abril de 2000, eles foram nomeados “A Pior Franquia nas Histórias dos Esportes” graças a décadas de derrotas, negligência e à gerência incompetente do antigo dono Donald Sterling.

O estigma ainda estava lá em 2011, quando Paul chegou via troca de New Orleans. Importante lembrar: ele estava tentando ser trocado para os Lakers na época.

Quando Paul foi embora no último ano, a transação foi vista como rotineira, time e jogador em jornadas divergentes. Não foi um sinal de estigma ou da disfunção pela qual os Clippers ficaram conhecidos. Apenas negócios. Ninguém tripudiou.

“Eles definitivamente mudaram”, afirma um importante agente, que acrescenta estar ansioso para levar seus clientes para lá. “Eu sei que Ballmer quer vencer, é competitivo, não se importa em pagar a multa e está bastante envolvido”.

Rivers revela que tinha dois objetivos quando veio para a equipe: vencer um campeonato e tornar os Clippers um destino atraente. O primeiro item ainda não foi realizado, mas o segundo já é uma possibilidade.

“Nós já vencemos bastante”, Rivers afirma. “Eu acho que quando você escuta ‘Clippers’, você não pensa mais…clippers”.

Há dois verões, Durant se reuniu com os Clippers por respeito, mesmo eles não tendo o espaço para assinar com eles.

Na próxima vez que um candidato a MVP apertar as mãos de Ballmer, Frank e Rivers, eles acreditam que será logo após ele ter assinado seu nome em um contrato que transformará a franquia.

“Pela primeira vez desde que eu estou aqui”, Ballmer revela, “nós estamos decidindo quem nós queremos ser, quem nós podemos ser”.

E se esse momento chegar, observadores devem proceder com cautela — e dar espaço para a maior sessão de gritos, punhos para o alto fechados e danças da história dos Clippers.

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Samir Mello
HIGH FIVE

Jornalista do portal Metrópoles e Mestre em Tradução pela City, University of London; passagens pelas redações do Jornal de Brasília e Correio Braziliense