Pode apostar nisso!

Samir Mello
HIGH FIVE
Published in
5 min readMay 27, 2019

Kawhi pode ficar só um ano em Toronto, porém, ao ser a figura principal da primeira classificação da franquia para as Finais, Leonard mostra que, na NBA, às vezes é necessário arriscar

Por Samir Mello

…e os humilhados foram exaltados. Com uma vitória por 100 x 94 no Jogo 6, em Toronto, contra o Milwaukee Bucks, os Raptors carimbaram o passaporte para as primeiras Finais da história da franquia. História que vinha sendo construída em cima de frustrações, decepções e abandonos.

Tracy McGrady deixou a cidade antes de atingir por completo seu potencial. Vince Carter sucumbiu com o peso das expectativas. Chris Bosh preferiu se juntar aos amigos em Miami. E, mais recentemente, Lowry e DeRozan, apesar das boas companhas em temporada regular, não conseguiram destronar o Rei.

Pois bem, LeBron foi para o Oeste. Com um dos principais pesadelos de Toronto fora do caminho, o GM Masai Ujiri poderia tentar uma nova campanha com o mesmo grupo. Afinal, eles tinham o Técnico do Ano, Dwane Casey, responsável por levar a equipe à pós-temporada em 5 dos 7 anos em que trabalhou nos Raptors (antes dele, Toronto também havia se classificado aos playoffs cinco vezes, mas em 18 anos), e DeMar DeRozan, um all-star que melhorava a cada ano, e, junto de Lowry, foram os jogadores que mais criaram identificação com a franquia e com a cidade depois da era Vince Carter.

No entanto, novas ameaças apareciam no Leste. Giannis Antetokoumnpo finalmente ganhara um time e um técnico à altura de seus talentos em Milwaukee. Philadelphia parecia disposto a dar um all-in e montar um contender tendo Embiid e Simmons como principais pilares. Boston contava com um dos melhores técnicos da liga e um elenco recheado de talento, “reforçado” pelos agora saudáveis Kyrie Irving e Gordon Hayward.

Ao mesmo tempo em que Ujiri contemplava esse cenário após uma nova eliminação traumática nas mãos de LeBron e perguntas do tipo “O que Toronto deve fazer agora?” aumentavam em recorrência e intensidade, uma oportunidade surgiu.

A relação entre Kawhi Leonard e o San Antonio Spurs azedou devido a interpretações conflitantes quanto à gravidade de uma lesão no quadríceps direito do jogador. A situação resultou em uma falta de confiança mútua, o que, por sua vez, levou a um pedido de troca por Leonard. E Ujiri tinha “a” peça para completar o negócio.

20 de março de 2012, Oracle Arena

Durante a cerimônia de aposentadoria da camisa 17 de Chris Mullin, o dono dos Warriors Joe Lacob foi recebido com sufocantes vaias. O motivo? Uma semana atrás, Golden State havia acabado de trocar o seu melhor jogador, o armador Monta Ellis. A principal peça recebida na transação foi o pivô australiano Andrew Bogut, que tinha uma carreira marcada por lesões.

Além disso, a franquia da Bay Area tinha planos de colocar o talentoso arremessador Klay Thompson no time titular, além de focar no desenvolvimento de um jovem com problemas nos tornozelos chamado Stephen Curry.

Hoje, sabemos que essa decisão foi uma das sementes plantadas que vieram a dar origem à dinastia que chegou a cinco finais consecutivas, venceu três e, a partir desta quinta (30/5), tentará o quarto anel, o 3º seguido. Porém, considerando o contexto da época — uma franquia que vinha de duas décadas de irrelevância acabara de trocar seu melhor jogador para receber em troca um pivô desengonçado e injury prone — , as vaias foram compreensíveis.

E Steph Curry? Em 2012, o armador já havia lesionado o tornozelo diversas vezes e passado por uma cirurgia (passaria por uma segunda no fim da temporada). Como os Warriors iriam saber que ele se tornaria um dos atletas mais influentes dos últimos tempos e um dos arremessadores mais letais de todos os tempos, quando as evidências do momento pareciam não favorecer prognósticos positivos?

Os Warriors fizeram uma aposta.

30 de junho de 2018

Reportagens começam a pipocar de que Paul George teria chegado a um acordo para permanecer no Oklahoma City Thunder por US$ 137 milhões, três anos, com uma player option para o quarto ano.

A renovação foi surpreendente porque, desde que PG13 anunciou que não renovaria seu vínculo com o Indiana Pacers, a narrativa era de que qualquer time que o adquirisse, que não fosse o Los Angeles Lakers, seria um mero pit stop até que seu contrato se encerrasse e ele finalmente se juntasse ao time de seu estado natal.

E a maioria da liga acreditou nessa narrativa da noiva prometida, inclusive o próprio Los Angeles Lakers, que embora tivesse as peças necessárias para fazer uma troca com os Pacers, não o fez, preferindo convencê-lo a se juntar à franquia como free agent (o que rendeu algumas acusações de aliciamento contra Magic Johnson).

Quem não acreditou na narrativa foi o Oklahoma City Thunder. Mesmo em um mercado pequeno, distante de Los Angeles em todos os sentidos, a franquia decidiu apertar o gatilho, mandando Domantas Sabonis e Oladipo para Indiana. Durante o ano, apostou em um trabalho bem feito, em Sam Presti e na química com Russell Westbrook. A franquia foi recompensada, especialmente nesta temporada, com Paul George jogando o melhor basquete da sua vida, sendo finalista para os prêmios de MVP e Melhor Defensor da Temporada.

Em outubro do ano passado, Paul George confirmou que as narrativas eram, de fato, verdadeiras. Caso ele não tivesse sido trocado e terminasse seu contrato em Indiana, ele teria assinado com os Lakers. George, no entanto, também revelou ter estranhado a relutância de LA tentar uma troca por ele, abrindo a possibilidade de outras equipes o adquirirem.

OKC não tinha nenhuma garantia de que George renovaria. Aliás, se os boatos fossem verdadeiros, de que PG queria mesmo ir para Los Angeles, em um dos maiores mercados do mundo, trabalhar com Magic Johnson e com uma franquia que poderia conseguir LeBron James no futuro, quais seriam as chances de uma franquia em Oklahoma reter um jogador com essas aspirações?

O Thunder fez uma aposta.

E de forma semelhante, a história vem se desenrolando para Toronto. Assim como Paul George, Kawhi Leonard é californiano e há relatos de que ambos os times de Los Angeles, com espaço na folha salarial, irão tentar sua contratação. E porque não tentariam?

Com 27 anos, Kawhi está no auge dos seus poderes e se mostra um franchise player capaz de liderar uma equipe às Finais de NBA, algo que times fazem tank na esperança de conseguir algo parecido. Por que Masai Ujiri não deveria pular na oportunidade de consegui-lo?

E da mesma forma que trabalho bem-feito, um GM de respeito e química com os companheiros de equipe convenceram Paul George a ficar em OKC, por que o mesmo não pode acontecer com Kawhi e os Raptors?

Agora, caso essa seja, de fato, a única temporada de Leonard em Toronto, ele sairá tendo entregado à cidade e seus fãs algo que muitos aguardavam, com a chance de levar um título ainda viva.

E somente pelas memórias criadas nestes playoffs, por essa celebração, haverá muito mais pessoas gratas do que reclamando. Quer apostar?

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Samir Mello
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Jornalista do portal Metrópoles e Mestre em Tradução pela City, University of London; passagens pelas redações do Jornal de Brasília e Correio Braziliense