Steven Adams é o objeto mais inamovível da NBA

Samir Mello
HIGH FIVE
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11 min readJan 25, 2019

Por Royce Young
Traduzido por
Samir Mello
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Steven Adams adora uma sauna.

Na verdade, Steven Adams adora a só-na, que é como ele pronuncia a palavra, enfatizando seu sotaque Kiwi.

A só-na possui algum poder mítico na mente de Adams, a habilidade de alterar a química do seu corpo, liberar hormônios e aumentar a força. É ciência de melhora de desempenho, e Adams ama ciência.

“A pesquisa por trás disso, cara, você pode perguntar pra qualquer cara com um diploma”, Adam diz. “Ciência, tipo isso, cara. Eu sou um grande fã de ciência, mas seja lá quem pesquisou isso, legal, cara, porque eu sou um grande fã de sauna”.

Adams diz que é relaxante e a sensação é boa — boa para o cabelo e para a pele. Mas talvez também possa ser o ingrediente secreto de sua força aparentemente sobrehumana.

“Ele diz que é bom para os níveis de testosterona, para o desenvolvimento da testosterona ou algo assim”, seu antigo companheiro de time, Taj Gibson, afirma.

Não existe concurso de “Homem Mais Forte da NBA”, no qual jogadores levantam telões ou jogam garrafões nas arquibancadas superiores, mas entre seus companheiros e pessoas ao redor da liga, Adams é amplamente considerado o homem forte da NBA, uma parede de força e fisicalidade ambulante.

“Esse cara é o cara mais forte e físico da liga”, afirma o técnico do Wizards, Scott Brooks, que treinou Adams por duas temporadas em OKC.

“Ele é, com certeza, o cara mais forte da NBA”, opinou o companheiro Jerami Grant.

Em uma liga favorecendo velocidade, espaçamento, arremesso e cortes, Adams é o contraponto. Old school. “Retrô”, como o técnico dos Spurs, Gregg Popovich, o chama.

Adams é uma relíquia física e durona do passado, um bruto que irá lutar por cada posse e usar sua força para se impor.

“Aquele filho da puta é forte. Tipo, to falando sério”, afirmou Jimmy Butler, do Philadelphia 76ers, na última temporada. “Ele me acertou com um bloqueio e eu pensei que minha vida tinha acabado.

“Ele é do planeta Krypton, ou algo assim”.

um barulho inconfundível antes de jogos em Oklahoma City, que pode ser ouvido dos túneis da Chesapeake Energy Arena 90 minutos antes da partida começar.

Soa como rinocerontes galopando no concreto, mas é apenas Adams correndo pelos corredores durante seu aquecimento pré-jogo. Queixo direcionado ao peito, ombros levemente encolhidos, olhar vazio, focado para frente, Adams está batendo seu pé tamanho 50 contra o piso como se ele estivesse tentando derrubar um quadro da parede.

Você sempre pode ouvir Adams se aproximando, o que é algo positivo, porque às vezes essas viradas acentuadas no interior de uma arena podem fazer ele se colidir com alguma alma desavisada. Apesar de seu gosto por um basquete mais físico, colisões são coisas que ele evita fazer. Ele afirma que só se lembra de ter sido penalizado por uma falta ofensiva uma vez em sua carreira, e ele não esqueceu os detalhes.

“Foi o Markieff Morris”, ele se recorda. “Eu me lembro bem. Ele estava falando merda, mas jogando uma defesa forte, então eu avançei em direção a ele e ele caiu na quadra, o juiz apitou e eu fiquei tipo, ‘Que merda’, e isso me fez não avançar dessa forma direta mais. ‘Ok, eu tenho que avançar ao redor deles, não no meio deles’”.

Com 2,13m e 122kg, Adams é a versão da NBA do “Montanha”, Gregor Clegane, personagem de Game of Thrones. As mãos de Adams são como garras de ursos, que fazem uma bola de basquete parecer um pequeno melão quando ele a segura. Seus ombros são largos como um encouraçado e seus ossos são aparentemente feitos de adamantium.

O pivô do Sacramento Kings, Willie Cauley-Stein, 2,13m e 108kg, aprendeu em novembro o que outros grandalhões na liga já sabem há anos: Adams é o objeto imovível da NBA.

“Ele é forte. Ele é bem forte”, Gibson declara. “Ele também é muito inteligente, extremamente físico, ele ama o aspecto físico do jogo, ele adora fazer bloqueios. Ele é um animal ali dentro, cara”.

De acordo com o NBA.com/stats, Adams tem média de 5.6 post-ups por jogo, o 12o da liga. Nesse tipo de jogada, ele acerta 54.9% os arremessos, a melhor marca entre qualquer jogador com média de mais de dois post-ups por jogo. Entre os homens de garrafão, Adams é o segundo em toques por partida (atrás apenas de Clint Capela, de Houston), com 13.2 e arremessando para 50% em hook shots nesta temporada (em 87 tentativas).

Adams se anima ao falar sobre os detalhes do low block, como altera as defesas e prejudica o auxílio nas rotações apenas movendo a bola pela região. Ele adora o lado estratégico do basquete, assistindo filmes de forma obsessiva para identificar pequenos detalhes ou vantagem tática. Ele fica por mais tempo após os treinos conversando com o técnico assistente do Thunder, Mark Bryant, um dos melhores desenvolvedores de pivôs da NBA, e alguém que Adams dá muito crédito pelo seu sucesso.

É tudo uma questão de ângulos e oportunidade, e tirar proveito de uma arte esquecida na NBA.

“Um dos motivos que me fez ter sucesso na boca do garrafão é que ninguém mais joga defesa no low-post”, Adams explica. “É bem mais fácil no garrafão. É bem complicado pontuar contra Gortat, Nenê, os caras mais velhos. Eles já estiveram em quadra tantas vezes. Eles possuem pequenos truques, sabem sobre equilíbrio, eles sabem como te forçar a fazer esse ou aquele movimento.

“No passado, cara, você quicava a bola uma vez — eu não conseguia nem fazer o Derek Fisher recuar. Sabe, é aquela coisa old school, tipo, ‘Boom! Você não vai nem se mexer’”.

Adams faz uma distinção entre seus oponentes na NBA atual. Existem jogadores “fortes” e jogadores “pesados”; Nene é forte, Marc Gasol é pesado (mas não de uma forma pejorativa). Para Adams, força é questão de um princípio simples: equilíbrio.

“A maioria desses caras me humilharia na academia”, ele admite. “Tipo o Serge Ibaka. Levantando pesos, cara, Serge está lá todos os dias, destruindo. Mas em quadra, eu consigo deslocar ele”.

E o Adams levanta peso? Claro que sim, mas o foco do seu treino é em fortalecer membros inferiores e core, o que ele chama de “conhecimento do corpo”. Ele quer estabelecer raízes na quadra, usando suas pernas, grossas como troncos, como uma base impenetrável.

“Você pode ser tão forte quanto quiser, cara”, ele diz, “mas se você só tiver uma perna boa, tudo vai por água abaixo”.

O Thunder estava perdendo por seis pontos fora de casa, contra Denver, no meio do quarto período. Era um jogo importante — importante para dezembro, pelo menos -, com o Thunder tentando se aproximar do seu rival de divisão. Estava difícil anotar pontos, as posses estavam se tornando brigas de 24 segundos com o nível de fisicalidade aumentando. Russell Westbrook começou a atacar o garrafão e encontrou Adams. O bloqueador Mason Plumlee se dirigiu para as costas de Adams e se preparou para pular.

Adams quicou a bola, mandando Plumlee pelos ares de Denver sem bola nenhuma para bloquear. Plumlee caiu por cima dos ombros de Adams e 19.000 pessoas na arena ficaram sem ar, se preparando para o pior. Porém, em vez de usar aquela força Hercúlea para superar Plumlee e seus 108kg para conseguir a falta e pontos, Adams deixou a bola cair e segurou seu oponente, impedindo uma queda feia.

Foi uma falta simples, e em vez dos três possíveis pontos que cortariam a liderança dos Nuggets para uma posse, o OKC ganhou uma lateral.

“Obviamente nós estamos tentando competir, mas a pior coisa é ver um cara jogando duro e se machucar”, Adams diz. “Porque é algo que diz respeito à carreira. A pior coisa no mundo é acabar assim. Cair de pescoço ou algo assim. E aí é tipo, ‘Merda. Honestamente, ele fez a maior parte do trabalho”.

As pessoas ao redor da liga notaram, com vídeos intitulados “Steven Adams salva a vida de Mason Plumlee!” circulando. Eles continuaram jogando e os Nuggets venceram.

Apesar de toda essa simpatia, Adams tem uma reputação. Em uma pesquisa feita pelo Los Angeles Times em 2016, Adams foi anonimamente votado por técnicos, assistentes e jogadores como o segundo jogador mais sujo da liga (O armador dos Cavaliers, Matthew Dellavedova foi o número 1).

Adams dá de ombros e admite que, embora ele seja intencionalmente irritante — ele gosta de esfregar seu rosto suado em adversários na linha de lance livre — fala-se bem menos sobre os truques de Adams hoje em dia.

“Eu só tenho respeito por ele”, afirma o ala dos Spurs, LaMarcus Aldridge, que jogou dois jogos em três dias contra Adams na última semana. “Nós nos atacamos, mas de forma limpa. Nunca tem deslealdade”.

Isso não significa que Adams anda facilitando. A mesma brutalidade física e força estão lá. É um pouco mais calculado agora, um pouco mais preciso, e um pouco menos intencional.

“Ele te dá um bloqueio e depois te pergunta se você está bem”, Gibson revela. “Até você ficar puto. Eu já o vi puto várias vezes”.

Adams é atlético, com um belo jogo de pés, mãos suaves e uma certa classe que pode ser surpreendente — ele até arriscou um eurostep esta temporada. Um de seus moves clássicos é girar ao redor do braço esticado e ombro do marcador tão rapidamente que eles mal têm tempo de se mexer.

É a faca de dois gumes da força de Adams; seus marcadores se preparam para força bruta e ele os surpreende com velocidade e técnica. Mas tem uma coisa que a força de Adams não consegue tirar benefício.

“Não ajuda a cavar faltas”, ele admite. “Várias vezes eu tento roubar uma e os juízes ficam tipo, ‘Cala a boca, levanta, levanta’. E eu fico tipo, ‘Caramba, tem certeza?’”

É difícil conseguir uma apito às vezes quando você tem uma reputação. Sua habilidade de conseguir aguentar um soco ou uma cotovelada e não acusar o golpe é lendária, como aconteceu no Jogo 6 da primeira rodada do Oeste em 2014.

Zach Randolph, com o Memphis Grizzlies, deu um soco no rosto de Adams e foi suspenso no Jogo 7, mas ninguém soube do ato porque Adams nunca reagiu a ele. Isso é, até que seu queixo ficou tão dolorido que ele não conseguiu mastigar seus waffles na manhã seguinte.

“Ah, sim, eu fiquei puto”, Adams diz com uma risada. “Porque eu amo comida”.

A dureza natural, o pragmatismo simples, o humor autodepreciativo fizeram de Adams uma figura querida para os torcedores. Ele vive pelo lema de lealdade e comprometimento para o time em primeiro lugar, uma das bases da cultura neo-zelandeza e, mais especificamente, do All Blacks, a seleção nacional de rugby.

Adams é despretensioso e autenticamente humilde. Durante um tempo, os companheiros não sabiam se Adams tinha noção de como ele era bom. Arremessar é um ato inerentemente egoísta, e Adams está longe de ser egoísta. Passar é fazer trabalho em equipe.

“Eu sempre quis passar a bola”, Adams afirma. “É por isso que eu fico puto com as pessoas. É tipo, ‘Bro! Faz o corte, porra!’ É um pouco preguiçoso e egoísta, mas eu poderia usar alguma energia, fazer esse cara recuar e arremessar sob marcação, ou você poderia fazer sua parte e nós conseguirmos uma bandeja. Eu passo pra você e a gente consegue uma bandeja.

“Bandejas são legais. Bandejas são sensacionais, eu acho. Grande fã de bandejas”.

Mas se o assunto é o que o que é melhor para o time, os pontos de Adams são uma grande parte disso e há uma clara intenção de mantê-lo agressivo, com Westbrook se sentindo responsável por fazer isso acontecer.

“Eu acho que ele sabe como ele é bom, mas não acho que ele se importa muito”, Westbrook afirma. “Ele só quer vencer e é só isso que importa para ele. Eu tomo como minha responsabilidade, minha prioridade, fazer com que ele receba a bola e arremesse. Porque, quando ele joga bem, nós vencemos”.

Era março da última temporada, contra o Miami Heat, e Adams pegou a bola no topo do garrafão, em movimento e, por um breve momento, pareceu considerar arremessar para 3. A torcida caseira se animou com a expectativa, o implorando para arremessar.

Adams riu, após a partida, ao ouvir sobre os fãs querendo que ele arremessasse, mas aí ele apontou, com a cabeça, para o armário de Westbrook.

“Eu seria destruído pelo velho companheiro ali’, Adams disse após a partida. “Ele me comeria vivo”.

Adams é um dos alvos favoritos de Westbrook, com os dois sendo uma das duplas mais fluidas da liga. Westbrook faz passes em espaços apertados e sob pressão, e Adams os pega com suas mãos gigantes. Adams, teoricamente, é um excelente arremessador de meia-distância, mas na verdade eles são arremessos de uma mão a 2 ou 3 metros de distância. O floater de Adams é uma arma ofensiva porque, enquanto as defesas adversárias se preparam para uma colisão, ele para e gentilmente arremessa sobre elas.

“Sim, se ele quiser”, Westbrook afirma, sobre a capacidade de Adams arremessar para 3. “Mas essa não é a parte forte do seu jogo. Ele é o cara mais físico da liga, forte, então pra que arremessar pra 3?”

Adams notou que seus adversários de garrafão têm cada vez mais atuado da linha de 3. Ian Mahinmi tentou 11 arremessos de longa distância desta temporada. Hassan Whiteside, 15. Andre Drummond, 30.

Adams nunca tentou um arremesso de 3 em um jogo — oficialmente, ele está 0/6, todos no estouro do cronômetro — e há uma boa chance de que ele nunca o fará. Espaçamento é a moda no basquete atualmente, porém, enquanto a NBA tenta jogar mais longe da cesta, Adams quer se aproximar o máximo que puder.

“Você não quer arremessar pra 3 toda hora”, ele defende. ‘Pontos por posse — eu entendo. Eu entendo. Mas não é uma máquina. Você não pode simplesmente ficar jogando informação ali e o produto, ao final, ser, ‘Isso, de acordo com meus cálculos…’ Não é assim que funciona.”

Costumava ser uma piada interna, após treinos do Thunder, Adams tentar um bando de bolas para 3 do canto, perdendo oito ou nove em seguida, antes de finalmente acertar uma e gritar: “De primeira!” Agora, ele faz a mesma coisa, acertando oito ou nove em seguida.

Tentar bolas de 3 é parte do seu aquecimento pré-jogo enquanto ele circunda o garrafão, acertando uma de cada ala e no topo do garrafão.

“Há outros jogadores que eu tenho certeza que venceria em um campeonato de 3, outros pivôs. Mas eles arremessam durante as partidas”, Adams afirma. “Ei, se o técnico deles permite, legal. Eu não me importo. Faça o que você tiver que fazer.

“Mas para o nosso sistema, eu não estou fazendo bloqueios e me posicionando para arremessar. Mesmo que tenha uma oportunidade, é mais sobre entender o valor daquela posse. Porque a última coisa que eu quero fazer é arremessar para três só por fazer”.

Saber arremessar tem grande valor na NBA moderna, mas Adams é uma retro evolução de certa forma, contestando padrões não originais. Ele é um old school contemporâneo, altruísta e habilidoso, modesto e monstruoso. Ele está provando que o pivô tradicional não é antiquado; é um tesouro raro quando vem em um pacote singular como Adams.

É sobre saber utilizar suas qualidades, e Adams sabe fazer isso.

“É sobre fazer o que o time precisar, cara”.

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Samir Mello
HIGH FIVE

Jornalista do portal Metrópoles e Mestre em Tradução pela City, University of London; passagens pelas redações do Jornal de Brasília e Correio Braziliense