Cancro? Sim, tenho algo a dizer!

Marisa Viegas
Hikari Mag
Published in
7 min readAug 7, 2014

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Hikari Health em Sintra

Na semana passada a Hikari Health promoveu mais uma sessão de conversa sobre cancro. A Hikari é uma startup para pessoas, e tem como objetivo informar, esclarecer e assistir necessidades nas áreas da educação e da saúde. Na área da saúde o nosso foco são as pessoas cuja vida está afetada por um diagnóstico de cancro (pessoas com cancro, cuidadores, profissionais, amigos e familiares).

“E se pudéssemos falar abertamente?” tem sido o mote para promover a participação de todos os interessados ou simples curiosos. Contámos com 10 participantes no espaço COWOR Sintra. A regra de ouro? Todas as respostas estão certas!

A sessão esteve composta por vários cuidadores de pessoas com cancro, outras que tiveram a doença e ainda com duas profissionais de saúde. As razões que trouxeram os nossos participantes foram as seguintes:

“Devemos estar mais informados e desmitificarmos ideias.”

“O cancro não tem de ser assustador e é importante desmistificar o apoio ao cancro. ”

“O meu pai morreu de cancro e tenho uma amiga que está a passar por uma fase difícil e quero saber como a ajudar.”

“O meu pai tem cancro há cinco anos e o processo está muito lento… Saber como lidar… Eu já não sei como lidar com ele.”

“Eu vim para saber como posso ajudar a lidar.”

“Eu tenho um misto de motivos, primeiro porque sou psicóloga e as pessoas pensam que temos as respostas todas. Claro que não é verdade, e cruzei-me com muitas situações de cancro e muitas histórias de sucesso (felizmente). O meu pai ficou com apenas um rim, oxigénio durante a noite mas manteve o sentido de humor — “agora sou o Robocop e muito mais perigoso”. A minha esperança é que alguém está a falar disto, venho com expectativas altas.”

“Estou em recuperação de tratamento de quimioterapia de cancro da mama e vim ouvir, mas sei que temos de colocar muita coisa de lado (acabou a pesquisa na internet por sugestão do médico). E agora é andar para a frente.”

“Enquanto técnica de saúde as pessoas esperam de mim muitas respostas. Tenho perdido vários amigos com cancro. Sentia-me sem saber o que havia de falar, porque a pessoa sabia que tinha pouco tempo de vida e eu não sabia o que dizer. Além disso, qualquer dica dá jeito.”

“Curiosidade.”

Marisa Viegas (facilitadora)- ilustrações a cargo do Hugo Figueiredo (obrigada Hugo ☺)

Entre as várias perspetivas e histórias, a facilitadora avançou com duas dicas importantes: Vamos levar isto com leveza e humor.

Vamos criar uma grande rede de trabalho em equipa!

“Agora estou a pensar…Tive muito menos pessoas a telefonarem-me quando estava doente, pensei que tinha sido abandonada. O meu marido dizia: “Telefonaram a perguntar por ti” e eu pensava: “Porque não me procuram diretamente?”. Quando acompanhava pessoas com cancro, vivia tudo de uma forma diferente.”

Uma das participantes por Hugo Figueiredo

As palavras negativas, as crenças muitas vezes erradas sobre a doença, a sua evolução incerta, provocam medo entre quem se vê perante um diagnóstico de cancro e entre quem está ao lado e acompanha todo o percurso. Este tem sido um dos feedbacks comuns a todos os grupos de conversa que temos organizado. Alguns dos nossos participantes referiram mesmo que se tornou mais difícil comunicar entre familiares do que com a pessoa que estava doente.

“Foi muito rápido e correu tudo mal. Do diagnóstico a falecer durou um mês. E foi um processo muito intenso e não se falava muita coisa, foram meses pesados. O problema era falar entre familiares.”

É importante falar mais vezes sobre cancro, aprender a partilhar o que sentimos e as dúvidas que temos. Aprender coisas novas, alimentar bons pensamentos, trazer para a nossa vida pessoas que nos estimulem de forma positiva, são de resto boas estratégias que importa ter em conta, quer tenhamos cancro ou não. E atitude positiva treina-se!

Uma das participantes teve um susto há dois meses. “Eu não queria falar, para não preocupar as pessoas.” Além disso, o tempo de espera pelo resultado do exame de rotina que tinha ido fazer (um mês) deixou-a ainda mais tensa. Confessou que “Não estamos preparados para esperar.”

“A médica disse para eu encarar como um AVC, aparece, trata e vai vigiando. Tirou e tratou.”

“Em termos sociais, as coisas estão muito mecanizadas. Há pouco espaço para mostrar emoções.”

Onde estamos e para onde vamos quando pensamos em saúde e doença?

Depois de cada um identificar o ponto onde crê situar-se, verificámos que nos encontramos em pontos diferentes. Afinal ter saúde não é apenas a ausência de uma doença, e como o nosso corpo, a nossa mente e o meio que nos rodeia interagem constantemente, a nossa tendência natural é encontrar um equilíbrio no meio de tudo isto, o que para muitos pode ser um verdadeiro desafio. Oscilamos pois, ao longo de uma linha contínua entre dois extremos: um que se aproxima do conceito de saúde (tal como a Organização Mundial da Saúde o define), e outro da doença.

Em resposta ao tipo de comportamentos que fazemos para promover saúde, os nossos participantes disseram: sair com amigos, uma alimentação cuidada, exercício físico, o “dia da porcaria” (associado ao prazer em comer aquilo que apetecer), rir, fazer um check-up, cozinhar, beber água, cantar no duche.

Quando falamos em prevenir o que podemos fazer?

1. Evitar: os comportamentos que colocam em risco o nosso bem-estar como fumar, ter uma vida sedentária, isolarmo-nos das outras pessoas, ter uma alimentação descuidada, entre outros.

2. Vigiar: estar atento a alterações no corpo. Por exemplo fazer o autoexame da mama, da pele e dos testículos.

3. Rastrear: hoje em dia muitos tipos de cancro podem ser detetados numa fase inicial o que aumenta a probabilidade de cura. Temos para isso alguns exames de rastreio como a mamografia, a pesquisa de sangue oculto nas fezes, o exame ginecológico com citologia (ou Papa Nicolau), o toque retal, as análises ao sangue entre outros.

Cuidarmos de nós próprios, a ter sempre presente!

E quando há um diagnóstico?

Aqui as opiniões também são várias. Há necessidade de uma entidade que integre e sistematize a informação, pois por vezes acontece falta de comunicação entre os vários profissionais que estão envolvidos no caso de um utente, que se traduz em informação pouco clara ou ausência de resposta por parte de quem a procura.

“Assim que tive o primeiro sinal, num mês estava operada. Mas na altura não sabia, disseram que era um G3. E aí senti dificuldade em perceber. ”

“O técnico da mamografia falou de uma forma pouco precisa e eu queria uma resposta. E ele: tem x quistos, y coisas. E eu queria saber o quê.”

“Quando soube que o meu pai tinha cancro, chorei. No trabalho os meus colegas abraçaram-me e sossegaram-me. Como estava na área profissional, a minha família pensava que tinham toda as respostas. Mas não tinha porque não sou médica. Ao meu pai abracei-o e disse-lhe que estávamos juntos para procurar uma resposta.”

Existirá uma forma ideal de dar um diagnóstico?

“Não acredito em formas ideais de dar diagnóstico mas conheço as erradas que são as que ignoram as pessoas que têm à frente.”

Adaptar a informação a cada pessoa é essencial e uma responsabilidade de todos os profissionais de saúde. O apoio aos cuidadores tem sido um aspeto tido em consideração na área do cancro, e felizmente existem já hoje serviços especializados e gratuitos como o desenvolvido pela Liga Portuguesa Contra o Cancro.

“Os centros de saúde são muito diferentes. Trabalho em Cascais e temos uma unidade de cuidados na comunidade. Faço parte de um projeto que vai ter apoio aos cuidadores. Temos falta de pessoal.”

Como conclusão:

Cultivar hábitos de vida saudáveis e cuidar de si próprio, são estratégias que se desenvolvem com o nosso comportamento. É importante trabalharmos estes aspetos antes de qualquer diagnóstico.

É preciso expressar o que sentimos para recebermos apoio. Para dar apoio a alguém o ponto de partida é aceitar a outra pessoa e respeitar o seu ritmo. O passo seguinte é esclarecer as nossas dúvidas sem nos “afogarmos” no oceano de informação.

A missão da Hikari Health, é integrar esta informação, ajudar a compreendê-la e criar redes de apoios necessários.

Quando falamos em cancro, o cuidar é um trabalho de equipa. Vamos criar equipas com condições para cuidarmos melhor de quem precisa!

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