Resenha: Eu Não Sou Boa Influência Para Você

Jhonattan
Hipercubo
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3 min readNov 1, 2018

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Seu Pereira e Coletivo 401 é uma dessas bandas que nas primeiras duas músicas já é possível identificar as características fundamentais: a influência nordestina, o rock, o samba, tudo embalado pelas rimas inteligentes de Jonathas Falcão. Todos esses elementos resultaram no sucesso do primeiro álbum da banda, o homônimo Seu Pereira e Coletivo 401, de 2012. Em Eu Não Sou Boa Influência Para Você, seu segundo disco, lançado em dezembro de 2017, a banda repete a fórmula do sucesso, sem, no entanto, se entregar a mesmices. Nesse disco a banda reafirma o seu som e se confirma como uma das principais bandas a levar o nome da Paraíba para todo o país.

Os cinco anos que separaram um álbum do outro foram bem produtivos para o Seu Pereira. Eu não sou boa influência para você tem aquela mesma energia apresentada no primeiro trabalho, as levadas de Victor Rama (bateria), na guitarra cheia de melodia de Chico Correa (guitarra), no groove de Thiago Sombra (baixo), e os metais de Felipe Gomes (trompete) e Daniel Lima (trombone), que ao lado das letras de Falcão completam a originalidade da banda.

Destaque para a capa do disco, arte do genial Shiko, que com um conceito bem simples, conseguiu capturar a essência da banda: a figura do palhaço/otário, o bufão que apesar de todos os infortúnios da vida vai vivendo da boemia e da música, seguindo em direção oposta a todo o resto das ‘pessoas comuns’.

Esse palhaço não pode nunca ser boa influência para a personagem “direitinha” descrita na faixa que nomeia o álbum. Esse figura do palhaço é um personagem recorrente nas letras de Jonathas Falcão, que traz consigo fortes influências do repente, vistos através de suas métricas perfeitas e inteligentes cujos temas geralmente giram em torno dos conflitos e desilusões amorosas. Esse personagem é o cara com muito amor no peito para dar em Um Nome a Zelar; é o obstinado em conseguir a atenção da mulher que gosta em Otário; ou ainda o cara esgotado e que quer partir para outra em Fique Bem, Fique Linda.

É evidente a influência que a banda traz do brega, que fica claro principalmente em Um Nome a Zelar e em Até Ontem, balada com todos os ingredientes de uma música do ‘rei’ Roberto Carlos. Essa influência que lembra os bregas clássicos de Reginaldo Rossi ou Odair José é ressaltada nas desventuras amorosas das letras, ora de falando de perda, ora de procura; ora é o amor romântico, ora o carnal. Cheio de contradições, mas sempre amor.

Esses temas que já foram tão largamente abordados não se esgotam nas letras de Falcão, que através de seu estilo poético bem particular, misturando um vocabulário popular com rimas rápidas, consegue trazer novos ares à temas batidos. A versatilidade do letrista pode até garantir alguns momentos de riso como na cômica Love in Gotham City.

A banda também traz algumas novidades: equilibrando o estilo dançante que geralmente dita as músicas com algumas para dançar colado, como Bicho Solto e Geladeira Azul, ou ainda a participação da cantora Débora Malacar em Meio Fio. Seguindo esse acalmada no clima, a banda reserva os últimos 2 minutos e 14 segundos do álbum para viajar com ‘Décimas Lunares’: uma música com ares de faroeste sombrio, onde a banda completa sua veia nordestina indo buscar influência no surreal Zé Ramalho.

O narrador descreve cenários lúgubres, de bares, pousadas e estradas, embebidos em tristeza, reflexos de sua dor. É o dia do palhaço que vai chegando ao fim e, cansado de festa e de amores, ele se senta em uma esquina rememorando suas desilusões da vida, com a cabeça a rodopiar entre a dor e o desejo, fechando o ato magistralmente nos últimos versos do disco: “Que em meu abdômen medos se acomodem/ E os desejos rodem feito bailarinas/ Flutuantes meninas me findam, me fodem”.

Ouça o disco:

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Jhonattan
Hipercubo

Amante de música e escritor; jornalista nas horas vagas