O Poder da Mentoria

Tarcisio Melo
hurb.labs
Published in
8 min readJul 16, 2021

Uma análise sob a ótica da ótica da Equipe de Competição e Estudos em Arbitragem da UFRJ (“ECEArb”)

A importância da mentoria

“You’ve been a good apprentice, Obi-Wan, and you’re a much wiser man than I am. I foresee you will become a great Jedi Knight.” (Qui-Gon Jinn)

Vivemos o auge da sociedade da informação a qual, sob o viés corporativo — cada vez mais dinâmico, volátil e competitivo -, traz consigo uma série de desafios para aqueles que se propõem a navegar pelos mares do universo empresarial.

Para tanto, exige-se cada vez mais o aprendizado e domínio não só das chamadas hard skills (assim entendidas como as habilidades técnicas, que podem ser mensuradas de alguma forma), como também das soft skills (as quais tratam, sob a perspectiva comportamental, da capacidade de lidar positivamente com situações complexas).

Nesse contexto, ter um mentor para auxílio na compreensão da intrincada lógica corporativa é um fator essencial para que se alcance o sucesso profissional, na medida em que a orientação e o aconselhamento possibilitam que os mentorados tenham uma percepção muito mais ampla do contexto em que estão inseridos, tornando sua jornada muito mais rica e proveitosa.

A mentoria não traz benefícios apenas ao mentorado, tratando-se de uma verdadeira via de mão dupla, na medida em que provê ao mentor a capacidade de desenvolvimento de suas habilidades de liderança e gestão, além do constante estudo e aprendizado com as experiências dos seus mentorados.

A consequência é a criação de um ambiente de constante troca, através da qual são construídas bases sólidas para o ensino dos mentorados acerca de prioridades, tomada de decisões, adoção de soluções alternativas e não convencionais, dentre outros.

Escolher apenas os melhores?

“Genius is one percent inspiration and 99 percent perspiration.” (Thomas Edison)

Uma vez considerada a importância da mentoria, deve-se pontuar, aqui, que o desenvolvimento profissional não tem absolutamente nada a ver com talento ou inspiração.

Parafraseando Jeff Bezos, em sua carta de 2017 aos acionistas da Amazon, uma performance de “alto nível” ou “high standard” não é algo intrínseco ao ser humano, mas, sim, uma habilidade ensinável, na medida em que as pessoas são ótimas em aprender high standards quando expostas a eles, principalmente porque uma performance de alto nível é contagiante.

Para que se possa extrair o máximo de seus mentorados, o mentor deve estar constantemente motivado, energizado e realmente determinado a desenvolvê-los, dispondo-se a investir seu tempo para tanto.

Por outro lado, os mentorados devem se empenhar e dedicar propriamente para absorver todo o conhecimento que é colocado à sua disposição.

If you don’t like how the table is set, turn over the table

“Be the leader you wish you had” (Simon Sinek)

Uma das principais críticas ao ensino do Direito nas universidades públicas é o seu descolamento da realidade de mercado, de modo que a academia (muitas vezes encastelada em concepções e valores ultrapassados) acaba por desestimular os alunos a conhecer a iniciativa privada e as alternativas que esta apresenta àqueles que se aventuram em adentrar o mundo corporativo.

Em minha experiência acadêmica na graduação pela UFRJ, enfrentei inúmeras situações em que me vi desestimulado a buscar o desenvolvimento da minha carreira profissional na iniciativa privada.

O posicionamento do corpo docente à época era de um antagonismo declarado. Certa vez, durante uma discussão entre o Conselho dos alunos representantes de turma e a Direção da Faculdade, uma determinada professora chegou ao cúmulo de sustentar que a busca de estágio durante a graduação seria uma estupidez dos alunos, de modo que estes deveriam apenas se ater aos estudos e livros e que isso seria suficiente para sua formação enquanto advogados.

Tal pensamento não poderia ser mais anacrônico, absurdo e dissociado da concepção moderna de aprendizado através da prática, assim como da realidade de inúmeros estudantes — sobretudo aqueles advindos do ensino público — que enxergam no estágio uma janela de oportunidade para mudança de suas vidas e de suas famílias.

O pouco conhecimento jurídico que adquiri ao longo dos anos se deve muito às experiências que vivi desde os tempos de estágio. A concepção de liderança e a inspiração do que pretendia me tornar enquanto profissional se deve aos exemplos e ensinamentos que tive dentro do escritório de advocacia.

Foi nesse contexto que, no ano de 2015, em conjunto com Caio Gabra (também ex-aluno da UFRJ, à época advogado comigo no Campos Mello Advogados), foi iniciada uma iniciativa de desenvolvimento profissional dos estudantes de Direito da UFRJ com vistas a, diante da carência da faculdade, demonstrar as opções e alternativas da iniciativa privada.

A materialização desta iniciativa se deu com a criação da Equipe de Competição e Estudos em Arbitragem da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro — ECEArb.

A ECEArb e as Competições de Arbitragem

“I believe in work, I don’t fuck with luck.” (Harvey Specter)

As competições de arbitragem, de modo geral, têm como grande e bem-sucedido objetivo a propagação do estudo da arbitragem como método de resolução de conflitos, em especial conflitos comerciais, disseminando e estimulando seu estudo. É uma rara oportunidade de prática da advocacia em arbitragem para os estudantes da graduação.

Através das competições, que seguem o modelo dos moots, as equipes inscritas são apresentadas a um caso fictício, que simula um procedimento arbitral, cabendo aos alunos atuar como advogados responsáveis pela defesa das empresas envolvidas na disputa.

A disputa se dá em duas etapas, compreendendo uma primeira fase escrita, na qual os alunos devem preparar memoriais escritos, que simulam as petições escritas dos advogados das empresas. Posteriormente, são realizadas as rodadas orais, ponto ápice das competições, nas quais as equipes se enfrentam debatendo e discutindo o caso, sendo avaliadas por advogados especializados no tema.

A ECEArb foi criada com vistas a fomentar o estudo do instituto da arbitragem e para que a UFRJ fosse representada nas competições estudantis, especialmente a Competição Brasileira de Arbitragem Petrônio Muniz, organizada pela Câmara de Arbitragem Empresarial — Brasil (a “Competição Brasileira”), e o Willem C. Vis International Commercial Arbitration Moot (“Vis Moot”), sediado anualmente na Áustria.

Desde sua criação, a ECEArb participou de diversas competições, de 2015 a 2021, que ocorrem em diversas cidades do Brasil e do mundo.

Embora jovem quando comparada às demais universidades em âmbito nacional, a ECEArb conseguiu construir um sólido nome no cenário de competições do Brasil. Logo em seu primeiro ano de atuação, em 2015, foi finalista da Competição Regional do Sudeste, organizada pela OAB/RJ.

No ano seguinte, também se sagrou finalista do Rio Pré-Moot, bem como da Competição Regional Sudeste. Ainda em 2016, teve uma de suas competidoras premiada como a quinta melhor oradora da Competição Brasileira, dentre centenas de estudantes, que foi também a melhor oradora da Regional do Rio de Janeiro.

Em 2018, a ECEArb participou das rodadas finais do CAM-CCBC Pré-Moot São Paulo, e do X Curitiba Pré-Moot. Nesta última, não somente se classificou em segundo lugar, mas também teve uma de suas alunas premiadas como a melhor oradora da Competição. No mesmo ano, a Equipe ainda obteve resultados relevantes no exterior, onde ficou em 3º lugar no DLA Piper Paris Pré-Moot.

Já no ano de 2019, a Equipe teve sua melhor performance na Competição Brasileira, a maior competição de arbitragem e mediação em língua portuguesa no mundo, sendo o maior evento do gênero na América Latina. Além de chegar às semifinais da Competição Regional Sudeste de Arbitragem, organizada pela OAB/RJ, ficando entre as 4 melhores equipes dentre as 31 participantes, foi finalista na X Competição Brasileira de Arbitragem Petrônio Muniz, realizada em outubro de 2019, em São Paulo, ficando em sexto lugar geral.

Nesse ponto, destaca-se que a ECEArb foi a única equipe carioca a chegar tão longe nesta competição, classificando-se a frente de cerca de cinquenta equipes de todos os Estados do país.

Já no que se refere ao Vis Moot, em 2020 a Equipe teve seu melhor resultado, classificando-se como a 14ª melhor equipe do mundo, sendo também a melhor equipe brasileira na competição, dentre as 249 equipes universitárias participantes.

Na 11ª edição da Competição Brasileira, realizada em 2020, participaram cerca de 2.000 pessoas, entre árbitros (advogados), avaliadores (mediadores), e estudantes de mais de 90 equipes de faculdades e universidades de todas as regiões do país.

Além disso, em 2020 também houve a participação, pela primeira vez na história, de faculdades europeias na Competição com a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Nesta histórica edição, a ECEArb se classificou uma vez mais entre as finalistas da Competição, ficando em sexto lugar no ranking geral.

Hurb e sua relação com a ECEArb

“We make a living by what we get, but we make a life by what we give.” (Winston Churchill)

Atualmente, a ECEArb é subdivida em três times que, coordenados por advogados ex-alunos da UFRJ, preparam-se, simultaneamente, para a 29ª edição do Vis Moot; para a 12ª edição da Competição Brasileira; e, neste ano de 2021, a ECEArb participará, pela primeira vez em sua história, da Foreign Direct Investment International Arbitration Moot (“FDI”), competição internacional, criada em meados de 2006, que traz ao debate casos de arbitragem de investimento, disseminando e estimulando o estudo do Direito Internacional dos investimentos por Universidades de todo o mundo.

Um dos principais objetivos da ECEArb é promover o desenvolvimento de seus alunos de forma ampla, de modo que, tradicionalmente, os participantes de edições anteriores retornam às competições como coaches das novas equipes, completando-se, assim, seu ciclo de aprendizado, na medida em que os outrora mentorados assumem a responsabilidade de mentorar, ao lado dos coordenadores, as novas gerações de estudantes.

Acreditando na iniciativa e na importância do desenvolvimento de novos profissionais, o Hurb está engajado neste projeto contribuindo muito não apenas na preparação do time dedicado à Competição Brasileira, coordenado por mim, como também na modelagem do próprio conceito de trabalho à luz de nossos princípios e valores.

Junto com o auxílio do Otavio Simões Brissant, nosso Diretor Jurídico e grande exemplo do que é ser um bom mentor — cuja paciência, dedicação e confiança foram imprescindíveis em minha formação profissional, sendo seus ensinamentos e métodos replicados no contexto da equipe -, realizamos reuniões aqui dentro da nossa Hurb House com os alunos.

O treinamento consiste em aulas de cunho propositivo fundado no método socrático de ensino, sendo fomentado um ambiente de debate e reflexão entre os alunos, os quais são instigados a discutir temas que encampam desde a educação teórica, até técnicas de estudo de caso, argumentação, retórica, oratória e negociação, preparando-os exaustivamente para todas as fases da Competição.

Conclusão

A principal lição que se extrai de iniciativas como a narrada acima é o da importância do desenvolvimento de novos profissionais através da mentoria, sendo esta uma valiosa forma de incremento de habilidades pessoais, tanto do ponto de vista técnico (hard skills) quanto comportamental (soft skills).

Além disso, vê-se nesse modelo a importância da troca de experiências, a qual tem um enorme poder de evolução, tanto para o mentor quanto para o mentorado, quando considerado seu potencial de aprendizado e desenvolvimento.

Realizamos reuniões aqui dentro da nossa Hurb House com os alunos, as quais são ministradas, atualmente, aos domingos de forma presencial, complementadas por debates semanais realizados virtualmente.

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