João Ricardo Mendes
hurb.labs
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9 min readSep 9, 2022

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Problemas versus Dilemas: os trade-offs produzidos pela nossa cabeça

Eu me considero um criador de problemas, mas também um solucionador deles.

Isso reflete grande parte da minha identidade e da minha maneira de ser, entendendo como posso agregar mais valor ao mundo.

Muitos profissionais do Hurb compartilham dessa minha mentalidade. E, ao ver isso, fico muito feliz pois me identifico com muitas pessoas que trabalham na empresa.

Vamos ser honestos! É F*#@!(i) identificar um problema, (ii) resolvê-lo e (iii) retirá-lo da nossa lista de tarefas.

Aliás, ao encerrarmos esses problemas, eles desaparecerão nas listas de problemas de centenas de pessoas do seu próprio time e/ ou de milhares de clientes Hurb.

Um desafio e uma jornada de aprendizado para mim, atualmente, tem sido distinguir entre Problemas Simples, que geralmente têm soluções igualmente simples e Dilemas, que são muito mais complexos (complexos) de navegar, porque geralmente não há uma única resposta para essas situações.

Entretanto, não podemos dizer que um problema simples, com solução simples, é de fácil execução para ser extinto. Há casos em que a execução para acabar com um problema simples seja complexa.

Olhando para o retrovisor, de toda minha experiência profissional, e até mesmo pessoal, o que torna a reflexão mais simples pelo fato dela já fazer parte da nossa história, cheguei a conclusão de que os desalinhamentos de comunicação, e os “desacordos sociais” são Dilemas em vez de Problemas.

E, como já dito, os Problemas têm soluções, enquanto os Dilemas têm apenas otimizações para serem solucionadas, sendo estas somente possíveis com muita clareza e consistência.

No centro de muitas controvérsias que existem no Hurb, as quais são naturais uma vez que somos uma empresa que realiza sonhos de milhões de pessoas, nessas últimas semanas existiu um Dilema, apenas um. Não era uma óbvia dicotomia entre o certo versus errado, mas um dilema entre certo versus certo.

Esse tipo de Dilema é um dos mais difíceis de serem “apaziguados”!

Como sabido, essa história de somente existir apenas uma resposta certa para os Dilemas é um mito, ainda mais quando se está falando em plataformas que chegam a volumes gigantes como o Hurb.

Afinal, não estamos otimizando focados em um único cenário / olhar, mas sim para uma infinidade de perspectivas moldadas por diferentes contextos e experiências vividas.

À medida que nos esforçamos para construir e minimizar possíveis danos e riscos em nossa plataforma, nem sempre há e haverá soluções definitivas e unânimes onde todos saiam “ganhando” diante das decisões que foram tomadas.

Entretanto, tenho a certeza de que quem “não saiu ganhando” em determinada situação em nada atrapalha ainda querer melhorar cada vez mais a plataforma do Hurb, bem como manter as amizades dos seus companheiros de batalhas, afinal, a “decisão ganhadora” para aquele cenário levou em consideração várias ações e valores que estavam em jogo naquele momento que apenas não refletiam os ideais daquele colaborador.

Para que fique tudo bem entre os colaboradores, como no caso acima, é fundamental ser aberto, sincero e intencional sobre as ​​trocas e escolhas difíceis, ou fáceis, que devem ser feitas / tomadas, e que a decisão tomada seja comprada e colocada em prática por todos, mesmo por aqueles que discordaram dela, otimizando o que for necessário do jeito decidido, e entendendo onde estão os ruídos na comunicação que tornam algo complicado, e talvez simples de ser resolvido, em complexo, e de difícil resolução.

Há alguns anos, eu não estava tão sintonizado com a distinção entre Problemas e Dilemas, em parte porque, como muitos fundadores, eu era um otimista nato, sendo até mesmo muitas vezes cego (otimista ainda sou, e muito!).

Desta forma, muitas vezes concentrei meu olhar no lado positivo e não gastei tempo suficiente pensando na hipótese de as coisas não darem tão certo assim como eu imaginava.

Como disse acima, ainda tenho muito otimismo sobre a tecnologia criar o bem, fazer mais com menos e arbitrar indústrias ineficientes, mas, o que mudou ao longo da minha carreira é que não acredito que o bem é linear e uniforme, experimentado em todas as comunidades, levando sempre em consideração as situações e os contextos.

Digo a vocês, maximizar o bem e minimizar o mal ocorre por meio de previsão altamente intencional e atuação proativa. Depende de cada um de nós, vindo do nosso âmago, evoluindo de tecno-otimistas-cegos para tecno-otimistas com um contrabalanço de tecno-realistas, porém, diga-se de passagem, nunca pessimistas.

Distinguindo Problemas de Dilemas

Para distinguirmos Problemas de Dilemas, entendo que o primeiro passo é sabermos bem a diferença entre o complicado e o complexo.

Tendo essa distinção em mente, ganhamos um super poder, qual seja, o de “desconstruir” profissionais que têm o dom de transformar situações simples em complicadas e complicadas em complexas. Normalmente, esses profissionais possuem uma retórica perfeita e sedutora de tão acostumados que estão a utilizá-la, entretanto, essa retórica, normalmente, fica na primeira derivada e é facilmente desconstruída se temos conhecimento sobre o assunto, ou se formos atrás do conhecimento. Afinal, não podemos ser nadadores que nunca entramos em uma piscina.

Acredito que aprendi essa diferença em centenas de horas trocadas com nosso CTO como explico aqui. Em resumo, coisas complexas podem ter muitas partes, mas suas partes conectadas uma a outra são relativamente simples: uma engrenagem gira fazendo a próxima girar também, e sucessivamente.

Quando o número de interações entre componentes aumenta dramaticamente, a complexidade aparece, junto com a interdependência, a mesma que permite com que viroses e corridas bancárias se espalhem.

Resolver problemas é principalmente um exercício de priorizar recursos e produtos, sendo certo que dentre os citados recursos, há aqueles que devem necessariamente ser oferecidos às outras pessoas.

Por outro lado, os dilemas (complexos), são muito mais difíceis de se navegar, como disse lá no início deste texto. Vejam só:

Nos adaptarmos a um cenário de força maior onde o volume de operações da noite para o dia aumentou 6 vezes, sendo certo que dependemos da infraestrutura de uma indústria arcaica (travel tradicional) onde nosso time precisa trabalhar não só para otimizar nossa operação mas também pensando em como otimizar a operação de fornecedores — isto pode ser considerado uma situação complexa.

Em paralelo a isso, as informações que eles compartilham não são confiáveis e possuem potencial de causar danos gigantes, assim como tomadas de decisões muito erradas, quando nela embasadas — Estas informações / situações devem ser extirpadas do Hurb!

Nos últimos meses tivemos que tomar decisões onde os cenários macro-econômicos mudavam a cada dia e as informações mudavam como um vírus RNA, sendo certo que essas informações eram, e são, as ferramentas para operarmos milhares de pessoas. Ou seja, esta não é uma clara dicotomia entre o certo versus o errado, mas um dilema certo versus certo. É uma decisão de princípios lastreada em valores fortemente defendidos pelo Hurb.

Nas últimas semanas, decisões simples e óbvias para mim se tornaram cinzentas para muitos por conta dessa assimetria de informações. Diante de tamanha situação criada de forma desnecessária, cheguei a achar que tinha esquecido matemática básica e até mesmo ordem de grandeza.

Às vezes, tomar essas decisões que, como disse, para mim eram evidentes, se transformavam em situações de cena de um filme em que o protagonista mata um monstro apenas para ter mais uma dúzia em seu lugar.

Claro, quando estamos tratando de otimização não se pode enxergar como sendo tudo ou nada. Entretanto, quando decidimos otimizar uma coisa, devemos mitigar possíveis danos resultantes dessa tomada de decisão sempre que pudermos.

Baseado nas minhas últimas semanas, segue um apanhado do que aprendi:

Empoderar e educar

Dada a enorme quantidade de trabalho que executamos todos os dias, devemos equipar todos os profissionais do Hurb com treinamentos e ferramentas para aprimorarmos uma mentalidade de responsabilidade a fim de que o colaborador se sinta confortável em levantar ou derrubar preocupações de forma eficaz desde o início.

A responsabilidade é um esforço e processo contínuo e total.

Essas não são habilidades ou práticas que aprendemos na escola ou na universidade ou até mesmo em um MBA, portanto, devemos cultivá-las em nosso próprio dia a dia no trabalho e propagar essa educação, apoio e incentivos de uma forma muito forte em nossa companhia como um todo.

Comece as conversas cedo

Antes de lançar um produto, promoção ou estratégia agressiva, devemos avaliar os possíveis impactos para ajudar a detectar quaisquer problemas não resolvidos ou não detectados.

Contudo, uma análise completa de possíveis problemas deve envolver as partes interessadas no início do ciclo de vida de desenvolvimento do produto / ação, para ajudar as equipes a antever os problemas, elaborando perguntas fundamentais, como, por exemplo, “Será que devemos construir isso mesmo?”

O envolvimento precoce dos setores / pessoas fundamentais em um determinado projeto tem o benefício adicional de fornecer às equipes mais flexibilidade para lidar com essas ambiguidades, de modo que o processo pareça mais uma configuração útil de proteções adequadas do que uma sensação de estar bloqueado no último minuto.

Projetar e construir “com” e não “para” os nossos clientes (internos e externos)

Especialmente para os nossos problemas mais espinhosos, devemos continuamente construir relacionamentos “com”, convidando para todo o processo um conjunto diversificado das partes interessadas nesses problemas e que podem ser afetadas por eles.

Devemos continuar a torná-los parceiros-chave na deliberação com nossos designers e desenvolvedores; eles devem se sentir capacitados para dar feedback, expressar preocupações e propor abordagens alternativas.

No Hurb o que vale é unir e não dividir.

O envolvimento direto com diversas partes interessadas nos problemas, sejam elas e eles quais forem, pode mudar o caminho da conversa de maneira inesperada e produtiva, tendo um impacto real nos resultados dos produtos, assim como para o bem estar geral da empresa..

Mostre nosso trabalho

Para projetar com responsabilidade, a tomada de decisão deve ser deliberada e consistente. As equipes devem chamar explicitamente quais valores estão em jogo e como várias alternativas irão otimizar esses valores. Deve haver um processo acordado e transparente para deliberações e métricas claras (input metrics) para a tomada de decisões, a fim de evitar o viés que, de outra forma, poderia se infiltrar em abordagens mais ad-hoc.

As decisões finais e as razões por trás delas devem ser compartilhadas da forma mais transparente e simples possível para fornecer responsabilidade, ajudar a garantir a adoção de maneira consistente com a intenção da decisão e facilitar a reavaliação caso os fatores que levaram a essa decisão mudem com o passar do tempo.

Daqui pra frente…

Como um time de profissionais no comando de uma das plataformas de viagem mais poderosas já criadas, é nossa responsabilidade navegar por esses dilemas de maneira a criar os resultados mais assertivos e responsáveis ​​possíveis, especialmente para os nossos clientes.

Para isso, devemos reprogramar nossa tendência de reduzir dilemas a problemas a serem resolvidos, muitas vezes pedindo contexto em respostas que não fazem sentido Lembram do exemplo dos nadadores que nunca entraram numa piscina?

Devemos nos sentar com o desconforto que os dilemas podem gerar e reconhecer o fato de que muitas vezes não há uma única solução certa, mas sim a mais ideal para aquele momento.

Vamos nos envolver cada vez mais com um conjunto diversificado de partes interessadas e especialistas para garantir que entendemos todos os aspectos dos dilemas que porventura aparecerem diante de nós.

E, então, devemos fazer o trabalho árduo de superar essas barreiras para determinar, por meio de uma tomada de decisão rigorosa, intencional e muitas vezes não consensual, para que nossos valores nos levem à otimização que sempre pregamos e mitigar o impacto negativo potencial.

Na vida de qualquer fundador de empresa, o crescimento se torna uma luta constante, uma história de constantes experiências de quase morte, que Ben Horowitz chama “The Struggle”.

Esta luta é um lugar onde você perde a confiança em si mesmo, sua equipe perde a confiança em você (alguns), há sofrimento e infelicidade, você se sente sozinho e miserável.

De estar e frequentar esse “lugar” o “The Struggle” por vários anos, acredito que acabei me tornando um CEO um pouco mais experiente, ou como um amigo meu gosta de colocar ao falar sobre seu próprio tempo em várias lutas “um empresário com cicatrizes por todo o corpo, que são testemunhas do que vivi e recompensas do que conquistei”.

A Luta é constante, a luta não é e nunca foi por você e sim por milhares de pessoas por quem você se sente responsável. É a regra, não a exceção. É também a única maneira de ganhar experiência real. Acho que todos os empreendedores, fundadores e CEOs podem se identificar com a história do Struggle.

E quando você está na luta, não espere empatia (com algumas exceções que são as pessoas realmente especiais).

Dizem que “ninguém se importa”, prefiro acreditar que seja uma mentira.

Se você tiver um problema, não tente explicá-lo ou reclamá-lo, apenas resolva-o. É um trabalho solitário tomar as decisões em que você acredita.

Você tem que seguir seus instintos, sentir o que é certo, mesmo que todos lhe digam para fazer outra coisa.

Obrigado a todos que me ajudaram nesse período de “Struggle” pessoal e profissional (esse segundo criado por pessoas que se desesperam com qualquer coisa fora da “ordem”), obrigado mesmo, sei o nome de um a um e cada segundo que me ajudaram como um filme e gratidão pra mim é a segunda virtude mais importante, só fica atrás da coragem.

João Ricardo Mendes

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João Ricardo Mendes
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Hurb.com CEO and Founder. Be curious. Read widely. Try new things. What people call intelligence just boils down to curiosity.