A sangue frio
A viagem mais importante da minha vida
Gisele Kostka Müller de Oliveira Gomes
Fiz uma viagem em 2019 com minha antiga escola (que é judaica) para a Polônia. O intuito principal era conhecer melhor sobre a história do Holocausto vendo de perto os campos e “rastros” deixados pelos nazistas e também realizar a “Marcha da Vida”.
A maior experiência da minha vida.
A melhor?
Eu não diria a melhor, mas com certeza a mais marcante.
Estar lá doeu
Com certeza não mais do que o que eles sentiram
nem perto na verdade
mas por algum momento eu senti a dor deles
Imagina você não saber o que fez pra estar passando pelo que passou
imagina não entender, não saber o porque
se sentir culpado por nada
a ingenuidade
Eu passei por diversos campos de concentração
Estar lá era muito mais do que só conhecer a história
era como viver a história.
A viagem começou em alguns cemitérios judeus em Varsóvia, Lodz
Esses eram só uns dos diversos cemitérios que existem para homenagear essas pessoas
todas inocentes,
a maioria assasinadas,
a sangue frio.
No segundo dia fomos em Radegast
Lá fica exposta uma parte do trem que deslocava os judeus para os campos
um trem feito para carga animal
entrar lá me fez ter as piores sensações
eu conseguia sentir,
conseguia viver
tudo que aqueles pessoas devem ter passado…
o sufoco que deve ter sido estar em vagão lotado de pessoas desconhecidas com a esperança de ir a um lugar melhor
e no fim estar caminhando pra sua morte
A terceira parada foi o campo de Majdanek, localizado em Lublin
Esse lugar me machucou
Ver as camas apertadas em que essas pessoas dormiam
Ver as casas e imaginar o quão desumana deveria ser a condição em que os deixavam
Passar pelos fornos de cremação
Chegar perto daquele pesadelo sabendo que se eu vivesse naquela época quem estaria lá seria eu.
Por fim chegamos ao monumento com as cinzas,
a quantidade de cinzas
nem imagino a quantidade de sonhos e histórias que cada uma dessas pessoas guardavam com elas
Ter sua dignidade, sua vida, tiradas de você
Chegamos em Auschwitz
Famosa Auschwitz
por um motivo bom?
com certeza não.
Nunca me acostumava com o fato de ver cercas em volta dos campos
Duas camadas reforçadas
A possibilidade de fugir daquele situação era mínima e a dor só deveria aumentar.
Entramos nas chamadas câmaras de gás
Ver o buraco no teto,
o buraco pelo qual o gás passava
E quanto mais tempo passava, mais os nazistas criavam meios para que esse gás funcionasse mais rápido
Para acabar totalmente com aquela parcela da população o mais rápido possível
como se eles fossem nada.
A partir daquele momento aquelas pessoas não tinham mais chances
e elas não tinham noção disso
A sensação de estar lá foi angustiante
mesmo sabendo que tudo aquilo já passou
Depois disso fomos em um local que tinha como exposição os pertences que foram tirados deles
A quantidade de pertences demonstrava visualmente a quantidade de pessoas
A quantidade de pessoas que perderam a sua liberdade
e imaginar que não me faziam ver nem metade da real parcela que viveu aquilo
Nós fomos lá com o intuito de marchar pela vida
Então em Auschwitz nós andamos cerca de 3km para lembrar que resistimos.
Marchando pela vida dos judeus e de todos que sofreram com aquilo
Marchando para evitar que qualquer movimento desse tipo ocorra novamente
A última parada foi a Floresta de Treblinka
Normalmente entrando em uma floresta tão vasta e grande eu ficaria com medo
mas a única coisa que eu conseguia sentir era tristeza
Sempre relembrando que só estou aqui por causa das pessoas que conseguiram persistir
Durante toda essa viagem o nosso hotel ficava na frente de um shopping.
Todo dia depois de passar pelos campos a gente ia à noite no shopping para “esquecer um pouco daquilo tudo”
Era muito pra gente
Imagina pra eles…
Só de pensar que eles não podiam nem tentar esquecer daquilo tudo
Não dava
A culpa não era deles e eles não tinham escolha
Relembrar isso tudo dói
mas é importante
para que isso não tenha chances de ocorrer novamente.
