Ateliê

Giovana Genoso
Iandé
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6 min readNov 25, 2019

Experiência Estética.

FAAP (Fundação Armando Alvares Penteado); São Paulo, 2019

Ao concluir o ensino médio continuava com muitas dúvidas em relação a qual curso de graduação iria fazer. Havia feito transferência para a Faap no período do 3° colegial por pensar em fazer arquitetura, como o curso era renomado por ter bases mais criativas acreditei que me sentiria em um meio mais familiar, acabei desistindo da ideia.

Fui para faculdade de direito por pressão dos meus pais em relação a ter uma formação acadêmica. Meu pai è advogado e sempre teve o desejo enorme de ver alguma filha seguindo sua profissão. Já que não tinha vontade de fazer outro curso, resolvi tentar esse caminho.

Realizei 2 anos da faculdade de direito da Fundação Armando Álvares Penteado e no final do segundo ano tranquei minha matrícula. Fiz 3 meses de alguns cursos extracurriculares com medo da decisão que precisaria tomar em alguns dias, já havia mudado minha opinião 2 vezes sobre qual curso fazer e algumas vezes de escola, meus pais já se encontravam esgotados com as minhas indecisões.

Quando me mudei para FAAP em 2014 sabia que era aquela instituição que iria me formar, talvez por ser um lugar que me trazia segurança, conforto e ao mesmo tempo onde conseguia enxergar uma possibilidade real das coisas acontecerem.

A relação que tive de aluno — professor era mais de “mestre” querendo incentivar e mostrar um caminho para aprender do que de professor querendo mandar no aluno, o que era um dos meus maiores desejos em ter na faculdade depois de ter passado por uma escola extremamente católica e rígida como o Colégio Santo Américo.

Acabei escolhendo pela instituição e não pelo curso em si. Resolvi me graduar em Publicidade e Propaganda, acreditava que era um curso abrangente, uma faculdade sobre cultura em geral que me ensinaria a conhecer e lidar com pessoas, o que è algo que sempre me encantou: a relação social que o mundo nos traz, os tipos de pessoas que podemos conhecer, as histórias que podemos descobrir.

No primeiro ano da faculdade de PP decidi que não gostaria de ser publicitaria, principalmente pela forma como um publicitário regular trabalha. Agência, estagiária, ter que seguir um briefing montado por um terceiro, definitivamente não me sentia confortável com essa ideia. Não queria ficar trancada em um lugar com horário para entrar e para sair, fazendo tudo que minha cabeça falava que não era para eu estar fazendo, mas queria ganhar dinheiro com alguma coisa e logo. Meu pai foi muito controlador no período da minha adolescência e começo da fase adulta, sempre tive muita vontade de tornar minha independência algo real e rápido.

Em uma conversa sobre essas angustias com a minha melhor amiga e atual sócia, Joana Simao, decidimos fazer um projeto ao invés de nos lamentar, nossos anseios eram os mesmos e acreditávamos poder resolver eles juntas.

Precisávamos ganhar dinheiro de alguma forma. Ficamos dias pensando no que poderíamos fazer, surgiram algumas ideias, varias relacionadas a moda, tentamos fazer alguns esboços sobre conceitos que marca traria e nada. Eu sentia que alguma coisa estava por vir, que a ideia estava perto de algo mais muito longe do que eu queria.

Acreditava estar tão longe do que eu queria pelo simples fato de não conseguir ver a moda como um trabalho, era algo que levava todo meu dinheiro na verdade. Sempre gostei tanto do assunto que poderia passaria horas descrevendo os detalhes de uma peça que havia visto em uma vitrine X em um dia Y. Acredito que o fato de não conseguir enxergar o que realmente tenho prazer em fazer como um trabalho vem muito da minha mãe.

Ela tem 52 anos e é arquiteta. Na verdade ela è meio que uma artista, ela pinta, desenha, borda, faz coisas, diz que gosta de dar vida para tudo com as mãos, principalmente se é algo que envolve cores.

Maria do Rosário Genoso.

O ambiente artístico sempre foi natural para mim, muito vivido como um prazer. Minha mãe sempre fazia e ainda faz as coisas parecerem brincadeira, nunca consegui imaginar esse meio como um meio para trabalhar.

“Filha, vem brincar de pintar com a mamãe.” “ Filhota, vem bordar com a mamãe um tucano? A gente pode fazer ele com vários tons de laranja.” “Giovaninha, quer que a mamãe te ensine a fazer um traço reto no papel? Do começo até o final da folha. Sem tremer.”

As brincadeiras, que para mim, sempre foram só brincadeiras começaram a ter um sentido diferente na minha vida.

Obras por Maria do Rosário Genoso; São Paulo, 2019.

Em uma conversa com a Joana minha visão começou a mudar. Tive que ver através do olhar de uma amiga, que tudo aquilo que eu esperava levar para o resto da vida como brincadeira poderia se tornar um trabalho.

Como uma boa economista, ela estudou o mercado com base no capital que tínhamos para começar um negócio e veio com a ideia de lançarmos apenas uma coleção de teste, para ver o que sairia dali. Ela nunca tinha trabalhado com um negócio independente antes, muito menos eu e principalmente como chefe de criação de uma marca.

Resolvemos fazer 1 coleção, apenas de Réveillon, com tudo branco para comemorar a virada do ano de 2018 para o ano de 2019. Produzimos 14 modelos divididos em 150 peças, das quais 142 foram vendidas no período do dia 20\11\2018 a 23\12\2018.

Campanha Ano Novo 2018–2019 da loja Mareé; São Paulo, 2019.

Com a experiência positiva que tivemos, resolvemos seguir em frente e criamos um conceito de loja ainda não visto e assim surge a Mareè, sucesso.

A definição conceito de coleções cápsulas, são as coleções fora da principal que possuem um tema específico. Como por exemplo, uma coleção inteira so de vestidos vermelhos para o Natal. Já que não produzimos uma coleção principal, falamos que a Mareé é uma loja so de coleções cápsulas.

Com objetivo de chegar a lançar até 4 coleções por ano: 1. Carnaval; 2. Férias; 3. Brasil; 4. Ano Novo; a Mareé junta as minhas maiores paixões. Além de ser algo que me faz lidar diariamente com pessoas e seus desejos, me deixa explorar memórias que acreditava estarem enterradas.

Sempre amei a época de ano novo, me traz as sensações do Brasil, de casa, de conforto, aconchego, recomeço, aquela sensação de poder de transformação.

O Carnaval me traz as melhores fases da minha adolescência até hoje, a presença constante de amigos e de felicidade.

Todas as ferias de julho eu sempre viajei com a minha família, minha mãe, meu pai, minha irmã e eu. E como minha mae e meu pai são dois adoradores de artes e historia em geral, sempre fazemos viagens extremamente regadas à cultura, o que me traz recordações extremamente úteis em relação a bagagem cultural e acolhedoras em relação a família. Por último as minhas duas paixões mais profundas: Brasil e Cores. A coleção Brasil vai ser sempre inspirada em alguma cidade específica Brasileira, trazendo de alguma forma os principais elementos dessa cidade e suas cores. Conseguimos juntar a minha paixão e fascínio pelo Brasil, com a paixão que me foi ensinada pela minha mãe, as cores.

Passamos esse ano elaborando e criando a coleção de Ano Novo 2019/2020. Com o expandir e a procura pela loja, já não conseguíamos e nem podíamos mais deixar tudo no quarto de hospedes da casa do meu pai.

Nessa entrada do segundo semestre de 2019 começamos a dividir um ateliê com a minha mãe e uma costureira. Como se fosse um co-working, onde dividimos o espaço e os gastos em 3.

Acredito que minha maior experiência estética vem dai, do ateliê. Você chega ouvindo de longe o barulhinho da máquina de costura. Quando eu tenho tempo para comprar café chega a ser constante o cheirinho na sala. Tem sempre retalhos de tecidos espalhados pelo chão, varias paletas de cores em cima das mesas, tintas, linhas, o ateliê virou uma maquininha de criação. Tudo aquilo que sempre levei como brincadeira, virou realmente um trabalho.

O Ateliê virou meu templo, onde sinto as minhas memórias vivas, onde tenho meu momento de criação, onde acredito que saia o melhor de mim.

Ateliê; São Paulo, 2019.

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Iandé
Iandé

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Experiência Estética: A expressão de uma experiência vivida. Criações dos alunos da disciplina Estética ministrada pela professora Edilamar Galvão no 3o semestre dos cursos de Cinema, Cinema de Animação, Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Rádio e TV e Relações Públicas da FAAP